Retrospectiva 2021

A aviação civil em retrospectiva e perspectivas para o setor em 2022

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10 de dezembro de 2021, 10h01

Assim como os demais setores econômicos que precisaram se adequar ao novo contexto trazido pelos impactos da pandemia da Covid-19, o mercado de aviação também foi afetado pela crise. Entretanto, índices recentes sinalizam a recuperação gradual das atividades aéreas ao redor do mundo, retomando as perspectivas positivas para o desenvolvimento da aviação civil no próximo ano.

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Dados do transporte aéreo divulgados pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) revelam maior aproximação entre os níveis de oferta de assentos e demanda por voos em outubro deste ano com os índices do mesmo mês em 2019 [1]. Os avanços normativos, por sua vez, trouxeram maior segurança jurídica à indústria e aos investidores.

Apesar dos impactos da pandemia no setor, a aviação tem correspondido às necessidades de renovação impostas pelo atual cenário, tendo como efeitos a modernização e flexibilização de normas e procedimentos, bem como a regulamentação de temas relevantes ao mercado que aguardavam a deliberação das autoridades competentes.

Inovações normativas
Um dos avanços conquistados neste ano foi a edição da Resolução n° 606, que acrescenta a Subparte K ao Regulamento Brasileiro de Aviação Civil (RBAC) n° 91 e dispõe sobre a propriedade compartilhada de aeronaves privadas. Inspirado nas normas do Federal Aviation Administration (FAA), a subparte adota um modelo de negócios mais acessível, permitindo a aquisição de cotas de aeronaves e a participação em um programa de compartilhamento.

O programa de propriedade compartilhada deve contar com serviços de administração por um único administrador, a existência de duas ou mais aeronaves aeronavegáveis com um ou mais cotistas para cada, além de outros requisitos aplicáveis. Nesse modelo, cada cotista deverá possuir direito de propriedade ou uso sobre, ao menos, uma cota mínima de uma ou mais aeronaves do programa.

Além disso, buscando reduzir os impactos da Covid-19 no setor aéreo, a Medida Provisória n° 1.024/2020 foi sancionada com vetos pelo presidente da República e convertida na Lei n° 14.174/2021, prorrogando por mais um ano as medidas emergenciais de apoio à aviação civil brasileira, tais como a extensão do prazo para reembolso do valor de bilhetes aéreos ao passageiro em voos cancelados.

O veto presidencial a dispositivo da Lei nº 14.174/2021, que possibilitava a antecipação do pagamento de contribuições fixas nos contratos de concessão aeroportuária, foi derrubado pelo Congresso Nacional. Ainda que o detalhamento da medida esteja sujeito à definição pelo Ministério da Infraestrutura, a norma prevê que antecipações de pelo menos metade das contribuições fixas remanescentes terão o valor atualizado pela taxa vigente do fluxo de caixa marginal adotada pela Anac, acrescida de 5%.

O Programa Voo Simples, criado pela Anac em parceria com o governo federal, é mais uma inovação no âmbito regulatório. Instituída em outubro de 2020 com repercussões previstas para 2021 e 2022, a iniciativa visa à modernização e desburocratização da aviação civil brasileira, a fim de torná-la cada vez mais competitiva e eficiente.

Alinhado às premissas do programa, a agência estabeleceu um novo modelo regulatório para a aviação agrícola [2], que busca simplificar os procedimentos relacionados a esse serviço, além de fornecer acesso mais claro e direto a informações necessárias para os operadores.

Adquirindo cada vez mais espaço no setor, avanços tecnológicos como o advento dos drones também foram objeto de desburocratização. A Consulta Pública n° 09/2021, iniciada pela Anac para receber contribuições da sociedade sobre proposta para simplificar a operação de aeronave remotamente pilotada (RPA), propõe edição de emenda ao RBAC Especial nº 94, que trata do cadastro e da operação de drones.

Infraestrutura aeroportuária
A condução bem-sucedida da sexta rodada de concessões aeroportuárias foi um importante destaque no ano de 2021. No total, 22 aeroportos foram leiloados pela Anac, o que resultou em arrecadação de cerca de R$ 3,3 bilhões ao governo federal em outorgas e estimativa de R$ 6 bilhões em investimentos pelos concessionários no período da concessão [3]. Divididos em três blocos regionais, os aeroportos, que estarão sob a iniciativa privada pelos próximos 30 anos, englobam conjuntamente aproximadamente 11% do total de tráfego de passageiros do país [4].

Além disso, a rodada trouxe novidades nas minutas de edital e contrato. Mudanças regulatórias, como a retirada de prova de viabilidade econômica realizada por instituição financeira e a dispensa de se ter um operador aeroportuário como proponente ou consorciado, podendo, em seu lugar, firmar uma declaração de compromisso de contratação de empresa com experiência na operação do ativo, marcam o início de uma nova forma de realizar concessões.

Tributação
Outro destaque que proporcionou maior segurança jurídica ao setor foi a prorrogação, até 31 de dezembro deste ano, das disposições do Convênio ICMS n° 75/1991, que delibera sobre a redução da base de cálculo do ICMS para aeronaves e peças aeronáuticas. No mês passado, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) concedeu uma nova prorrogação, que viabilizou a manutenção do benefício fiscal até 30 de abril de 2024, por meio do Convênio ICMS n° 178/2021. O benefício fomenta diversas operações no Brasil, de modo que seu eventual término, somado às altas do dólar americano, traria impactos negativos aos custos para importação de aeronaves ao país.

A adesão do estado do Rio de Janeiro à regulamentação do regime tributário especial que reduz a alíquota de ICMS sobre o querosene da aviação (QAV) também reforça as iniciativas para permitir a redução da carga tributária incidente sobre o setor.

Por meio do Decreto Estadual n° 47.750, de 2 de setembro, o estado estabeleceu procedimentos e requisitos convenientes à adesão ao regime especial para saída interna de QAV, instituído pela Lei Estadual nº 9.281/2021, beneficiando o consumo do combustível por empresas de transporte aéreo de carga ou de pessoas, táxis aéreos e voos turísticos em helicópteros que abasteçam em aeroportos do estado.

Perspectivas para o futuro
Por mais que a pandemia tenha gerado os mais complexos desafios à aviação em toda a sua história, é em meio a crises que surgem novas oportunidades. Diversos passos importantes foram dados ao longo de 2021 para adaptação e inovação, rumo à recuperação da aviação civil brasileira.

A 7ª Rodada de Concessões está sendo estruturada pelo governo federal e, prevista para o março ou abril de 2022, irá promover o leilão de 16 aeroportos, novamente divididos em três blocos, liderados pelos aeroportos de Congonhas (Bloco SP-MS-PA), Santos Dumont (Bloco RJ-MG) e Belém (Bloco Norte II). Os planos de relicitação do Aeroporto Internacional de Natal e do Aeroporto Internacional de Viracopos também despertam a atenção dos investidores.

Estima-se que a nova rodada alcance um total de R$ 8,8 bilhões em investimento ao longo dos 30 anos [5]. A fase de consulta pública para receber contribuições aos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental (EVTEA) e às minutas de edital, contrato e anexos das concessões, foi encerrada e está atualmente sob análise.

A coordenação de slots em aeroportos promete repercussões favoráveis para o próximo ano. Em conformidade com a agenda regulatória do biênio, a Anac instaurou a Consulta Pública n° 19/2021 para colher opiniões da sociedade sobre minutas para as novas diretrizes sobre a matéria.

O objetivo da consulta pública é incentivar a concorrência entre infraestruturas aeroportuárias saturadas e flexibilizar alguns requisitos regulatórios, alinhando as normas brasileiras sobre o tema às melhores práticas internacionais e permitindo, por exemplo, a cessão de slots entre empresas aéreas. A conversão da minuta submetida à consulta pública em resolução demonstrará a tendência à adesão de inovações normativas nos próximos anos, o que traz expectativas positivas à aviação civil no Brasil.

Outro fator relevante é a tendência mundial de adesão às práticas de ESG (environmental, social and governance), que compactua com a implementação de iniciativas de redução da emissão de carbono na aviação e o desenvolvimento de alternativas sustentáveis, como os biocombustíveis. Estima-se que do total de emissões de gás carbônico geradas pela sociedade, cerca de 2% são oriundas da aviação.

Alinhado a esse objetivo, planos de crescimento sustentável a nível global estão sendo colocados em prática. O Fly Net Zero 2050, uma iniciativa apoiada pela Associação Brasileira de Aviação Civil (Abag) junto à International Air Transport Association (Iata), é um compromisso firmado entre as associações, agências regulatórias e empresas aéreas para zerar suas emissões líquidas de carbono até 2050, ano cuja projeção de passageiros transportados por ano mundialmente pode chegar a dez bilhões.

O Corsia, Regime de Compensação e Redução das Emissões de Carbono para a Aviação Internacional (Carbon Offsetting and Reduction Scheme for International Aviation), instituído pela Organização da Aviação Civil Internacional (Oaci), buscar fixar o compromisso de compensação das emissões de dióxido de carbono pela aviação internacional, sendo um importante exemplo de regulamentação em prol da redução de gases de efeito estufa.

Apesar de possuir ideais internos alinhados aos objetivos do regime, como a abertura da Consulta Pública n° 11/2021, que propõe emenda à regulamentação para realizar a atualização da certificação para emissões de carbono, o Brasil ainda não aderiu formalmente ao programa. Caso implementada, a adesão impactaria positivamente o setor no que tange às preocupações ambientas de redução das emissões do país, além de oferecer um período de aprendizagem e adequação da legislação e das companhias aéreas brasileiras durante as fases piloto e voluntária. Assim, seria possível criar estimativas favoráveis aos custos das emissões da aviação, bem como evidenciar o potencial de crescimento do país nos negócios.

Observa-se a necessidade de exploração e desenvolvimento dos biocombustíveis e de critérios de certificação e sustentabilidade no âmbito legislativo e governamental brasileiro, que visem à redução e à compensação das emissões de carbono no país.

Por fim, o desenvolvimento de projetos dos chamados eVTOLs — aeronaves elétricas e potencialmente autônomas, de pouso e decolagem vertical — nos aproxima cada vez mais da visão futurística e sustentável que se vislumbra para os próximos anos. Impulsionado pelos avanços tecnológicos do setor e guiado pelo aperfeiçoamento da mobilidade urbana, bem como o olhar mais ampliado aos cuidados com o meio ambiente, fica demonstrado o compromisso da indústria em desenvolver a aviação civil mundial para patamares inéditos.

 

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