Opinião

A interação entre o Direito Internacional e os sistemas jurídicos nacionais

Autor

  • Ana Carolina Agatti

    é mestre em Direito Internacional pela Universidade de Sydney com experência no time global de Law Enforcement do Snapchat e assessora em Tribunal Regional da 10ª Região.

12 de janeiro de 2021, 20h59

A interação do Direito Internacional com o Direito interno é uma temática que se destaca pela complexidade e crescente relevância de sua análise. É inegável que o contexto de um mundo globalizado estimula esse debate, considerando que o diálogo entre normas e práticas internacionais interage cada vez mais com os sistemas jurídicos internos dos Estados.

Dentro da teoria do Direito Internacional, a classificação como monista ou dualista é a usada para descrever como cada Estado lida com as normas internacionais. O monismo se refere à abordagem na qual a aplicação do Direito Internacional se dá de forma automática nos sistemas jurídicos internos (e funcionando também diretamente como uma fonte de lei), dispensando um processo de incorporação dessas normas. Esse modelo tem como um de seus principais defensores o austríaco Hans Kelsen, que defendia o aspecto naturalista do Direito Internacional, o qual considera que compartilha com o Direito interno o mesmo objeto, sendo assim, ambos formam um sistema unitário sob sua perspectiva. Do outro lado, temos o dualismo, que considera que existem duas ordens legais, a do Direito interno de cada Estado e a do Direito Internacional. Sendo assim, a adoção das normas internacionais dentro dos sistemas jurídicos nacionais não ocorre de forma automática, necessitando que a norma internacional seja incorporada ao ordenamento jurídico interno. Um dos grandes teóricos dessa corrente é o alemão Heinrich Triepel, expositor do pensamento de que os Estados são soberanos, portanto possuem vontade própria, gerando uma clara divisão entre as normas domésticas e as internacionais. Entretanto, saindo da análise teórica e analisando a prática, nos deparamos com um cenário no qual os Estados usam um misto de ambas abordagens, não se limitando a seguir estritamente o monismo ou dualismo.

Independentemente da doutrina teórica, é nítido que testemunhamos o crescimento da influência de normas oriundas do Direito Internacional dentro dos sistemas jurídicos nacionais. Sendo assim, é importante destacarmos que a relação entre o Direito Internacional e o interno não precisa levar necessariamente a uma dicotomia, mas, ao contrário disso, pode levar ao aprimoramento dos sistemas de normas internas, sendo possível que as normas internacionais possam ser utilizadas como forma de embasar questões levadas ao sistema judiciário. Ter um Judiciário engajado com o Direito Internacional pode consagrar um maior compromisso dos Estados com valores universais, como o dos direitos humanos e a proteção ao meio ambiente, por exemplo. Nesse contexto, a utilização do Direito Internacional se revela frutífera se pensarmos que ela pode servir de balizador para os sistemas nacionais não tenderem a sistemas ou decisões autoritárias.

Contudo, reconhecer o benefício dessa interação entre o Direito Internacional e o interno não nos exime de assumir que esta relação traz consigo peculiaridades. A aplicação do Direito Internacional no Direito interno é um desafio considerando que cada Estado é soberano. Há uma variação na forma como os Estados lidam com as leis internacionais; não é um cenário homogêneo, como já destacado na abordagem teórica. Assim, cada Estado possui a prerrogativa de decidir os arranjos constitucionais e legislativos os quais vão dar margem à aplicação (ou não) do Direito Internacional. Portanto, as constituições são um poderoso instrumento que pode ser usado para estabelecer como a norma internacional fará parte do Direito interno.

Autores

  • é mestre em Direito Internacional pela Universidade de Sydney com experência no time global de Law Enforcement do Snapchat e assessora em Tribunal Regional da 10ª Região.

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