Opinião

A morosidade do regime de liquidação extrajudicial: o que deu errado?

Autor

  • Pablo Costa

    é advogado do escritório Rueda & Rueda Advogados especialista em Contencioso Cível especialmente nas áreas de Direito Securitário e do Consumidor.

7 de agosto de 2021, 17h14

A liquidação extrajudicial foi instituída no Brasil como uma intervenção estatal sob empresas que atuam em mercado supervisionado. Além de garantir o reestabelecimento financeiro dessas companhias e, consequentemente, honrar os compromissos com credores, o instituto tem por objetivo aplicar celeridade a esses processos. Infelizmente, essa realidade não se observa nos casos concretos.

Sob a égide da Lei 6.024, de 13 de março de 1974, a qual dispõe sobre a intervenção e a liquidação extrajudicial de instituições financeiras, o instituto de liquidação extrajudicial nasceu no Brasil sob impulso do direito italiano e seu instituto da "liquidazione coacta amministrativa".

A importância do instituto não se discute. É necessário para que se mantenha a segurança e credibilidade de empresas em mercados supervisionados  como sistema financeiro, das operadoras de saúde e de seguradoras e entidades de previdência complementar.

Passadas mais de quatro décadas da liquidação extrajudicial, contudo, ela é alvo das mais variadas críticas, sob a justificativa de não atingir sua finalidade de celeridade. Essa expectativa fora atribuída pelo fato de o procedimento ser executado fora do âmbito judicial e por órgão técnico, no caso das seguradoras, por exemplo, a Superintendência de Seguros Privados (Susep), autarquia da Administração Pública pederal. O Banco Central do Brasil e a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) são outros órgãos supervisores responsáveis pelos procedimentos no país em suas respectivas áreas de atuação.

Porém, o que se percebeu ao longo dos anos foi o aumento da morosidade em vários casos, tendo algumas intervenções se arrastado por várias décadas sem resolução.

Essa realidade não encontra sequer justificativas plausíveis, uma vez que o procedimento especial foi instituído justamente para que houvesse maior celeridade e se garantisse proteção a credores de mercados que possuem risco sistêmico, ou seja, a ineficiência do procedimento pode levar à desconfiança em determinado segmento, podendo desencadear instabilidades ou mesmo um colapso de todo um setor ou economia.  

Já as soluções passam por dois pontos essenciais. Primeiramente, é preciso que se estabeleçam critérios mais técnicos por parte dos órgãos competentes (como a Susep, o BC e a ANS) na escolha dos liquidantes extrajudiciais que vão gerenciar a liquidação dos créditos. São eles os responsáveis por organizar de forma estratégica os ativos já existentes, além de realizar o provisionamento dos valores para cada novo processo para fins de publicação do balancete contábil e atualização do contingenciamento a cada condenação, para, após o recebimento dos pedidos de habilitações de crédito, inserir os credores no quadro geral de credores (QGC), liberando a administradora para autorizar o pagamento.

Outro ponto, de igual importância, é que falta cooperação por parte das liquidadas. Normalmente uma empresa que entra em liquidação extrajudicial possui um acervo processual numeroso, sendo necessária uma colaboração eficiente entre os antigos gestores e o liquidante nomeado para realização da liquidação.

Um exemplo positivo de como o instituto poderia ser aplicado de forma mais eficiente é a recente colaboração entre a equipe liquidante nomeada pela Susep e a Nobre Seguradora, que, em menos de quatro anos em liquidação, realizaram o levantamento de seus credores e iniciaram o pagamento deles, tudo isso em meio à pandemia, que traz consigo as mais variadas dificuldades. O estágio em que se encontra essa liquidação extrajudicial é acima da média se comparada a outras do mesmo porte, tendo dado início dos pagamentos dos créditos trabalhistas (e equiparados), tributários e com privilégio especial previamente habilitados em seu quadro geral de credores.

Para atingir esses resultados, o trabalho de cooperação entre a empresa e o órgão liquidante, bem como a competência da equipe de liquidação nomeada pela Susep, foram vitais. Isso nos faz refletir se a ineficiência realmente está no regime de liquidação extrajudicial ou se seria possível o aperfeiçoamento do instrumento com a devida atenção dos órgãos aos critérios de escolha dos administradores e a justa cobrança para que as liquidadas cumpram a sua parte.

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  • é advogado do escritório Rueda & Rueda Advogados, especialista em Contencioso Cível, especialmente nas áreas de Direito Securitário e do Consumidor.

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