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Alterações contratuais: a função do empregado em tempos de crise da Covid-19

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14 de janeiro de 2021, 11h12

A pandemia da Covid-19 trouxe para nosso país, além da crise sanitária, uma grande crise econômica. Muitas empresas tiveram de reduzir de forma considerável seu quadro de empregados para não fechar suas portas. Alguns empregados tiveram de assumir tarefas que antes não exerciam e surgiu a seguinte dúvida: quais tarefas poderiam ser atribuídas ao empregado sem que isso impacte na exigibilidade de um acréscimo salarial?

Antes de adentrar especificamente na questão, é necessário esclarecer alguns pormenores do contrato de trabalho. Trata-se de uma espécie contratual que tem por objeto a prestação de serviços por um empregado, que o executa de forma pessoal, onerosa, não eventual e, principalmente, subordinada juridicamente ao seu empregador (artigo 442 da CLT).

Quanto ao objeto do contrato de trabalho, a lei atribui uma certa liberdade na estipulação, somente exigindo que este não contrarie as disposições de proteção ao trabalho, os contratos coletivos e as decisões das autoridades competentes (artigo 444 da CLT). Ademais, não havendo prova específica quanto ao objeto da prestação dos serviços, o trabalhador assume a possibilidade de executar todas as atividades compatíveis com sua condição pessoal, nos termos do artigo 456, parágrafo único da CLT. Essa é a previsão legal da multifuncionalidade no contrato de trabalho.

Considerando tais premissas, evidencia-se que o empregado pode ser contratado para executar uma determinada função, que é composta por um feixe de tarefas, as quais, ainda que executadas de forma cumulativa, não desvirtuariam a função pela qual ele foi contratado.

Em sentido contrário, haveria um vício no objeto do contrato caso esse empregado fosse admitido para executar determinada função e, na realidade, desenvolvesse outra totalmente alheia a esta, caracterizando o desvio de função. De igual modo, também haveria vício no objeto caso o empregado fosse contratado para executar determinada função, porém, de forma cumulativa e concomitante, executasse, além das atividades que englobam a função contratada, outras totalmente estranhas a esta, caracterizando o acúmulo de funções.

É importante salientar que a caracterização do desvio funcional depende do prejuízo financeiro, ou seja, a função efetivamente exercida pelo empregado deve exigir uma remuneração maior e diferenciada daquela para a qual ele foi contratado. Aliás, para empresas que possuem quadro de carreira válido é mais fácil essa identificação do vício.

Há casos em que o empregado é contratado para executar uma função interna, ligada ao desenvolvimento de vendas, por exemplo, contudo, com a redução do quadro de empregados, passa a ser responsável pela limpeza de seu local de trabalho ou pela entrega dos produtos vendidos, atividades estas não exercidas anteriormente por ele.

Nessa hipótese, há de se perquirir se essa alteração foi razoável, considerando todo o contexto que gerou sua implantação; se essas novas atividades (feixe de tarefas) poderiam ser enquadradas como uma nova função; e se essas atividades seriam compatíveis com sua condição pessoal e se a finalidade foi manter a atividade econômica da empresa e os empregos. Não se mostra abusiva ou excessiva a atribuição de tarefas diversificadas ao empregado, quando estas não demandam um aumento qualitativo e quantitativo desarrazoado.

Diante de tais considerações, as novas tarefas atribuídas serão consideradas legítimas se houver compatibilidade de horário e com a condição pessoal do empregado; se esse novo feixe de tarefas não caracterizar uma nova função; se o objetivo maior for a manutenção do emprego e da atividade econômica, razão pela qual não se mostrará ilegal, abusiva ou excessiva esta alteração contratual, não sendo exigível qualquer acréscimo salarial.

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