Opinião

O papel dos agentes de tratamento e do encarregado de dados no cenário da LGPD?

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4 de agosto de 2021, 20h36

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), criada por força da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), possui diversas competências e, entre as principais, destacam-se a incumbência de fiscalizar e aplicar sanções em caso de descumprimento à legislação, elaborar diretrizes para a Política Nacional de Proteção de Dados Pessoais, promover o conhecimento das sobre proteção de dados pessoais, além de elaborar estudos sobre práticas nacionais e internacionais de proteção de dados pessoais e regulamentar a LGPD.

Nesse contexto, em cumprimento de suas obrigações, a ANPD publicou em 28 de maio deste ano o "Guia Orientativo para Definições dos Agentes de Tratamento de Dados Pessoais e do Encarregado". O primeiro documento do gênero elaborado versa sobre dois dos temas mais relevantes no contexto de proteção de dados pessoais e que têm suscitado dúvidas de ordem prática: 1) os agentes de tratamento (controladores e operadores); e 2) o encarregado de dados pessoais. Desse modo, o guia orientativo visa a esclarecer definições e conceitos do controlador, operador e do encarregado, também conhecido internacionalmente como data protection officer (DPO), bem como explica os respectivos regimes de responsabilidade de cada uma dessas figuras, trazendo casos concretos que exemplificam as orientações da ANPD.

Em suma, segundo o guia, o agente de tratamento deve ser definido para cada operação de tratamento de dados pessoais, isto é, em um cenário uma organização poderá ser controladora e em outro poderá ser operadora, a depender de sua atuação em cada operação analisada. Ademais, esclarece-se que os controladores atuam de acordo com os seus interesses, com poder de decisão sobre as finalidades e os elementos essenciais de tratamento, ao passo que os operadores atuam de acordo com os interesses e instruções do controlador, sendo-lhes facultada apenas a definição de elementos não essenciais à finalidade do tratamento, como medidas técnicas.

Pode-se citar como exemplo prático o pagamento de vale-refeição pelo empregador a seus funcionários por intermédio de um cartão. Nesse caso, o titular de dados é o empregado, o controlador é o empregador e o operador é a empresa especializada contratada para instrumentalizar a operação. Nesse cenário, a empresa contratante define a finalidade (pagamento de benefício de vale-refeição) e a empresa contratada deverá tratar os dados pessoais tão somente para tal finalidade, não podendo, por exemplo, ofertar outros benefícios, sendo, todavia, facultada à empresa contratada a definição dos locais em que o vale-refeição será aceito, a senha do cartão e suas condições de uso.

Vale ressaltar, visto que é uma questão comumente mal interpretada, que o operador deve ser uma entidade distinta do controlador e em hipótese alguma será um profissional subordinado a este. Isto é, o funcionário de uma empresa está revestido do mesmo papel que aquela empresa exerce dentro de um cenário de tratamento de dados pessoais, pois atuam em representação do agente, o que não se confunde com o conceito de operador (entidade distinta que atua em favor do controlador).

Sobre o encarregado, como boa prática, é de suma importância que esse profissional, seja ele um funcionário ou um agente externo à empresa, tenha total liberdade na realização de suas atribuições. No tocante a suas qualificações profissionais, estas devem ser definidas mediante juízo de valor realizado pelo controlador, considerando seus conhecimentos de proteção de dados e segurança da informação em nível que atendam às necessidades da operação da organização, sendo que não há — ao menos neste momento — nenhum dispositivo legal ou regulamentação que determine qual deve ser a formação ou a qualificação do encarregado.

Por fim, vale destacar que a versão do guia publicada em maio está sujeita a comentários e contribuições pela sociedade civil, podendo ser atualizado à medida em que novas regulamentações e entendimentos forem estabelecidos pela ANPD. Desse modo, considerando que compreender o conceito e os aspectos relacionados ao papel de cada um dos agentes de tratamento e do encarregado é fundamental para a correta aplicação da LGPD, o guia publicado pela ANPD, apesar de suas diretrizes não serem vinculantes, é um passo significativo no cenário de proteção de dados pessoais brasileiro.

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