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Marcolin: Licitação por diálogo competitivo, uma mudança positiva

14 de abril de 2021, 10h56

Por Pedro Henrique Magalhães Marcolin

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No último dia 1º, o presidente Jair Bolsonaro sancionou, com vetos, o Projeto de Lei 4253/2020, que renova a Lei de Licitações. O texto é fruto de extensos debates nas casas legislativas e gera expectativas no mercado, que anseia por um ambiente licitatório mais moderno e eficiente.

O texto final remonta suas origens no PL 1292/95, ou seja, teve seu início apenas dois anos depois da edição da atual Lei de Licitações. Consequentemente, o documento sofreu diversas alterações e acabou por consolidar, em texto único, a legislação esparsa produzida ao longo dos 25 anos de tramitação.

Pela nova legislação, são extintas as modalidades de licitação por convite e por tomada de preços e, em contrapartida, é introduzido no Brasil o sistema de licitação por meio do chamado diálogo competitivo, ferramenta que, ao menos em teoria, representa a principal inovação no âmbito das contratações públicas.

O mecanismo de licitação por diálogo competitivo mencionado no PL 4253/2020 é, basicamente, uma reprodução da ferramenta introduzida na União Europeia no ano de 2004 e mantida expressamente pelo Parlamento Europeu em 2014 (Diretiva 2014/24/UE).

A modalidade inova no Direito nacional por buscar uma solução ao antigo problema de assimetria cognitiva enfrentado pelo poder público ao realizar contratos com entes privados.

Longe de ser uma exclusividade brasileira, o problema ocorre em praticamente todos os países, pois resulta da impossibilidade do poder público de deter o mesmo nível de expertise técnica dos entes privados para a elaboração das soluções para as suas necessidades.

E isso decorre da própria organização da Administração Pública, que não foi desenhada para operar em regime de competição, a qual exige dos entes privados a constante inovação e modernização. Não há como se exigir do poder público que possua, em seus quadros, profissionais aptos à identificação e ao desenvolvimento de toda e qualquer solução para as suas infinitas demandas.

Por vezes, o setor público apenas tem ciência do problema que pretende resolver, porém não detém a expertise técnica para elaborar até mesmo um projeto básico do objeto que pretende licitar, pois não possui conhecimento de como atender essa demanda, em especial quando a solução cabível sequer está disponível no mercado.

Para esse tipo de situação é que se mostra pertinente a licitação por diálogo competitivo. Com base nas regras da nova modalidade, a Administração divulgará ao público as suas necessidades e exigências que precisam ser atendidas. Então, dialogará com os licitantes para o fim de desenvolver, em conjunto com a iniciativa privada, as alternativas aptas à solução das necessidades do poder público.

Com base no texto legal, a Administração poderá realizar rodadas sucessivas de diálogos com os licitantes, nas quais serão gradualmente restringidas as propostas apresentadas pelos entes privados. Ao final, o órgão público seleciona a solução com base em critérios técnicos e econômicos, e a divulga em novo edital para que então seja dado início à tradicional fase de competição, na qual todos os licitantes poderão realizar propostas.

Nos termos da nova lei, fica claro o reconhecimento do legislador das limitações do poder público para planejamento e desenvolvimento de soluções complexas, o que demonstra uma mudança positiva para as contratações públicas.

É de se destacar que os vetos presidenciais colaboraram ainda mais para desburocratizar e simplificar o ambiente licitatório, o que pode incentivar a adoção da modalidade de diálogo competitivo.

O veto à determinação de publicação dos editais em jornais de grande circulação retirou do texto exigência desnecessária e antieconômica, uma vez que a lei já cria o Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), no qual será centralizada a publicidade dos atos convocatórios.

Especificamente acerca do diálogo competitivo, foi vetada a disposição que possibilitava ao órgão de controle externo monitorar e fazer um controle prévio acerca da legalidade, da legitimidade e da economicidade dos diálogos competitivos. Além de atribuir aos Tribunais de Contas competências não expressamente previstas na Constituição, o controle prévio dos órgãos de contas poderia burocratizar e engessar ainda mais a atuação do gestor, o que acabaria dificultando a adoção da nova modalidade.

O texto final da nova legislação, portanto, apesar de apresentar limitações, retira entraves burocráticos desnecessários do diploma e torna mais simples e seguro ao gestor público buscar no mercado, por meio do diálogo competitivo, a adaptação e a criação de ferramentas modernas para o atendimento às necessidades da Administração, sem exigir um inchaço ainda maior da máquina pública.