Tribunal do júri

Covid-19 ajuda advogados a entender melhor os jurados nos EUA

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13 de dezembro de 2021, 9h38

À medida que os julgamentos voltam para a instalações físicas das cortes, os juízes iniciam os procedimentos da seleção do júri com uma pergunta óbvia: quem tem medo do coronavírus? Para quem tem receio da Covid-19, o juiz explica as medidas que foram tomadas para evitar infecções ou considera dispensá-las.

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Advogados e promotores tomaram notas. E, depois de julgamentos, procuraram saber as posições de cada jurado sobre um caso específico durante as deliberações. O que descobriram é interessante: nas discussões, os jurados que não se preocupam com a Covid-19 tendem a defender a culpa do réu; os que se preocupam, tendem a defender a inocência. Má notícia para a defesa: os juízes tendem a dispensar os cuidadosos. Promotores podem recusá-los por justa causa.

Extrapolando, uma forma de se saber mais sobre as  tendências dos candidatos a jurados é buscar uma explicação sobre as pessoas que se preocupam e as pessoas que não se preocupam com a Covid-19. Sabe-se que as pessoas "cuidadosas" são, na maioria, liberais. E as "despreocupadas" (e, por sinal, resistentes à vacina) são conservadoras.

Isso bate com um estudo do consultor de júri John Campbell, que disse ao Washington Post: "Em julgamentos criminais, um júri conservador tem a tendência de considerar o réu culpado, enquanto um júri liberal tem a tendência de considerá-lo não culpado".

"Um dos indicadores mais confiáveis do comportamento de um possível jurado é sua ideologia política. Assim, qualquer mudança na configuração política do júri pode ter um grande impacto no veredicto final", disse Campbell ao jornal.

Para se saber quem se preocupa ou não com o coronavírus ou quem é favor ou contra a vacinação — e, portanto, quem é liberal e quem é conservador, basta perguntar às pessoas qual é a principal fonte de suas informações.

Se for, por exemplo, a conservadora Fox News, sabe-se são contra a vacina, o uso de máscara e todas as demais medidas de proteção. Se for a liberal CNN ou a ainda mais liberal MSNBC, sabe-se que são a favor da vacina e das demais medidas de proteção. Ressalva: opiniões dos âncoras da Fox News e de parte de sua audiência têm mudado um pouco ultimamente.

Essas suposições valem para casos criminais apenas. Em julgamentos civis (que também podem ter júri, nos EUA), a tendência é oposta: no caso, por exemplo, de uma ação movida por um consumidor contra uma empresa, os liberais tendem a ficar do lado do consumidor e os conservadores tendem a ficar do lado da empresa.

Para colocar em contexto
Porque advogados e promotores têm uma participação ativa na seleção do júri, nos EUA, essa fase do julgamento é fascinante. E frequentemente decisiva, porque o advogado (ou promotor) pode ganhar ou perder uma causa ali — da mesma forma que um time pode ganhar um jogo no vestuário, antes de entrar em campo, por adotar a estratégia certa.

Assim, os criminalistas se dedicam, "eternamente", à missão de entender as pessoas convocadas para a seleção do júri, para poder usar, da forma mais eficaz, as armas que dispõem: um certo número (dependendo da jurisdição) de recusas motivadas por "justa causa" (challenges for cause) e as recusas imotivadas ou peremptórias (peremptory challenges).

O sistema ajuda os advogados e promotores a identificar quem é quem no pool de candidatos a jurados. Antes de qualquer coisa, os candidatos respondem a um questionário por escrito. Depois, na sala do "voir dire", eles podem, em muitas jurisdições, interrogar os candidatos e obter respostas que dão uma boa ideia sobre quem eles são, o que sabem, o que pensam e preconceitos que cultivam — além de características óbvias, como raça, sexo, etc.

Defensores públicos e muitos outros advogados de defesa reclamam, há muito tempo, que o júri nunca representa fielmente a comunidade em que o réu vive. Por exemplo, por causa do pagamento ínfimo por dia de julgamento e de muito tempo fora do trabalho ou de casa, pessoas pobres, trabalhadores horistas e trabalhadores autônomos dão um jeito de se excluir dos escolhidos ou sequer comparecem à corte para servir como jurado.

Outras características: aqueles que comparecem têm carro próprio e quem cuide das crianças; os aposentados querem ser jurados; os jovens não querem; pessoas que apoiam a polícia e os promotores dificilmente são excluídas do júri; as que desconfiam são excluídas; pessoas que consideram certas leis imorais, tais como as leis sobre drogas, são mais provavelmente excluídas; pessas negras são rotineiramente excluídas do júri, em taxas desproporcionais, segundo o Washington Post.

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