Situação angustiante

Falta de oxigênio gera nexo causal em morte de infectado por Covid-19

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11 de dezembro de 2021, 7h37

Por entender que ficou comprovado o nexo causal entre a morte de um homem infectado por Covid-19 e a falha do sistema de oxigênio de uma unidade de saúde pública, o juiz Bruno Gonçalves Mauro Terra, da 2ª Vara de Fazenda Pública da Comarca de Santo André, condenou o Estado de São Paulo e a Fundação ABC a indenizar a viúva e seu filho em R$ 200 mil cada um por danos morais e materiais. 

Divulgação/White Martins
Homem morreu em decorrência de falha no sistema de oxigênio de unidade de saúde
Divulgação/White Martins

Além da indenização, o magistrado determinou que os réus paguem pensão no valor equivalente a 2/3 do salário-mínimo até que o menor complete 25 anos de idade e 1/3 do salário-mínimo a viúva por seis anos.

No caso concreto, o homem se recuperava da infecção e morreu após falha no fornecimento de oxigênio de um ambulatório público na cidade do ABC. Em sua defesa, a fundação argumentou ausência de responsabilidade civil dado o grave estado de saúde do paciente, que estava com 75% do pulmão comprometido. A Fazenda Pública de São Paulo, por sua vez, argumentou que a unidade de saúde onde a falha ocorreu era administrada pela Fundação ABC e que o contrato firmado com a entidade prevê responsabilidade da gestora.

Ao analisar o caso, o magistrado inicialmente apontou que os fatos narrados pelos autores da ação são incontroversos e não foram contestados nem pela fundação e tampouco pela Fazenda Pública de São Paulo.

Ele também afastou a alegação de ilegitimidade passiva do Estado, já que o serviço de saúde é de responsabilidade dos entes federados, e tal responsabilidade não é excluída pela circunstância de existir contrato de gestão entre o administrador público e a entidade de direito privado.

"Com efeito, cabe ao Estado, no exercício da sua discricionariedade administrativa, optar pela prestação direta ou indireta do serviço público de saúde; caso opte pela prestação indireta, contudo, o Estado continua responsável (solidário) por eventuais prejuízos causados aos usuários, já que é ele o titular do serviço", explicou o juiz, que ressaltou que a existência de cláusula contratual que exime a administração de responsabilidade por falhas na prestação de serviço não é oponível a terceiros.

O juiz cita o laudo pericial preliminar que concluiu que a pane na usina de oxigênio do hospital no dia dos fatos se deu por uma série de irregularidades que vão desde a montagem do equipamento até a falta de treinamento da equipe de manutenção noturna.

"A leitura dos boletins chega a ser angustiante. O oxigênio acabou, a equipe tentou suprir a demanda do paciente de outras maneiras, sem sucesso; foram acionados a manutenção, as autoridades responsáveis, o Samu. Mas a ajuda não veio. E o paciente morreu. É óbvio que a situação era urgente, premente; tanto que (…) morreu logo em seguida — o que só torna mais evidente o nexo de causalidade entre uma coisa e outra", escreveu o juiz na decisão.

A magistrado lembra que o sistema de oxigênio da unidade de saúde poderia ter sido restabelecido imediatamente, desde o início da madrugada, com um simples comando (rearme) no disjuntor. "Um simples pressionar de botões, e a vida dele (e das outras duas vítimas) teria sido salva. O erro foi gravíssimo. Foi grosseiro, crasso", ponderou.

Além do marido da autora da ação, também morreram outras duas pessoas no dia da pane do sistema de oxigênio. A família da vítima foi representada pelo escritório Cirilo Advocacia.

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1014551-23.2021.8.26.0554

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