Vereadores do PTB têm mandatos cassados por burla à cota de gênero
10 de dezembro de 2021, 21h56
Comprovada a existência de fraude na cota de gênero, toda a chapa fica contaminada, pois o vício está na origem — ou seja, seu efeito é ex tunc (retroativo), devendo haver cassação dos mandatos dos vereadores eleitos por fraude eleitoral e anulação dos votos no partido.

Fernando Frazão/Agência Brasil
Com esse entendimento, a 109ª Zona Eleitoral de Serrana (SP) cassou o mandato de vereadores do PTB por candidaturas laranjas, durante as eleições de 2020, em Serra Azul (SP). As candidaturas de Adelina Freitas Lourenço e Mariana Aparecida de Paula Leão eram, na verdade, candidaturas fictícias, registradas apenas para preencher a quota de participação feminina nos partidos imposta pela Lei das Eleições.
O Ministério Público Eleitoral e o escritório Ribeiro de Almeida Advogados entraram com ações de investigação para demonstrar que mais de dez pessoas teriam cometido fraude no processo eleitoral. Alegaram que Adelina e Mariana foram candidatas, mas praticaram campanha de forma fictícia. Sustentaram ainda que elas igualmente cometeram o mesmo ilícito eleitoral dos demais representados.
As duas candidatas não receberam votos, demonstrando que a candidatura não foi efetivamente pensada para a concorrência ao pleito, mas apenas para cumprimento da cota. Os autores também disseram que as candidatas fictícias não receberam nenhuma doação em espécie, tampouco doações estimáveis. Por fim, apontaram que não teria sido desenvolvido qualquer ato de campanha pelas candidatas impugnadas.
A juíza eleitoral, Viviane Freitas Figueira, afirmou que a violação ao sistema de cotas configura abuso de poder, pois vulnera a isonomia da eleição e a vontade do eleitor, especialmente se for considerado que outros partidos e coligações que participam do pleito obrigam-se a cumprir a cota legal imposta.
No caso concreto, o partido teria cumprido o sistema de cotas de gênero, com a observação do que é exigido, o que lhe permitiu concorrer às eleições lançando seus candidatos escolhidos na convenção. Porém, para a magistrada, as provas apresentadas pela promotoria Eleitoral foram consistentes no sentido de demonstrar que o partido apresentou candidaturas fictícias para atender à exigência legal, por meio das candidaturas de Mariana e Adelina.
De acordo com a julgadora, ponto essencial para comprovação da fraude eleitoral é o fato de que as candidatas Mariana e Adelina são parentes de outro candidato a vereador, Edson Ribeiro Barbosa. "Com efeito, não é crível que parentes tão próximos (marido e mulher no caso de Mariana, e cunhados no caso de Adelina) tenham decidido se candidatar juntos ao mesmo cargo político e no mesmo pleito eleitoral, em uma cidade pequena", ressaltou.
Em seguida, a juíza destacou que o Tribunal Superior Eleitoral fixou entendimento segundo o qual, caracterizada a fraude eleitoral, há de se reconhecer a imediata cassação dos diplomas dos candidatos (eleitos e suplentes) que concorreram nas eleições, não sendo necessária a prova de sua participação ou anuência, aspecto subjetivo que se revela imprescindível apenas para impor a sanção de inelegibilidade.
Concluiu que o abuso de poder aproveita à totalidade do partido/coligação, beneficiando todos os candidatos, eleitos ou não, uma vez que, se constatada previamente a fraude no preenchimento das cotas, o Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (Drap) nem sequer seria deferido.
Porém, a mesma conclusão não se aplica ao pedido de inelegibilidade, pois essa sanção tem caráter pessoal. É lógico e razoável aceitar que a sanção de inelegibilidade só possa atingir quem tiver reconhecida sua responsabilidade direta nos fatos considerados, disse a magistrada.
Assim, foi decretada a inelegibilidade por oito anos, cassação de mandato e pagamento de multa a Edson Ribeiro Barbosa, Mariana Aparecida de Paula e Adelina Freitas Lourenço. Os registros dos demais integrantes da chapa foram cassados. Todos os votos do PTB foram anulados e os dirigentes dos partidos também ficarão inelegíveis por oito anos.
De acordo com o advogado que atuou no caso, Renato Ribeiro de Almeida, a cota de gênero estabelece um percentual mínimo de 30% para candidaturas femininas. Porém, não basta o mero registro das candidatas na proporção estabelecida.
"A jurisprudência do TSE afirma que são necessárias condições reais de disputa na campanha das candidatas. Do contrário, trata-se de candidaturas fictícias, também conhecidas por 'laranjas'. A prática é considerada fraude e sancionada com a cassação do diploma dos candidatos eleitos e a cassação do registro de todos os candidatos", lembrou Ribeiro.
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0600707-50.2020.6.26.0109
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