Opinião

A titularidade da propriedade intelectual no teletrabalho

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12 de fevereiro de 2021, 10h37

É inegável que temos vivido tempos de adaptações e desafios, sendo a introdução definitiva do teletrabalho uma das principais mudanças em nosso cotidiano. Esse modelo de trabalho, antes não tão comum no Brasil, mas rotineiro nos Estados Unidos e na Europa, veio para ser tendência em empresas de todos os tamanhos e setores.

Esse novo cenário em que o empregado não está a todo o momento sob o olhar do empregador e, muitas vezes, utiliza-se de seus próprios recursos para a consecução das atividades para as quais foi contratado, traz a seguinte reflexão: como serão reguladas as questões envolvendo a titularidade dos direitos de propriedade intelectual sobre as criações feitas em teletrabalho?

Em um modelo de trabalho tradicional, em que o empregado submete-se ao empregador, presta contas de seu trabalho, utiliza seus recursos, inclusive o ambiente também fornecido pelo empregador, pequena ou nenhuma dúvida surge sobre a titularidade do empregador sobre os direitos das criações.

Contudo, nos últimos tempos, ganhou força a adoção do teletrabalho em diversas áreas, na qual o empregado não está a todo momento sob o olhar do empregador, e muitas vezes utiliza-se de seus próprios recursos para a consecução das atividades para as quais foi contratado. Em razão disso, a reforma trabalhista, por meio da Lei nº 13.467/17, regulamentou o teletrabalho.

Analisado como um regime de trabalho recente, o teletrabalho proporcionou ao empregado autonomia para realizar suas atividades, mitigando o controle exercido pelo empregador em relação ao empregado.

Assim, a subordinação jurídica, requisito presente nas relações de emprego e definido pela legislação trabalhista, é drasticamente reduzida, ocorrendo o que grande parte da doutrina entende como o fenômeno da parassubordinação, a qual pode ser definida pela flexibilização da subordinação absoluta prevista para as relações de trabalho, havendo, inclusive, uma grande autonomia técnica.

A parassubordinação pode estar presente no teletrabalho e em outros tipos de relações laborais em que há uma relação de cooperação entre empregado e empregador, não existindo efetivamente uma subordinação técnica, sendo o empregado altamente qualificado para desempenhar suas funções.

De acordo com a Lei da Propriedade Industrial, salvo disposição em contrário, a invenção e o modelo de utilidade pertencem: 1) ao empregador quando decorrerem do contrato de trabalho ou da natureza dos serviços contratados; ou 2) ao empregado quando desenvolvidos de forma desvinculada ao contrato de trabalho e não decorrente da utilização de recursos do empregador; ou 3) ao empregado e ao empregador, em partes iguais, quando resultarem da contribuição pessoal do empregado e de recursos do empregador. A Lei de Software traz compreensão análoga para o desenvolvimento de programas de computador.

Contudo, tais normas foram editadas em um contexto em que a modalidade de teletrabalho sequer era cogitada pelas empresas brasileiras. Na atual conjuntura em que vivemos, o teletrabalho tornou-se um dos principais modelos adotados por diversas empresas e, por consequência, novas discussões vêm surgindo sobre a questão da titularidade de bens imateriais produzidos pelo empregado nesse novo formato de trabalho.

Com a legislação hoje existente, a fim de determinar a titularidade dos direitos sobre os materiais desenvolvidos, será imprescindível avaliar: 1) se o trabalho realizado foi requerido ou minimamente direcionado pelo empregador; 2) se o empregador forneceu os meios e recursos para a realização do trabalho; e 3) se o trabalho possui relação com o objeto do contrato de trabalho firmado pelas partes.

Ainda, para evitar questionamentos, é recomendada a inclusão no contrato de trabalho ou teletrabalho de cláusula específica de propriedade intelectual que defina a atuação do empregado e a titularidade sobre os trabalhos desenvolvidos na vigência contratual.

Em que pese a regulamentação do teletrabalho pela legislação brasileira, infelizmente os parâmetros para análise de várias questões ainda são precários, motivo pelo qual cada situação deverá ser avaliada de forma individual, devendo ser analisados todos os elementos envolvidos para que se possa dirimir a questão da propriedade do eventual bem imaterial produzido pelo empregado.

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