Crescimento do Pix não interfere na emissão de moeda
15 de dezembro de 2021, 19h08
Veículos de comunicação têm noticiado a suposta correlação entre as variações de emissão de moeda e o surgimento do Pix, ferramenta amplamente adotada por parte significativa da população brasileira e que facilitou a realização de pagamentos para parcela da população. Essas notícias têm estabelecido relação de causa e consequência entre o lançamento e a popularização do Pix e a quantidade de emissão de dinheiro no Brasil, sem necessariamente atentar aos múltiplos fatores que influenciam essas variações.
Parte das diferenças na quantidade de emissão de dinheiro, enfrentadas anualmente pelas empresas que transportam numerário, refere-se à sazonalidade: entre novembro e dezembro de todos os anos costuma-se ter emissão mais significativa de papel-moeda. Isso se dá principalmente em virtude das festas de final de ano, que movimentam a economia de maneira significativa, com diminuição proporcional no mês de janeiro.
Mesmo considerando essa sazonalidade entre o final do ano e os demais meses, que, de acordo com os associados do Instituto de Estudos Estratégicos de Tecnologia e Ciclo de Numerário (ITCN), fica em torno de 10%, é necessário ressaltar que a demanda por dinheiro no Brasil de fato aumentou durante a pandemia. Isso pode ser comprovado com base nos próprios dados oficiais sobre circulação de dinheiro do Banco Central.
Em janeiro de 2020, antes do início da pandemia da Covid-19, havia cerca de 6,6 bilhões de cédulas em circulação, correspondentes ao total de R$ 250,4 bilhões. Em junho de 2020, esses valores aumentaram para 7,8 bilhões e R$ 310,9 bilhões, respectivamente. Já em novembro de 2021, houve novo aumento para R$ 324,6 bilhões. O Banco Central ponderou, em nota à imprensa, que não existe nenhum estudo que comprove ou correlacione a queda no uso de papel moeda e a utilização do Pix. Parece-nos, inclusive, que o Pix vem ganhando espaço nas transferências, em detrimento de ted e doc para pessoas físicas, principalmente por causa de sua rapidez, praticidade e ausência de custo. Mas não parece existir, de fato, relação direta com o dinheiro em espécie.
Importante ressaltar que as fintechs, atores que utilizam a tecnologia de maneira intensa para a prestação de serviços financeiros, embora extremamente relevantes nesse contexto de aumento da digitalização, também precisam ter acesso ao dinheiro em espécie. Isso ocorre principalmente porque seus clientes têm essa demanda, suprida pelas empresas de transporte de valores com o traslado do dinheiro entre diversos pontos do Brasil. Note-se que são justamente as empresas transportadoras de valores, bem como as gerenciadoras de caixas eletrônicos, que suprem a demanda do brasileiro por dinheiro, levando o numerário de regiões com alto número de depósitos para outras com elevada quantidade de saques. Essa é uma atividade que requer planejamento logístico minucioso, cuidado e atenção permanente e, é claro, investimento em tecnologia capaz de desincentivar atividades criminosas, como o entintamento, técnica que inutiliza cédulas roubadas. Importante lembrar que o dinheiro não é o vilão, tampouco o causador da violência urbana, do mesmo modo que o Pix não pode ser culpado pelos inúmeros golpes que têm ocorrido nos últimos meses. É necessário implementar políticas públicas eficientes para combater os diversos tipos de atividade criminosa. A solução certamente não é limitar a possibilidade de escolha entre meios de pagamento, mas estabelecer diálogo saudável com a sociedade como um todo para encontrar soluções mitigadoras.
O Pix é uma realidade, mas não é — e pouco provavelmente será — o único meio de pagamento utilizado pelos brasileiros nas próximas décadas. Trata-se de um sistema novo, que ainda está sendo conhecido e explorado pelo mercado. A necessidade de ajustes, que têm sido feitos paulatinamente pelo órgão regulador, permitirá que o arranjo se adapte à realidade brasileira, às questões relacionadas à segurança, à experiência do usuário, à interação com os bancos e com o comércio, entre diversas outras questões. O dinheiro ainda é o meio de pagamento mais utilizado entre os brasileiros, com aceitação obrigatória no país inteiro, independentemente de conectividade à internet, acesso a smartphone ou a aplicativo de banco ou até mesmo da existência de conta em instituição financeira.
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