Opinião

O mercado financeiro e o aquecimento global

Autor

  • Tiago Andrade Lima

    é sócio da área de Direito Ambiental e Sustentabilidade de Queiroz Cavalcanti Advocacia doutorando em Sustentabilidade pela USP mestre em Tecnologia Ambiental pelo ITEP e especialista em Direito Urbanístico e Ambiental pela Faculdade Salesiana do Nordeste (Fasne).

22 de dezembro de 2021, 13h56

O aquecimento global é uma realidade inegável e uma preocupação que integra a agenda internacional de diversos países. Segundo os dados divulgados no Relatório do IPCC em 2019, esse fenômeno é o responsável direto por vários impactos causados sobre a Terra, incluindo incêndios florestais, mudanças na precipitação e ondas de calor.

Nesse sentido, o desenvolvimento econômico do país deve considerar essa realidade e colocar sob a perspectiva a finitude dos recursos naturais disponíveis no meio ambiente e a necessidade de inserção de novas tecnologias que privilegiem o reaproveitamento dos recursos não renováveis.

Essa realidade se impôs pela primeira vez por meio do Acordo de Paris, quando foram imputadas obrigações para os países em desenvolvimento. As Partes, incluindo o Brasil, acordaram que cada país deveria elaborar e apresentar sua "pretendida contribuição nacionalmente determinada" (iNDC, na sigla em inglês), na qual deveriam indicar o esforço que estariam dispostos a fazer para contribuir com o objetivo principal da Convenção [1] .

Foi neste cenário que ganhou importância fundamental a avaliação pelas instituições financeiras de fomento sobre as atividades a serem estimuladas e os seus impactos sobre as mudanças climáticas como fator preponderante para se ter clareza quanto à acuracidade dos dados levantados e a certeza dos resultados esperados. É a necessária atenção com o chamado financiamento do clima, termo que se refere às estratégias para apoiar os investimentos em mitigação e adaptação à mudança climática.

Segundo Lins e Wajnberg (2007, p. 11) é inegável o impacto ambiental indireto causado pelo mercado financeiro no financiamento para seus clientes e no seu relacionamento com seus fornecedores [2] . Ainda de acordo com os autores, o principal papel dos bancos no desenvolvimento sustentável não é um papel de executor de mudanças, mas sim de indutor de mudanças nas partes com as quais se relaciona. É importante ressaltar que, no Brasil, o setor bancário é o grande provedor de recursos para o desenvolvimento econômico. 

Atualmente, as instituições financeiras no Brasil estão obrigadas a manter uma política de gerenciamento de riscos socioambientais. Desse modo, em setembro de 2021, o Banco Central lançou uma série de normas para atendimento às finalidades supracitadas. A Resolução nº 4.943/2021 do Conselho Monetário Nacional (CMN), por exemplo, incluiu na estrutura de gerenciamento de riscos a necessidade de se avaliar os riscos ambientais, sociais e climáticos. Com a criação, nesta norma, dos artigos 38-A, 38-B e 38-C, as instituições financeiras passarão a ser cobradas não só pelos financiamentos que cometam infrações ou crimes no exercício de suas atividades, mas também, pela ocorrência de "ato ou atividade que, apesar de regular, legal e não criminoso, impacte negativamente a reputação da instituição, em decorrência de degradação do meio ambiente". (Banco Central do Brasil, 2021).

Em recente relatório, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) informou que, em diferentes graus, investidores institucionais e bancos centrais estão usando métricas e metodologias do ESG para reequilibrar suas carteiras, a fim de incorporar melhor os riscos climáticos e, por sua vez, facilitar a sustentabilidade do sistema financeiro. O relatório aponta, porém, o desafio sobre a qualidade, comparabilidade e disponibilidade de dados ESG, bem como a falta de divulgação padronizada do ESG.

É fato, portanto, que as instituições financeiras passarão a ser cada vez mais cobradas não só pelos financiamentos que cometam infrações ou crimes no exercício de suas atividades, mas também, pela ocorrência de ato ou atividade que, apesar de regular, legal e não criminoso, impacte negativamente a reputação da instituição, em decorrência de degradação do meio ambiente.

O descumprimento de condicionantes, que também foi apontado como merecedor de análise, deverá impulsionar as instituições financeiras a criarem processos rígidos e transparentes de avaliação permanente dos empreendimentos financiados.

Assim, as métricas ESG terão papel primordial para analisar se, na prática, esses referidos critérios são efetivos e estão sendo contemplados nos investimentos realizados. Isso porque, com o desenvolvimento deste novo ambiente regulatório, as instituições financeiras brasileiras passarão a funcionar como um catalizador de medidas de apoio à transição para um novo modelo de economia que incorpore critérios ESG e que esteja alinhada com a pauta dos riscos climáticos.

 


[1] De acordo com o parágrafo 16 (b) do Chamado de Lima para ação sobre mudança do clima, estabeleceu-se o prazo para que as iNDCs fossem comunicadas pelas Partes até 1º de outubro de 2015, de forma que constasse em documento técnico sobre o efeito agregado das contribuições, que deveria subsidiar a COP-21.

[2] LINS, C. WAJNBERG, D. Sustentabilidade corporativa no setor financeiro brasileiro. Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável. 2007

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  • é sócio titular na área de Direito Ambiental do Queiroz Cavalcanti Advocacia, mestre em Tecnologia Ambiental pelo Itep e especialista em Direito Urbanístico e Ambiental pela Faculdade Salesiana.

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