Momento de grande relevância para as eleições, o registro de candidatura ocorre quando aqueles já escolhidos nas convenções partidárias submetem seus nomes à Justiça Eleitoral — por meio dos partidos políticos/coligações — para fins da análise dos requisitos da capacidade eleitoral passiva, isto é, o direito de ser votado. Conforme o escólio de José Jairo Gomes: "O ius honorum, isto é, o direito de ser votado, só pode ser exercido pelos cidadãos que gozem de condição de elegibilidade, não incidam em qualquer causa de inelegibilidade ou impedimento e logrem cumprir determinadas formalidades, registrando suas candidaturas junto aos órgãos a tanto legitimados" [1].
Segundo disposto no artigo 11, §10º, da Lei 9.504/97, tais condições devem ser aferidas no momento da formalização do pedido de registro da candidatura, ressalvadas as alterações, fáticas ou jurídicas, supervenientes ao registro que afastem a inelegibilidade, valendo destacar que o julgamento dos registros de candidatura deve ocorrer em prazo anterior a 20 dias da data do pleito, conforme disciplina o artigo 16, §1º, da Lei das Eleições. Ocorre que, desde a entrada em vigor da Lei 13.165/15, reduziu-se substancialmente o período de campanha de 90 dias para 45, o que sobrecarregou a Justiça Eleitoral, conferindo um prazo extremamente exíguo — quase impossível — para análise de todos os pedidos de registros de candidaturas até a data do pleito, gerando grande insegurança jurídica.
Rodrigo López Zilio aponta para as consequências dessa dissintonia: "Noutras palavras, a incompatibilidade do calendário eleitoral com os prazos processuais atinentes aos mecanismos de controle de adequação dos candidatos ao estatuto jurídico das elegibilidades tem transformado o registro de candidatura num elemento de instabilidade do processo eleitoral, alimentando uma percepção de frustração do eleitor na viabilidade da própria democracia" [2].
Com mesmo diagnóstico, Eduardo Damian Duarte adverte que: "Isso culminou com situações esdrúxulas e, logicamente, incompreensíveis ao cidadão comum. O eleitor presencia o candidato pedindo voto, diariamente, na televisão, rádio ou internet, acolhe suas propostas e confirma o voto. O candidato escolhido é o mais votado para prefeito, porém não poderá assumir. Ele não teve registro de candidatura aceito pela Justiça Eleitoral" [3].
Isso justifica a necessidade reformulação legal dos prazos para julgamento dos registros de candidatura, a fim de que se respeite o direito soberano do eleitor de votar em candidatos que realmente tenham — sem qualquer duvida razoável — condições de concorrer ao pleito, isto é, sem gerar um (legítimo) sentimento de "jogar no lixo" o soberano direito do exercício ao sufrágio. Medida possível seria a criação do pré-registro de candidatura, a ser submetido à Justiça Eleitoral no prazo de seis meses anteriores ao pleito (por analogia ao maior prazo de desincompatibilização) tal qual já fora defendido desde novembro/2016, por Henrique Neves em artigo ao Jota: "Tal procedimento teria início mês de abril, logo após o prazo de seis meses antes da eleição, momento em que o candidato já deve estar filiado e afastado de grande parte dos cargos públicos. O interessado apresentaria todos os seus documentos e certidões. A Justiça Eleitoral verificaria se está tudo correto ou se há alguma pendência, inclusive em relação a multas não pagas. Existindo alguma pendência, seria concedido curto prazo para regularização e, em seguida — como ocorre no processo de registro de candidatura —, seria publicado um edital para que o Ministério Público, os partidos políticos ou liados que estivessem em igual situação pudessem impugnar o pedido e comprovar que o interessado é inelegível" [4].
O transcurso do tempo só demonstrou que o ex-ministro do TSE tinha total razão se pensarmos que no último pleito de 2020, mais de 15 mil candidatos foram às urnas com pendências perante a Justiça Eleitoral [5].
Isso expõe a irracionalidade do atual regramento, mormente se pensarmos que muitas dessas candidaturas foram contempladas com recursos de natureza pública, e ao final foram indeferidas, sendo necessária a realização de eleições suplementares quando se trata daqueles mais votados em pleito majoritário. A adoção do sistema do pré-registro não significaria à obtenção do direito garantido ao deferimento do registro de candidatura, tampouco significaria que candidatos não habilitados no prazo de seis meses antes do pleito ficassem alijados da disputa, admitindo-se alterações fáticas ou jurídicas supervenientes que afastem ou atraiam inelegibilidade.
Por fim, a fim de possibilitar a ampla análise das condições de registrabilidade, e ainda, para racionalizar os trabalhos da Justiça Eleitoral, e a própria organização interna dos partidos políticos, nessa fase do calendário, cada legenda poderia enviar uma listagem de pré-candidatos cujo limite seria de até duzentos por cento do total de vagas em disputa — regra que já era permitida antes da proibição da coligação na proporcional — sendo necessário que esse número fosse ajustado ao limite de cento e cinquenta por cento no momento do efetivo requerimento do registro de candidatura.
[1] Direito Eleitoral, Ed. Atlas, 16ª ed, 2020, pág. 385.
[2] Dicionário das Eleições, Ed. Juruá, 2020, pág. 623.