Retrospectiva 2021

Em fevereiro, foi decretada a prisão de Daniel Silveira por ataques ao STF

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22 de dezembro de 2021, 8h20

Durante o mês de fevereiro de 2021, mais um episódio de desrespeito às instituições democráticas chocou o país. Após ataques ao Supremo Tribunal Federal e declarações favoráveis à ditadura militar, o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) foi preso em flagrante, por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do STF. 

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Ao decretar a prisão de Silveira, Alexandre destacou alguns dos trechos mais absurdos do da fala do deputado. No vídeo, ele comenta nota do ministro Luiz Edson Fachin, que repudiou a tentativa do alto comando do Exército de intimidar o Supremo. Em um determinado momento, o deputado diz que já imaginou dar uma “surra” em todos os ministros do STF e prometeu persegui-los.

Para Alexandre de Moraes, o parlamentar afrontou a Constituição, nos seguintes aspectos: propagação de ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado Democrático (artigos 5º, XLIV; 34, III e IV); e manifestações visando o rompimento do Estado de Direito, com a extinção das cláusulas pétreas constitucionais. Além disso, o deputado cometeu crime contra a honra do Poder Judiciário e dos ministros do Supremo, com condutas previstas na Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/73), artigos 17, 18, 22, incisos I e IV, 23, incisos I, II e IV e 26.

Por unanimidade, o Plenário do STF confirmou a decisão do ministro Alexandre de Moraes e manteve a prisão do parlamentar, por entender que as declarações contra a democracia e o Estado de Direito não estão cobertas pela imunidade parlamentar. Ainda em fevereiro, a Câmara dos Deputados votou por manter a prisão do deputado, com 364 votos favoráveis e 130 contrários.

Daniel Silveira, eleito na esteira da onda bolsonarista, se orgulha de ter sido preso “mais de 90 vezes” pela Polícia Militar do Rio de Janeiro pelos delitos que cometeu. O deputado, que diz ser professor de luta, ficou famoso ao bater numa placa de rua com o nome da vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018.

Veja as principais notícias do mês na coluna Resumo da Semana:

6/2 – Novos diálogos do consórcio de Curitiba foram o destaque
13/2 – Decisão do STF que garantiu a Lula acesso a diálogos foi destaque
20/2 – Prisão de deputado por ataques ao Supremo foi destaque
27/2 – Depoimento falso tomado pela delegada Erika foi o destaque

Desdobramentos da vaza jato
No início de fevereiro, novas mensagens em que o ex-juiz federal Sergio Moro orienta procuradores da República sobre os processos da operação "lava jato" foram tornadas públicas, depois que o ministro Ricardo Lewandowski, do STF, retirou o sigilo da reclamação que deu à defesa do ex-presidente Lula acesso às mensagens apreendidas na "spoofing".

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Em fevereiro, novas mensagens entre procuradores e o ex-juiz Sérgio Moro foram divulgadas
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Os diálogos também demonstraram a nítida pretensão do procurador Deltan Dallagnol de "comandar" uma suposta renovação política, a articulação entre procuradores para emparedar o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, e também a fixação dos tarefeiros pela ConJur. Esta revista eletrônica foi citada nada menos que 24.639 vezes pelos interlocutores.

Durante o mês, outras mensagens apareceram, deixando a perseguição contra Lula mais explícita. Um dia depois de o ex-presidente ter sido levado coercitivamente para depor na Polícia Federal, a procuradora da República, Carolina Rezende, disse que "depois de ontem, precisamos atingir Lula na cabeça (prioridade número 1), para nós da PGR, acho que o segundo alvo mais relevante seria Renan [Calheiros]".

Os procuradores reagiram à exposição pública de seus métodos e pleitearam no STF um pedido de reconsideração, alegando que a divulgação dos diálogos coloca em risco a vida deles, além de expor seus amigos e familiares. Quem também acionou o STF contra a revelação das conversas foi o ex-juiz Sergio Moro. 

Moro e procuradores não reconhecem a autenticidade das mensagens. No entanto, quem apreendeu os arquivos com o hacker foi a Polícia Federal, que verificou a autenticidade dos documentos. A 2ª Turma do STF, pelo placar de quatro a um, negou o pedido de reconsideração.

No final do mês, a defesa do ex-presidente Lula encaminhou ao STF mensagens indicando que uma delegada da Polícia Federal forjou e assinou depoimentos que jamais ocorreram. E tudo com a anuência dos procuradores de Curitiba.

Os fatos foram obtidos de diálogo mantido entre os procuradores Deltan Dallagnol e Orlando Martello Júnior em janeiro de 2016. Nele, eles relatam o que contou uma delegada da Polícia Federal chamada Erika — possivelmente a delegada Erika Marena, que era a responsável pelos casos da "lava jato".

"Como expõe a Erika: ela entendeu que era pedido nosso e lavrou termo de depoimento como se tivesse ouvido o cara, com escrivão e tudo, quando não ouviu nada… Dá no mínimo uma falsidade", disse Deltan.

Entrevista do mês
Em fevereiro, Marina Pinhão Coelho Araújo, advogada e presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), afirmou, em entrevista à ConJurque, embora em matéria processual a lei "anticrime" tenha introduzido mudanças positivas, como a criação do juiz de garantias, na esfera penal ela apenas aprofunda desigualdades sociais.

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Em fevereiro, Marina Coelho Araújo foi entrevistada pelo ConJur e falou sobre a aplicação de prisões preventivas
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"Já aprendemos que, na prática, não adianta aumentar o tempo de pena em regime fechado. Mas é isso que a lei 'anticrime' trouxe. Ela vai na contramão das evidências empíricas. É uma legislação que continua prendendo por muito tempo pessoas que estão em uma condição social vulnerável", ressaltou. 

A advogada também comentou as medidas que visam mitigar o avanço do novo coronavírus nos presídios. Para ela, as iniciativas foram ineficazes, uma vez que teria faltado ao Judiciário consciência no momento de reavaliar prisões preventivas. Segundo ela, esse não é um fenômeno observado apenas durante a epidemia, pois há um descompasso entre o que dizem as leis e como elas são aplicadas. 

"Os requisitos da prisão preventiva no Brasil são muito claros e considero o sistema penal constitucional muito transparente no sentido de que a prisão preventiva cautelar é uma exceção. Em teoria, a regra é responder ao processo em liberdade. A aplicação disso, no entanto, vem sendo feita de outra maneira. O Judiciário aplica a preventiva, na grande maioria dos casos, como regra. Principalmente em casos de tráfico de drogas e roubo", disse.

Veja outras entrevistas de fevereiro:

* Conrado Gontijo, criminalista, doutor em Direito Penal e Econômico pela USP: Regulamentar o lobby garantiria peso de aspectos técnicos às decisões do governo

* Maria Lia Pinto Porto Corona, procuradora-Geral do estado de São Paulo: "Sem inteligência artificial, cobrança da dívida inscrita estaria condenada" 

* André Costa, advogado e conselheiro federal da OAB: "Brasil precisa se assumir racista", diz autor da proposta de cotas na OAB

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