Boca na Botija

TJ-RS condena criminalmente advogado que se apoderou de dinheiro do cliente

Autor

2 de fevereiro de 2021, 14h52

Advogado que se apodera ilicitamente de dinheiro que pertence ao cliente incorre no crime de apropriação indébita majorada, previsto no artigo 168, parágrafo 1º, inciso III, do Código Penal. A tipificação desta conduta levou o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a confirmar sentença que condenou um advogado na comarca de Santo Augusto.

CNJ
Decisão é da 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do RS 
CNJ

A relatora da apelação na 6ª Câmara Criminal do TJ-RS, desembargadora Bernadete Coutinho Friedrich, disse que o réu se apropriou indevidamente de R$ 19.523,09, valor referente a benefícios previdenciários retroativos pertencentes à vítima. Ou seja, ele se apoderou e reteve valor muito superior ao previsto no contrato de honorários.

"A conta, na realidade, é simples. Os benefícios retroativos [da ação previdenciária] totalizam R$ 28.186,23, que, descontando a taxa referente ao TED, resulta o proveito econômico obtido em R$ 28.173,38. Assim, a remuneração que o acusado poderia ter retido correspondia a apenas R$ 7.043,34, e não a R$ 26.666,43’", explicou no voto.

Ao final do processo, o réu acabou condenado a um ano e quatro meses de reclusão e ao pagamento de dez dias-multa. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, consistentes na prestação de serviços à comunidade e na prestação pecuniária no valor de cinco salários mínimos.

"Deixo de reconhecer a atenuante pretendida pelo acusado, com base no fato do réu ter restituído os valores apropriados à vítima, já que o fez somente em 06/02/2020, ou seja, depois de proferida a sentença condenatória. O art. 65, inciso III, alínea ‘b’, do CP, prevê a incidência da causa legal de diminuição da pena apenas quando a reparação do dado precede ao julgamento, o que não ocorreu na espécie, pois a sentença condenatória foi proferida em 28/10/2019", fulminou a desembargadora-relatora, mantendo íntegra a sentença condenatória.

O acórdão de apelação, com decisão unânime, foi lavrado na sessão virtual de 10 de dezembro.

Levantamento do alvará
Os fatos que deram ensejo à denúncia criminal apresentada pelo Ministério Público ocorreram entre os dias 28 de maio e 18 de julho de 2013, no município de Chiapetta. Segundo narra a inicial, o cliente do advogado conquistou o direito de receber R$ 28.039,29 do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), fruto de vitória em ação previdenciária.

O alvará judicial foi levantado, no entanto, pelo advogado. Considerando que o ajustado entre as partes correspondia a 25% sobre o valor da liquidação de sentença, caberia ao causídico a importância de R$ 7.043,34 e à vítima R$ 21.030,04. Contudo, ele alcançou à vítima a importância de apenas R$ 1.506,95.

Citado pela 2ª Vara Judicial da comarca, o advogado contestou, alegando que o fato narrado na denúncia não caracteriza a conduta de estelionato. Nas razões defensivas, relatou que prestou diversos serviços jurídicos ao cliente — tanto na seara administrativa como na esfera judicial. Informou que o cliente restou devedor de serviços prestados, apesar de ter sido beneficiado com descontos. Em suma, sustentou que o litígio não passa de mero "desacerto comercial" entre cliente e advogado.

Sentença procedente
A juíza Evelise Mileide Boratti afirmou que a versão apresentada pelo advogado não se sustenta. É que, se ele quisesse cobrar por "supostos serviços prestados", deveria proceder à cobrança, de forma jurídica, e não se apropriar de valores recebidos pelo seu cliente. Além disso, os outros "trabalhos advocatícios" prestados à vítima não foram comprovados. E isso seria facilmente demonstrável pela simples juntada dos respectivos contratos firmados entre as partes.

"Ao contrário da tese defensiva, presente o ânimo de assenhoramento definitivo – animus rem sibi habendi –, uma vez que o réu, depois de estar na posse do valor, de maneira lícita, deixou de repassar a importância que a vítima deveria receber, ficando para si com o bem de outrem, recusando-se a repassar o valor correto, tendo em vista que até o presente momento não restituiu tal valor à vítima", anotou na sentença condenatória a juíza Evelise.

Clique aqui para ler a sentença
Clique aqui para ler o acórdão
123/2.15.0001244-7 (Comarca de Santo Augusto-RS)

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!