Busca pela eficiência

Mais dois ministros votam para negar ações contra Novo Marco do Saneamento

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1 de dezembro de 2021, 18h28

Com o entendimento de que questões de saneamento básico são de interesse não só de municípios, mas de estados e União, e de que o Novo Marco Legal do Saneamento Básico (Lei 14.026/2020) buscou aumentar a eficiência de um serviço que não vinha funcionando bem, os ministros Nunes Marques e Alexandre de Moraes seguiram, nesta quarta-feira (1º/12), o relator, ministro Luiz Fux, e votaram para negar quatro ações diretas de inconstitucionalidade que questionam dispositivos da norma. O julgamento será retomado na sessão desta quinta (2/12), com o voto do ministro Edson Fachin.

Rosinei Coutinho/SCO/STF
Alexandre de Moraes disse que União e estados podem legislar sobre saneamento
Rosinei Coutinho/SCO/STF

Nunes Marques entendeu que a atribuição de poderes normativos à Agência Nacional de Águas (ANA) com relação a temas de saneamento básico é uma opção legislativa coerente com a Constituição Federal.

O ministro também apontou que a legislação brasileira atribui valor econômico à água desde 1997. E a possibilidade ampliada de que os serviços de saneamento sejam prestados pela iniciativa privada foi uma opção adotada pelo Congresso buscando aumentar a eficiência deles.

Nessa linha, Alexandre de Moraes destacou que o modelo de saneamento básico do Brasil era falho, pois não conseguiu trazer coleta de esgoto para 60% dos brasileiros. Assim, disse, é preciso respeitar as escolhas tomadas pelo legislador para mudar esse cenário. Por exemplo, os contratos anteriores ao novo marco legal só podem continuar em vigor se foram adequados ao conteúdo da norma, avaliou.

Alexandre também afirmou que saneamento básico tem conexão direta com saúde pública e proteção do meio ambiente — assuntos de competência da União e dos estados. Portanto, não há como impedir tais entes federativos de regulamentar a matéria, fazendo com que "cada município tenha o seu marco legal do saneamento básico", declarou o ministro, ressaltando que tais serviços, muitas vezes, abrangem regiões que transcendem as cidades.

Voto do relator
Em voto apresentado na quinta passada (25/11), o relator do caso, ministro Luiz Fux, apontou que o novo marco legal visa aumentar a eficiência na prestação dos serviços de saneamento básico. Para isso, optou pelo modelo de concessão, com o objetivo de fomentar a concorrência para os mercados. Isso permite que o poder público avalie as propostas e escolha a que melhor atender os interesses sociais, segundo o magistrado.

A lei também estabelece medidas para universalizar o saneamento básico até 2033. Por falta de capacidade institucional, ressaltou o ministro, não cabe ao Judiciário avaliar se as metas são precisas ou imprecisas, convenientes ou inconvenientes.

O Novo Marco Legal do Saneamento Básico manteve a autonomia municipal e a sua harmonização com arranjos federativos de contratação. Porém, consolidou instrumentos de cooperação interfederativa. Ou seja: a organização das atividades continua sob a titularidade dos municípios, ao passo que o planejamento é o resultado da deliberação democrática em dois níveis, federal e o estadual ou regional.

Tal arranjo está de acordo com a Constituição, disse Fux, apontando que um saneamento básico de qualidade promove diversos direitos fundamentais, como saúde, proteção do meio ambiente e estímulo à economia e ao trabalho, algo de interesse de estados e União.

Além disso, a organização, por estados, de unidades regionais voltadas à concessão dos serviços públicos de saneamento tende a defender os interesses de todo o território sob sua jurisdição e tende a incluir municípios mais distantes das capitais ou de outras metrópoles, beneficiando a população da área, opinou.

O Novo Marco Legal do Saneamento Básico atribui poderes normativos à Agência Nacional de Águas (ANA) quanto ao tema. A ANA deverá fixar quais são os requisitos de conformidade regulatória esperados dos municípios e dos estados para que possam receber transferências da União. Para Fux, o mecanismo é constitucional.

"O condicionamento da destinação de recursos federais via transferências voluntárias já pode ocorrer para atendimento de certas metas, objetivos, obrigações pelos entes recebedores, inclusive por pactuação contratual. Desse modo, o condicionamento sequer demanda lei disciplinadora das condições para a percepção das dotações. Nada obstante, em apreço à segurança jurídica, não há vedação a que haja disciplina em lei formal", analisou o ministro.

Contrato de programa
Até a promulgação da Lei 14.026/2020, a execução dos serviços públicos de saneamento básico esteva majoritariamente vinculada ao contrato de programa. Nesse modelo, os municípios contratavam diretamente as empresas públicas e as sociedades de economia mista dos estados.

A nova lei manterá em vigor os contratos de programa. Mas os novos contratos de saneamento serão de concessão.

De acordo com Luiz Fux, a alteração busca aumentar a eficiência dos serviços e representa uma afetação proporcional à autonomia negocial dos municípios em prol da concretização de objetivos setoriais legítimos.

O relator ainda avaliou que a Lei 14.026/2020 possui regras que harmonizam o futuro desuso do contrato de programa com a proteção das expectativas dos contratantes e com a continuidade dos serviços, sem violar a segurança jurídica.

Argumentos dos autores
Autor da ADI 6.492, o PDT argumenta que a norma pode criar um monopólio do setor privado nos serviços de fornecimento de água e esgotamento sanitário, em prejuízo da universalização do acesso e da modicidade de tarifas.

O partido também contesta a exigência de que as empresas de saneamento firmem contrato de concessão com municípios. Conforme a legenda, isso gerará o desmonte de companhias estatais e de estruturas já consolidadas.

Na ADI 6.536, PCdoB, PSol, PSB e PT sustentam que o serviço público de saneamento é privativo do poder público e que suas atribuições são inerentes ao interesse local que se incluem na competência originária do município, ainda que a natureza do saneamento demande a participação de outros municípios e do Estado no planejamento, execução e gestão do serviço integrado.

Os partidos também apontam que o novo marco legal representa risco de dano iminente ao dever da administração pública de ofertar a todos o acesso a bens essenciais em função do princípio da universalidade dos serviços públicos, cuja máxima determina que sua prestação não deve distinguir seus destinatários.

Já na ADI 6.882, a Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (Aesbe) argumenta que a lei finda a gestão compartilhada do serviço de saneamento básico por consórcio público ou convênio de cooperação, impondo a concessão como único modelo de se delegar o serviço. Segundo a entidade, a imposição afronta as competências asseguradas aos municípios pelo artigo 30 da Constituição Federal.

O dispositivo prevê a competência municipal tanto para legislar sobre assuntos de interesse local quanto para organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local.

Por fim, na ADI 6.583, a Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento (Assemae) aponta que o novo marco legal representa a completa imposição da União sobre a autonomia dos municípios, além de transformar o saneamento básico em um balcão de negócios, excluindo a população pobre e marginalizada.

A Assemae diz que um dos principais problemas da Lei 14.026/2020 é a imposição de uma única forma para delegar o serviço de saneamento: por meio de concessão, o que viola o artigo 241 da Constituição.

ADIs 6.492, 6.536, 6.583 e 6.882

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