Opinião

Os deveres do administrador diante da agenda ESG

Autor

  • Camila Vertes Campos

    é advogada júnior formada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro atualmente advogada na CMW Advogados com experiência em Contencioso e Consultivo Tributário no Chediak Advogados e Societário no Ulhoa Canto.

24 de dezembro de 2021, 14h05

Com o fim de gerar um debate inédito, o presente artigo pretende desenvolver a relação dos deveres de diligência e lealdade dos administradores diante da "environment, social & governance" (ESG) criada pela Organização das Nações Unidas.

Primeiramente cabe elucidar que a ESG é uma coleção de práticas desenvolvidas para orientar as companhias nacionais e internacionais a perpetrarem boas práticas empresariais causando menos impactos no que tange: (1) a sustentabilidade do meio ambiente, (2) os relacionamentos sociais dentro das empresas e (3) os parâmetros de excelência na governança corporativa. Em breve síntese, a ESG funciona como um código de conduta para as empresas que pretendem adotar melhores padrões corporativos.

Diante da criação das referidas práticas, o mercado de investimentos se tornou ainda mais exigente frente as inovações trazidas pela ESG. Com o tempo, a dita exigência acabou por dar origem ao aperfeiçoamento dos produtos e serviços prestados, enquanto que as companhias passaram a, de fato, prezar pelo meio ambiente e a sociedade.

Em consequência disso, a diligência esperada de um administrador foi ampliada de forma que, atualmente, os debates e planejamentos que circundam a ESG se tornaram primordiais na consideração de fatores em tomada de decisões.

Isto posto, indaga-se: a atuação pautada pela ESG seria um mero dever ético ou um dever legal, juridicamente exigível? Certo é que não existe uma obrigação legislativa, portanto não criam deveres exigíveis aos administradores. O que existe são princípios que direcionam as condutas empresariais de forma a alcançar a função social da empresa de um modo mais seguro e sustentável.

De todo modo, os administradores, frente a esses padrões, passam a atuar com máxima diligência e profunda lealdade para com a companhia, englobando, claro, as instruções da ESG.

Nesse ponto cabe destacar que, o dever de diligência, previsto no artigo 153 da LSA, não exige o resultado do administrador, mas demanda tão somente a produtividade e o emprego de todos os esforços para que a companhia possa atingir seus objetivos de acordo com os ditames do bem público e da função social, observe:

"Artigo 153. O administrador da companhia deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios."

Ora, frente a isso, pode-se perceber que a diligência adequada dos administradores é crucial para determinar o emprego das inovações trazidas pela ESG. Por sua vez, o conceito de lealdade, previsto no artigo 154 da LSA, implica a fidelidade do administrador às obrigações e deveres perante a companhia, in verbis:

"Artigo 154. O administrador deve exercer as atribuições que a lei e o estatuto lhe conferem para lograr os fins e no interesse da companhia, satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa."

Portanto, tanto o dever de lealdade como o de diligência estabelecem preceitos que, por consequência, resultam na constituição de um padrão de comportamento exigido pelos, e para, os administradores, de modo a alcançar os interesses da companhia.

Cabe ressaltar que os princípios e regras trazidos pela ESG não são obstantes ao faturamento da companhia. Em outras palavras, é obvio que as empresas devem continuar perseguindo lucro. Isto é, desenvolver uma companhia harmônica, onde o rendimento e o zelo pelos 3 pilares da ESG não são antagônicos.

Como resultado, é possível concluir que as orientações propostas pela ESG serão aplicadas por aqueles acionistas, controladores e administradores que, de fato, desempenham os deveres de diligência e lealdade. À vista disso, a doutrina e a jurisprudência avaliam e ponderam a efetivação de tais deveres pela companhia.

Face ao exposto, pode-se constatar que os acionistas controladores devem utilizar o poder de controle para nomear administradores que priorizem os interesses da companhia, pautando-se sempre pelo dever de diligência e lealdade. Isso dado que a adequação das empresas em relação aos parâmetros da ESG impactam diretamente na confiança de seus acionistas.

Alinhado a esse entendimento, o artigo 166, parágrafo único da LSA, consagra a existência do dever de diligência e de lealdade atribuível aos acionistas controladores. Nele o acionista controlador deve usar seu poder de controle com o fim de realizar o objeto e a função social da companhia. Vejamos:

"Parágrafo único. O acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender."

Diante de todo exposto, é possível constatar que as medidas da ESG consistem em uma ferramenta de efetivação da função social de forma adequada, digna e exemplar, para a composição de uma companhia cujos administradores se baseiam no dever de diligência e lealdade, colocando os interesses da companhia em primeiro lugar.

E mais! Conclui-se que os acionistas controladores  — aqueles que detêm a maior parte do capital votante — devem pautar sua gerência com base nos deveres de diligência e lealdade, atendendo não só a função social lucrativa, mas construindo um planejamento sustentável no campo ambiental e social da empresa, digno do selo ESG.

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    é advogada júnior formada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, atualmente advogada na CMW Advogados, com experiência em Contencioso e Consultivo Tributário no Chediak Advogados e Societário no Ulhoa Canto.

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