Opinião

A Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça e o princípio da isonomia

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17 de janeiro de 2021, 11h17

De acordo com a Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça, a pena não pode ficar aquém do mínimo legal na segunda etapa da aplicação. A finalidade do verbete é impedir que o magistrado desborde dos limites impostos pela lei e viole a separação dos poderes.

O Brasil adotou na aplicação da pena o sistema da relativa determinação, e não o da indeterminação da pena. Tanto na primeira quanto na segunda fase da aplicação, utilizou-se das expressões "dentro dos limites previstos" e "do limite indicado", respectivamente no inciso II do artigo 59 e no artigo 67 do Código Penal. Assim, em tais etapas devem ser respeitados os limites mínimo e máximo abstratamente cominados pelo tipo secundário.

Ao contrário da terceira fase da aplicação, em que a lei prevê frações de aumento ou diminuição da pena — fixas ou variáveis —, nas duas primeiras etapas não há previsão legal do quantum de exasperação ou abrandamento, motivo por que o magistrado não pode criar um quantum que desborde dos limites mínimo e máximo, ante o princípio da reserva legal.

Todavia, a observância da Súmula 231 não pode gerar iniquidade.

Há situações em que o agente possui em seu favor uma ou mais atenuantes — e nenhuma agravante — na segunda fase e a pena não pode ser diminuída por já estar no mínimo legal, embora na terceira etapa haja causa de aumento que elevará a pena acima do mínimo legal.

Nesse caso, simplesmente pelo fato de o legislador ter arrolado determinadas circunstâncias benéficas na segunda fase e certa circunstância gravosa na terceira, o agente terá considerada somente a causa de aumento, não as atenuantes.

A situação se torna ainda mais injusta se cotejada com o princípio da individualização da pena, insculpido no artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição. Dois agentes com circunstâncias pessoais distintas serão tratados da mesma forma se for feita a aplicação irrefletida da súmula.

Veja-se o exemplo: dois agentes praticam em concurso o crime de roubo; enquanto um deles é menor de 21 anos e confessa, o outro é maior e nega a prática delitiva. Considerando que as circunstâncias judiciais são favoráveis e não há agravantes, estarão submetidos igualmente a uma pena final de cinco anos e quatro meses.

Não se pode fechar os olhos para essa injustiça.

O princípio da individualização da pena tem por finalidade concretizar a isonomia no âmbito da sanção penal. Por conseguinte, os iguais devem ser tratados da maneira igual e os desiguais, de maneira desigual, na medida de suas desigualdades.

A ratio da Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça é impedir que a pena final fique aquém do mínimo legal por uma atenuação feita na segunda etapa da aplicação da pena.

A solução para o supracitado exemplo, sem desrespeito ao verbete, é aplicá-lo na segunda fase e depois, na terceira fase, deixar de aplicar a majorante. Com efeito, a aplicação da majorante do concurso de pessoas no roubo elevaria a pena em um terço, assim como a incidência conjunta das atenuantes da menoridade relativa e da confissão teriam levado à diminuição da pena em um terço na etapa anterior, de acordo com as frações normalmente utilizadas pela jurisprudência. Assim, a um dos agentes, no exemplo supra, seria aplicada a pena de quatro anos — dentro dos limites abstratamente cominados — e ao outro, a pena de cinco anos e quatro meses.

Dessa forma, permanecer-se-ia dentro das balizas legais e não haveria malferimento aos princípios da reserva legal e da separação dos poderes.

A aplicação da sanção penal, embora regulada por lei e sujeita a relativa determinação, deve dar ao juiz espaço para a busca do justo e da concretização do caro princípio constitucional da isonomia.

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