Sequestro de crianças

Convenção de Haia deve ser seguida sob risco de reciprocidade internacional, diz STJ

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19 de fevereiro de 2021, 7h27

A hipótese descrita no artigo 12 da Convenção de Haia, que estabelece a imediata devolução da criança retirada de um país por um dos pais quando o pedido de devolução formulado pelo outro ocorrer em menos de um ano depois, deve ser interpretada de forma restritiva, de forma a evitar efeitos colaterais indesejáveis.

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Decisão determina retorno da criança à Espanha para com o pai, de onde foi retirada ilegalmente pela mãe brasileira

Com esse entendimento, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial ajuizado por uma mãe brasileira que trouxe o filho ao país sem a autorização do pai espanhol, após período em que residiam na Espanha.

O caso gerou ação de busca, apreensão e restituição de menor, movida pela União contra a mãe. Em primeiro grau, o pedido foi negado. Mas o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, ao analisar as provas, entendeu que a mulher e a criança moravam na Espanha na época da mudança do Brasil. Ela alegava que estavam no país em período de férias, com duração de cinco meses, nos quais a criança chegou a ser matriculada em escola local.

A 2ª Turma do STJ manteve o entendimento do TRF-1, segundo o qual o caso se enquadra exatamente à hipótese do artigo 12 da Convenção de Haia. Se o pedido de devolução formulado pelo pai ocorreu menos de um ano entre a data da transferência e a de início do processo de repatriação no Estado que estiver abrigando a criança, a devolução é imediata.

Relator, o ministro Herman Benjamin destacou que a interpretação da norma deve ser restritiva, visando evitar prática judicial que venha a corroer a garantia do bem jurídico internacional maior. O objetivo é evitar efeitos colaterais imprevisíveis, assim como os social e internacionalmente indesejáveis.

Nelson Jr./ASICS/TSE
Se o Brasil não cumpre, o que impedirá outros países de fazer o mesmo?, indagou o ministro Herman Benjamin, relator
Nelson Jr./ASICS/TSE

“Afinal, na arena internacional reina, de direito ou de fato, o princípio da reciprocidade: se não cumprimos, ou cumprimos parcial ou relutantemente, nossos deveres explícitos e inequívocos estatuídos na Convenção, por que as outras partes haverão de fazê-lo quando forem brasileiros o genitor titular da guarda ou a criança sequestrada?”, indagou.

A Convenção de Haia traz exceções à medida de retorno imediato da criança. Essas hipóteses não devem ser alargadas. “A análise do mencionado dispositivo deve ser criteriosa para que atenda a finalidade da Convenção, que é a devolução da criança ao local de onde foi retirada, sob pena de se tornar inócuo o acordo internacional”, acrescentou.

Em voto-vista, a ministra Assusete Magalhães apontou manifestação da Advocacia-Geral da União no sentido de já haver crítica e restrição ao Brasil, em função do desrespeito à Convenção de Haia. “Corre-se o risco, com isso, de que, se não for ela observada, quando o Brasil tentar obter o inverso – trazer um menor de outro País –, não consiga obter a reciprocidade”, disse.

REsp 1.723.068

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