Danos Morais

Preso preventivo que foi absolvido por falta de provas será indenizado

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19 de fevereiro de 2021, 11h17

Cabe indenização por danos morais em favor de investigado que foi preso preventivamente e em seguida absolvido por falta de provas. O entendimento é da 7ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo. A decisão é de 14 de dezembro. 

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Homem que ficou preso preventivamente por dois meses será indenizado pelo estado
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O caso concreto envolve um roubo a uma empresa de transportes. Depois de ser feita denúncia anônima, a Polícia Civil chegou a três suspeitos. O autor do processo não estava entre os acusados, mas acabou sendo investigado apenas por conhecer um dos supostos responsáveis pelo crime. 

Com a indicação da autoridade policial, uma testemunha reconheceu o autor por foto e, posteriormente, fez o reconhecimento presencial. Ocorre que o procedimento ocorreu em desconformidade com o que preceitua o Código de Processo Penal. 

A norma diz, entre outras coisas, que o suspeito deve ser colocado ao lado de pessoas com quem tem traços físicos em comum. Entretanto, o autor, que é branco, foi exposto ao reconhecimento junto a homens negros. Por causa disso, acabou ficando dois meses presos preventivamente. Em juízo, a testemunha mudou o depoimento e disse que não reconhecia o autor. 

Embora a jurisprudência seja de que a prisão preventiva seguida de absolvição por falta de provas não gera indenização por danos morais, o TJ-SP entendeu que houve má prestação de serviço público, já que o CPP, no que diz respeito ao reconhecimento, foi totalmente ignorado pela autoridade policial. Além disso, não havia motivo para indicar o autor como suspeito, uma vez que ele não foi citado na denúncia anônima que iniciou o caso. 

"Primeiramente, cumpre destacar as limitações naturais da prova testemunhal e, especialmente, a sabida dificuldade do reconhecimento pessoal para a apuração da autoria do crime. Assim, a investigação policial, no caso vertente, deveria ter observado tais limites, ainda mais tendo em vista que os criminosos, por ocasião do crime descrito, encontravam-se mascarados e com roupas largas", pontuou em seu voto o desembargador Fernão Borba Franco. 

"Com fundamento em uma denúncia anônima, os policiais identificaram três pessoas acusadas de cometer o roubo. Ocorre que o autor não era nenhuma dessas pessoas, tendo com alguma delas uma tênue ligação anterior; vale dizer, não havia — e nem foi exposto, exatamente em vista dessa inexistência — qualquer motivo para incluir o ora autor no inquérito, submetendo-o a um reconhecimento pessoal que não observou o regramento legal a respeito e que, como visto, já era fadado a incertezas", prosseguiu o magistrado. 

Com a decisão, o autor receberá R$ 30 mil da Fazenda Estadual.

Reconhecimento
O reconhecimento é disciplinado pelos artigos 226 e 228 do Código de Processo Penal. Segundo o dispositivo, a pessoa convidada a fazer o reconhecimento deve fazer uma descrição prévia do suspeito, e o investigado deve ser colocado, se possível, ao lado de pessoas com quem tem semelhança, entre outros resquisitos. 

No caso concreto, segundo explicou à ConJur o Defensor Público Matheus Bortoletto Raddi, não houve prévia descrição, tendo a testemunha falado apenas que o suspeito tinha costeletas. A vítima também disse que teria sido pressionada pela empresa de transporte a reconhecer o autor. 

"O CPP não prevê o reconhecimento de pessoas por fotos, o que é admitido com ressalvas pelo Supremo Tribunal Federal. Contudo, por vezes os agentes policiais apresentam às vítimas fotos de ‘possíveis suspeitos’, sem fundamentar os motivos pelos quais a foto de uma determinada pessoa deve ser apresentada. Em decorrência, não raras as vezes, o reconhecimento realizado pela vítima em solo policial não se confirma quando de sua oitiva em juízo", disse Raddi, responsável pela defesa do autor. 

Ainda segundo ele, "o estado deve compensar os danos morais causados ao cidadão que vier a ser preso cautelarmente, quando ficar evidente que, fosse a investigação conduzida com as devidas cautelas e em observância aos procedimentos legais, os fatos teriam sido devidamente elucidados, sem a imputação desmotivada da prática de um crime àquele cidadão". 

Além do TJ-SP ter considerado que cabe reparação para os casos de preventiva seguida de absolvição, outro ponto do voto do desembargador Fernão Borba Franco chama a atenção: embora parte da jurisprudência encare o artigo 226 do CPP como mera recomendação, para  magistrado trecho deve ser seguido conforme disposto.

Processo 1001523-26.2017.8.26.0037

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