Opinião

Um ano de importantes alterações legislativas no Direito Eleitoral

Autores

  • Gabriel Borges Llona

    é especialista em Direito Constitucional e Administrativo pela Escola Paulista de Direito e em Direito Eleitoral pela Escola Paulista de Magistratura (SP) e membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP.

  • Juliane Nakamura

    é especialista em Direito Eleitoral do escritório Vilela Miranda & Aguiar Fernandes Advogados.

18 de dezembro de 2021, 10h01

Não existem dúvidas de que o ano de 2021 foi completamente atípico, sofrendo ainda com os efeitos da pandemia que assolou o mundo nos últimos tempos. Na seara eleitoral também não foi diferente, ficando o ano marcado em razão das diversas e relevantes mudanças ocasionadas na legislação e que certamente acarretarão em grande impacto para as eleições dos próximos anos.

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Somente nos últimos cinco meses, o Congresso Nacional aprovou, com vigência a partir de 2022, cinco proposições legislativas que modificaram a legislação eleitoral e partidária. São elas:

— Emenda Constitucional nº 111, de 28 de setembro;

— Lei Complementar nº184, de 29 de setembro;

— Lei Ordinária nº 14.192, de 4 de agosto;

— Lei Ordinária n° 14.208, de 28 de setembro;

— Lei Ordinária nº 14.211, de 1º de outubro.

O que mais ganhou destaque nas alterações propostas é a preocupação legislativa de garantir maior representatividade das minorias no cenário político, em especial das candidatas do gênero feminino, que por muitos anos foram excluídas ou diminuídas no âmbito democrático.

A título de exemplo, extrai-se a Lei 14.192/21, que implementou a previsão de prevenção, repressão e combate à violência política contra a mulher. Referida lei prevê pena que varia de um a quatro anos de reclusão, com agravante nos casos de assédio, constrangimento, humilhação, perseguição ou ameaça, por qualquer meio, à candidata ou detentora de mandato eletivo, assim como na hipótese de menosprezo à mulher ou à sua cor, raça ou etnia, com a finalidade de impedir ou dificultar a sua campanha eleitoral ou o desempenho do mandado ao qual foi eleita.

Também nesse sentido de conferir maior visibilidade às minorias políticas, a EC 111/21 trouxe em seus dispositivos a previsão de contagem de votos em dobro para as mulheres e também para os negros. Isto é, para fins de distribuição dos recursos de fundo partidário e fundo eleitoral, os votos dados a candidatas mulheres ou a candidatos negros para a Câmara dos Deputados nas eleições realizadas de 2022 a 2030 serão contados em dobro. Trata-se de verdadeiro avanço às políticas de diversidade, que poderá trazer bons resultados ao pluralismo político brasileiro.

A emenda constitucional também trouxe outras importantes modificações, entre as quais destacam-se:

— Consulta popular: cria a consulta popular em âmbito municipal, realizada concomitantemente às eleições municipais, se aprovada pela Câmara dos Vereadores e encaminhada à Justiça Eleitoral até 90 dias antes das eleições;

— Flexibilização da fidelidade partidária: os parlamentares eleitos em eleição proporcional podem se desligar, sem perda de mandato nos casos de anuência do partido e de outras hipóteses de justa causa estabelecidas em lei;

— Mudança na data de posse: o presidente e os governadores eleitos tomarão posse em 1º de janeiro de 2023, porém terão seus mandatos prorrogados, respectivamente, até 5 e 6 de janeiro de 2027. A partir de 2026, a posse dessas autoridades se dará sempre nestas datas: 5 e 6 de janeiro do primeiro ano do mandato;

Outra notável mudança ocorrida neste ano é alteração da redação da Lei nº 9.096/1995 (Lei dos Partidos Políticos), por meio da Lei nº 14.208/2021, que criou o instituto da federação partidária. Essa nova figura permite a união entre partidos políticos, em especial para concorrerem em eleições proporcionais (para deputado federal, estadual e vereador) nos próximos anos. Isto é, após o registro perante o TSE, a federação atuará como se fosse uma única agremiação partidária, sendo que, para efeito de cumprimento da cláusula de barreira e de acesso aos fundos eleitoral e partidário, os partidos integrantes da federação deverão, além de cumprir outros requisitos, devem permanecer unidos por quatro anos, período durante o qual fica assegurada sua identidade e a autonomia.

Já em relação à figura das inelegibilidades, ganha relevo o contido na Lei Complementar nº 184/2021, que excluiu da incidência de inelegibilidade, prevista no artigo 1º, I, alínea "g", (rejeição de contas públicas) os responsáveis que tenham tido contas julgadas irregulares sem imputação de débito e com condenação exclusiva ao pagamento de multa. Em outras palavras, a norma dispõe que apenas àqueles que tiveram suas cotas rejeitadas por improbidade administrativa e por decisão irrecorrível do órgão competente é que pode ficar inelegível.

Por sua vez, a Lei 14.211/2021 trouxe alterações tanto para o Código Eleitoral quanto para a Lei das Eleições (Lei 9.504/97), no sentido de: 1) ajustar a sua redação à vedação constitucional de coligações nas eleições proporcionais; 2) fixar critérios para a participação dos partidos e dos candidatos na distribuição dos lugares pelo critério das maiores médias nas eleições proporcionais, dispondo nesse novo regramento que, para conquistar uma cadeira na distribuição das "médias/sobras", os partidos devem atingir 80% do quociente eleitoral e os candidatos devem ter um número maior do que 20% do quociente eleitoral para se elegerem; e 3) reduzir o limite de candidatos que cada partido poderá registrar nas eleições proporcionais, passando ao montante de 100% + 1 do total de vagas a preencher para Câmara dos Deputados, Assembleia Legislativa e Câmara de Vereadores para o montante.

Essa nova norma também dispõe sobre os debates eleitorais, determinando que as regras e número de participantes precisam ser aprovados por pelo menos dois terços dos candidatos aptos, devendo assegurar a presença de número equivalente de candidatos de todos os partidos a um mesmo cargo eletivo, respeitada a proporcionalidade de homens e mulheres (mínimo de 30% e máximo de 70% por sexo), podendo os debates ser realizados em mais de um dia.

Por fim, também é importante destacar que o TSE, neste mês de dezembro, já aprovou quatro resoluções sobre as regras que serão aplicadas nas eleições de 2022 (Instrs 0600741-21, 0600749-95, 0600590-84 e 0600589-02). As normas aprovadas tratam do fundo eleitoral (FEFC); da arrecadação e gastos de campanha por partidos e candidatos e prestação de contas; atos gerais do processo eleitoral; e do cronograma do cadastro eleitoral. Entre as principais novidades instituídas pelo TSE, revela-se a possibilidade de arrecadação financeira de campanhas pelo PIX e por meio de realização de eventos musicais, permitindo apresentações artísticas e shows em eventos que tenham esse objetivo específico de arrecadação (o que não se confunde com a realização de showmícios, que continua proibido pela legislação eleitoral).

Além disso, o TSE também demonstrou sua preocupação acerca da distribuição de recursos para segmentos representativos da sociedade, determinando que a distribuição dos recursos às mulheres e às pessoas negras deve ser repassada até a data da prestação de contas parcial de campanha, para evitar a entrega tardia das verbas, o que prejudicaria a campanha destes(as) candidatos(as).

Como se pode notar, depois de um ano absolutamente turbulento, marcado por instabilidades econômicas e governamentais, 2021 apresentou significativas mudanças eleitorais, o que exigirá não só a flexibilidade dos partidos políticos, candidatos e dos profissionais que atuam na área, mas a constante atenção e atualização às normas vigentes, em especial sobre as resoluções editadas pelo TSE que regulamentarão toda a legislação acima mencionada, com o intuito de tornar as regras mais claras e objetivas para a eleição do próximo ano.

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