Opinião

As novas regulamentações propostas pela Comissão Europeia às big techs

Autor

  • Ana Carolina Teles

    é advogada da equipe de Privacidade e Proteção de Dados do Assis e Mendes pós-graduada em Direito Processual Civil pela PUC/MG especialista em Direito Digital Tecnologia e Proteção de Dados pelo ITS/RJ e pela Escola Superior de Advocacia da OAB/SP atuando diretamente em projetos de adequação à LGPD.

24 de fevereiro de 2021, 20h43

Recentemente, a Comissão Europeia — braço executivo da União Europeia —, com intuito de aumentar a concorrência entre as pequenas e médias empresas e as gigantes plataformas online, como a Google, Facebook e Apple, propôs a criação de duas novas regulamentações que objetivam o monitoramento das big techs.

Foram propostas a Lei de Serviços Digitais e a Lei Digital de Mercados, tais quais visam a criar limites e novas regras para todos os serviços digitais, incluindo as redes sociais, o e-commerce e demais plataformas.

A primeira sinaliza a criação de um conselho nacional de coordenadores de serviços digitais com poderes para supervisionar o comportamento de "plataformas muito grandes, incluindo a capacidade de sancioná-las diretamente". A Lei de Serviços Digitais busca, ainda, criar novas regras quanto à "rastreabilidade de usuários de negócios em mercados online, para ajudar a rastrear vendedores de bens ou serviços ilegais".

De outra banda, a Lei de Mercados Digitais, de forma ousada, intenta abranger a proteção dos usuários, visto que pretende regular a maneira em que as big techs se utilizam dos dados dos titulares de modo a influenciar e ditar a decisão de compras, já que funcionam como gatekeepers, o que significa dizer que são a "porta de entrada" para que as empresas atinjam o seu público-alvo.

É importante explicitar que, no caso dessas novas regulamentações serem aprovadas — o que pode levar algum tempo, já que depende de aprovação de todos os integrantes da União Europeia —, a atuação das gigantes da tecnologia, dentro do bloco europeu, será impactada de forma significativa.

As tais medidas propostas pela Comissão Europeia traçam a ideia essencial de monitorar o abrangente domínio das potências do mercado de tecnologia, bem como facilitar a concorrência para que o mercado não seja sustentado por monopólios que visam apenas a beneficiar as próprias big techs. Em suma, além de proteger os direitos dos usuários, as propostas intentam coibir a exploração das grandes plataformas em detrimento das pequenas e médias empresas.

Assim, vê-se que o objetivo é evitar, no bloco europeu, situações como a compra do Instagram e Whatsapp pelo Facebook que foi efetivada com a intenção de manter o controle mercadológico por este último, evitando-se que as duas primeiras empresas se tornassem potências concorrentes com o passar do tempo.

Ademais, os legisladores europeus reforçam a necessidade das big techs estabelecerem política de tolerância zero quanto ao discurso de ódio e desinformação que rodeiam as suas plataformas. A título elucidativo, no caso de descumprimento das regras já vigentes pelas potências desse setor, podem ser aplicadas multas equivalentes a 10% de suas receitas anuais.

Interessante pontuar o cabimento de medidas similares no mercado tecnológico e de proteção de dados em solo brasileiro. Com a vigência da Lei Geral de Proteção de Dados e a criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), é de se esperar regulamentações específicas ou, ainda, orientações incisivas, que possam pavimentar a atuação das big techs para coibir atitudes desleais junto aos usuários, zelar pelo livre poder de escolha e, assim, extirpar a tática de manipulação que foge dos princípios de proteção de dados.

É de bom alvitre mencionar que os usuários devem ter acesso a uma ampla escolha de produtos e serviços seguros online sem vieses algorítmicos que os manipule, assim como as empresas devem competir online de forma livre e justa, como ocorre offline.

Nesse contexto, essencial se faz rememorar que, embora as big techs sejam o foco dessas novas regulamentações propostas pela Comissão Europeia, no cenário global, as empresas de grande porte — mas inferiores às gigantes supracitadas — e as chamadas PME (pequenas e médias empresas) devem, também, estar em compliant com as legislações de proteção de dados não apenas por receio de sanções administrativas e pecuniárias, mas, sim, por princípios empresariais inegociáveis, os quais ditam a importância dos dados pessoais coletados e as consequências de um tratamento equivocado.

Isso posto, resta claro que, desde sempre, o bloco europeu se coloca na vanguarda das discussões sobre Direito Digital, tecnologia e proteção de dados, o que deve se apresentar como inspiração para o mercado de tecnologia no Brasil — o qual ainda está sedimentando o seu caminho.

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    é advogada da equipe de Privacidade e Proteção de Dados do Assis e Mendes, pós-graduada em Direito Processual Civil pela PUC/MG, especialista em Direito Digital, Tecnologia e Proteção de Dados pelo ITS/RJ e pela Escola Superior de Advocacia da OAB/SP, atuando diretamente em projetos de adequação à LGPD.

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