Caso Siqueira

Ministro que foi contra inquérito não deve ser relator do mesmo, diz STJ

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3 de fevereiro de 2021, 20h29

O ministro que, ao analisar um pedido para abertura de inquérito criminal, se posiciona contra a sua tramitação e fica vencido não deve ser mantido como relator do mesmo.

CNJ
Ministro Francisco Falcão será o relator do inquérito contra desembargador do TJ-SP

Essa foi a conclusão alcançada, por maioria, pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, que nesta quarta-feira (3/2) votou para transferir a relatoria do inquérito autorizado contra o desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Eduardo Siqueira.

Siqueira responde pelo episódio em que ofendeu um guarda municipal em Santos, ao ser autuado por não usar máscara enquanto caminhava pela orla. O Ministério Público Federal pediu inquérito para investigar a ocorrência, em tese, dos crimes de abuso de autoridade, infração de medida sanitária e desacato.

O caso foi inicialmente distribuído ao ministro Raul Araújo, que indeferiu o pedido por entender que não há justa causa para reprimenda penal. O Ministério Público Federal recorreu e, por maioria, a Corte Especial decidiu que o inquérito deveria ser instaurado. O voto vencedor foi do ministro Francisco Falcão, que ficou com a relatoria do acórdão.

Para Raul Araújo, a relatoria do inquérito seria mantida, pois não houve pronunciamento algum em questão de mérito ou que faça coisa julgada.

Para Falcão, essa relatoria se transfere porque o voto vencido não se restringiu a aspectos formais e incidentais, mas entrou no mérito da matéria, votando pela atipicidade da conduta e inexistência do crime. Ele chegou a despachar no inquérito, em 18 de dezembro, autorizando diligências pedidas pelo MPF.

Lucas Pricken
Relator, Raul Araújo foi contra abertura do inquérito por falta de justa causa
Lucas Pricken

Isenção para conduzir o inquérito
A Corte Especial já se posicionou sobre essa questão antes, na Ação Penal 849, quando entendeu que não ocorre a substituição do relator quando ele foi vencido quanto à mera admissibilidade da acusação. 

Quando o colegiado decidiu que Eduardo Siqueira deveria responder a inquérito, a maioria afastou o voto do ministro Raul Araújo por entender que ele, antes mesmo das investigações, invadiu o mérito e praticamente concedeu a absolvição sumária.

"Não vejo diferença nenhuma entre os dois casos", disse o ministro João Otávio de Noronha. "O precedente foi claríssimo. Coisa julgada não se fez. Questão de mérito não se tomou. Decidiu-se apenas pela abertura do inquérito". Ele foi o único a defender que Raul Araújo permanecesse com a relatoria.

Para a maioria, o fato de a recusa ao inquérito ter invadido o mérito da suposta ocorrência de crime é suficiente. "Para alguém que já se posicionou de maneira peremptória acerca do mérito ali debatido, não me parece legal nem racional que continua na posição de relator", disse o ministro Herman Benjamin.

O ministro Luís Felipe Salomão concordou. "O bom senso é de que quem já entendeu que faltava a justa causa, penso que ele não tem a isenção para a condução do processo. Ele tem [isenção] para votar. Mas para conduzir, não, porque já manifestou sua prévia opinião", afirmou.

Votaram desta forma os ministros Francisco Falcão, Felix Fischer, Nancy Andrighi, Laurita Vaz, Maria Thereza de Assis Moura, Herman Benjamin, Jorge Mussi, Og Fernandes, Luís Felipe Salomão, Mauro Campbell, Paulo de Tarso Sanseverino e o presidente Humberto Martins.

Rosinei Coutinho/SCO/STF
Ministro Gilmar Mendes suspendeu o inquérito contra o desembargador do TJ-SP
Rosinei Coutinho/SCO/STF

Inquérito paralisado
Além de indicar quem supervisionará o inquérito no STJ, a decisão também aponta quem responderá ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, que suspendeu as investigações por suspeita de violação dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.

Gilmar acolheu pedido da defesa de Eduardo Siqueira, segundo a qual a decisão do STJ de determinar a abertura de inquérito se deu sem intimação para apresentar contrarazões. Como mostrou a ConJur, o STJ tratou do tema na ocasião e decidiu que só após a instauração do inquérito é que se inaugura o contraditório.

QO no Inq 1.442

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