O Direito Penal é regido pelo princípio da intervenção mínima e deve ocupar-se de proteger bens jurídicos valorosos e necessários à vida em sociedade, intervindo somente quando os demais ramos do Direito não forem capazes de fazê-lo.
O entendimento é do ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, que trancou inquérito policial aberto contra uma mulher que teria furtado um pedaço de queijo de R$ 14. Ela chegou a ficar presa por 48 horas e está em liberdade provisória com cautelares.
O caso ocorreu na Paraíba, no dia 24 de janeiro deste ano, quando a paciente foi presa em flagrante por furto. A defesa, feito pelo defensor público Marcel Joffily, argumentou que o flagrante era ilegal, uma vez que pelo princípio da insiginificância haveria atipicidade material da conduta.
O ministro Fachin concordou. Ele não reconheceu o habeas corpus, mas concedeu, de ofício, ordem para que o inquérito policial fosse imediatamente trancado.
"Apesar da fase preambular em que o caso se encontra, as circunstâncias fáticas do delito retratadas nas decisões impugnadas nos permitem concluir, à luz do princípio da insignificância, que a conduta imputada à paciente é materialmente atípica", disse.
"Com efeito", prossegue o ministro, "o crime foi cometido sem violência ou grave ameaça contra pessoa, o bem furtado é alimento de valor irrisório e não há registro de reincidências recentes". "Assim, na linha da jurisprudência desta Suprema Corte, a atipicidade material da conduta conduz ao excepcional trancamento do inquérito em curso."
Segregação social
Mesmo sendo a mulher primária, o juiz de primeiro grau, o Tribunal de Justiça da Paraíba e o Superior Tribunal de Justiça negaram pedido para trancar o inquérito policial. O caso chegou ao Supremo Tribunal Federal no último dia 8. Após ordem de Fachin, o juizo originário retirou as cautelares.
Joffily, responsável pela defesa, comemorou a decisão de Fachin. "A necessidade de atuação da Defensoria, por todas as instâncias do Poder Judiciário, foi extremamente necessária para demonstrar que não é razoável manter uma pessoa presa, por quase 48 horas, por causa de um suposto furto de um pedaço de queijo avaliado em R$ 14. O Direito Penal não serve a tais coisas e foi preciso ir até o STF para se demonstrar isso", afirmou.
Ainda de acordo com ele, o Direito não pode ser usado como instrumento de segregação social, punindo pessoas menos afortunadas do ponto de vista econômico.
"Outros ramos do Direito seriam mais do que suficientes para cuidar da situação, ainda que houvesse, de fato, um furto. Certo é que esta situação jamais chegaria onde chegou caso a pessoa acusada não fosse uma pessoa notoriamente pobre. A Defensoria continuará incansável, vigilante e intransigível na defesa dos direitos das pessoas mais necessitadas."
HC 197.530