Ministro do STJ tranca ação penal devido a invasão ilegal de domicílio
9 de agosto de 2021, 10h29
Por constatar o ingresso ilícito na moradia do paciente, sem elementos objetivos e racionais que o justificassem, o ministro Rogerio Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça, trancou uma ação penal e mandou soltar um homem preso por tráfico de drogas.

José Alberto
Os policiais civis teriam recebido notícias de que haveria venda de drogas na casa do homem. Os agentes também afirmaram que a prima do acusado, residente na mesma casa, teria autorizado sua entrada. Eles encontraram 196 gramas de maconha, um revólver sem numeração e munições.
O homem foi preso em flagrante pela suposta prática de tráfico de drogas, associação para o tráfico e posse ilegal de arma de fogo de uso restrito. Em primeira instância, a prisão foi convertida em preventiva, decisão que foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.
A defesa, feita pelos advogados Raul dos Santos Pinto Madeira e Erica Santamaria dos Santos Madeira, pediu a revogação da custódia. Eles argumentaram que o decreto prisional não teria fundamentação idônea e concreta, e ressaltaram a invasão da residência teria ocorrido sem mandado de busca ou mesmo consentimento dos moradores, já que não haveria prova neste sentido.
No STJ, o ministro relator lembrou de uma tese de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual o ingresso forçado em domicílio, sem mandado judicial, só é legítimo quando amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias da situação, que apontem a ocorrência do flagrante delito no interior da casa.
No caso concreto, o magistrado observou que a diligência policial teve origem em uma notícia anônima e que não houve comprovação do consentimento para ingresso na residência. Isso porque a prima do paciente não foi ouvida posteriormente, para confirmar a versão dos agentes.
Schietti Cruz destacou que o STJ já decidiu que policiais devem registrar a autorização do morador em vídeo e áudio caso precisem entrar em uma residência para investigar ocorrência de crime. Segundo o entendimento da corte, a permissão também deve ser registrada, sempre que possível, por escrito.
Assim, caberia aos agentes demonstrar o consentimento da moradora. Mas segundo ele, não houve "preocupação em documentar esse consentimento, quer por escrito, quer por testemunhas, quer, ainda e especialmente, por registro de áudio-vídeo".
Apesar da presunção de veracidade das declarações dos servidores públicos, o relator apontou que "o senso comum e as regras de experiência merecem ser consideradas quando tudo indica não ser crível a versão oficial apresentada, máxime quando interfere em direitos fundamentais do indivíduo e quando se nota um indisfarçável desejo de se criar uma narrativa amparadora de uma versão que confira plena legalidade à ação estatal".
Para o ministro, as investigações e punições de crimes mais graves devem ser vinculadas aos limites das leis e da Constituição. "A coletividade, sobretudo a integrada por segmentos das camadas sociais mais precárias economicamente, também precisa, a seu turno, sentir-se segura e ver preservados seus mínimos direitos, em especial o de não ter a residência invadida, a qualquer hora do dia ou da noite, por agentes estatais, sob a única justificativa, extraída de apreciações pessoais destes últimos, de que o local supostamente é ponto de tráfico de drogas ou de que o suspeito do tráfico ali possui droga armazenada", acrescentou.
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HC 668.957
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