Opinião

A importância da perícia psicológica na área jurídica

Autor

  • Renata Bento

    é psicanalista psicóloga membro associado da Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro membro da International Psychoanalytical Association - UK e da Federación Psicoanalítica de América Latina - Fepal especialista em Psicologia Clínica com criança pela PUC-RJ perita ad hoc do TJ/RJ e assistente técnica em processo judicial.

29 de abril de 2021, 6h03

As crianças e os adolescentes que convivem rotineiramente com as discussões entre os pais têm mais chances de desenvolver problemas emocionais, adoecem psiquicamente e seu processo de amadurecimento fica prejudicado. Isso ocorre porque o psiquismo da criança amadurece com a ajuda de seus cuidadores primordiais e de um ambiente que seja minimamente estável.

Quando as brigas entre os pais são frequentes, as crianças ficam perdidas e em estado de alerta e é comum que comecem a apresentar disfunções indicando que algo não vai bem; essas disfunções se apresentam em forma de sintomas — sono prejudicado, alimentação excessiva ou diminuída, dificuldade na escola, problemas de socialização, ansiedade constante, hiperatividade, desatenção, medo, depressão, necessidade dos pais, adultização precoce e erotização precoce, entre outros. Ocorre que dotadas de sensibilidade, inteligência, da percepção do clima emocional familiar e, principalmente, de seu inconsciente, essas crianças captam a animosidade como pequenas esponjas. Isso quer dizer que as sensações, os sentimentos, as ideias ficam arquivadas no mundo mental da criança e certamente em algum momento da vida poderão eclodir. E que, se não forem tratadas, seguirão com prejuízos para a vida adulta.

Um processo de separação judicial exala muitas angustias individuais e, quando é necessário um litígio, fica ainda mais complexo. Todos os envolvidos estão mobilizados e as crianças percebem tudo, apenas não conseguem ter clareza para nomear o que notam ou sentem. Cabe assinalar que as animosidades veladas tanto quanto as discussões abertas são amplamente sentidas pelas crianças, mesmo que elas não tenham visto ou nada tenha sido dito a elas, existe o inconsciente.

Escutar essas famílias requer sensibilidade e habilidade no entendimento dos conflitos humanos, pois não se busca culpado, e, sim, o sentido de responsabilização de cada um dos envolvidos pela situação ter chegado ao momento atual e como poderão administrar a nova escolha, levando e consideração que há filhos envolvidos no processo e que devem ser preservados emocionalmente.

É muito comum observar que alguns adultos ignoram a vida mental de uma criança, ou seja, acreditam verdadeiramente que ela não percebe o que ocorre em seu entorno familiar; a criança tudo vê e sente, apenas não pode compreender, o que a deixa insegura e aflita.

A experiência em perícia psicológica revela muitas vezes a decadência da parentalidade positiva baseada na confiança e segurança para a criança, ainda que seja essa a única forma de relação que esse ex-casal, agora somente pais, deveria ter. Encaminhar a criança para atendimento psicológico é dar a ela uma chance de ser escutada como sujeito em seu conflito íntimo separado do conflito dos pais. É dar a ela a possibilidade de pensar, de questionar, de entrar em contato com seu mundo emocional e a partir disso se fortalecer psiquicamente para que o conflito parental não a fragilize ou a incapacite.

É pensando por esse viés que a escuta clínica de um psicanalista ou psicólogo que tenha também compreensão da psicologia jurídica poderá ser de grande alívio emocional para o desenvolvimento psíquico dessas crianças, favorecendo a saúde mental e dando uma nova chance para o crescimento mais saudável e com novas alternativas.

Uma perícia psicológica não vai tratar os sujeitos envolvidos, mas pode orientar tanto ao magistrado quanto à sentença quanto aos envolvidos para busca de ajuda para o entendimento dos sentimentos envolvidos, o que pode ser evitado, o que pode ser mudado e o que pode ser melhorado. Após a separação e a sentença judicial, essas famílias precisarão continuar seguindo, e desconheço outro caminho que não seja o de pensar sobre os conflitos singulares e da própria família. Pessoas que ao se separarem, quando sentem necessidade, buscam acompanhamento psicológico, apresentam mais chances de florescer em suas novas escolhas.

Autores

  • Brave

    é psicanalista, psicóloga, membro associado da Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro, membro da International Psychoanalytical Association - UK e da Federación Psicoanalítica de América Latina - Fepal, especialista em Psicologia Clínica com criança pela PUC-RJ, perita ad hoc do TJ/Rj - RJ, assistente técnica em processo judicial e especialista em familia, adulto, adolescente.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!