Opinião

A tutela jurisdicional executiva e a solução do conflito de inadimplência

Autor

  • Luis Claudio Ferreira Cantanhêde

    é procurador do estado de São Paulo doutor e mestre em Direito pela PUC-SP especialista em Direito Tributário pela PUC-SP e em Direito do Estado pela Espge-SP professor no curso de pós-graduação de Direito Tributário e de Extensão do Processo Tributário Analítico no Ibet professor de Direito Tributário na Espge-SP e pesquisador do grupo de estudos de Processo Tributário Analítico do Ibet.

13 de abril de 2021, 9h02

Qualquer análise que se pretenda processual no âmbito da ciência do Direito deve pautar-se por uma perspectiva instrumental, como evidenciado no texto de Paulo Cesar Conrado [1], que entabulou as publicações que antecedem à presente.

Falar em instrumento é apontar para algo que serve a uma finalidade que lhe é exterior, aspecto esse inerente ao processo — ferramenta para a solução de conflitos de interesses entre sujeitos de uma relação jurídica de direito material.

Dessa perspectiva de análise não pode escapar a execução fiscal, demanda cujo regime jurídico está especificamente voltado a solucionar um conflito muito peculiar surgido no desenrolar do ciclo de positivação da obrigação tributária: o que decorre da omissão do sujeito passivo em promover o pagamento do tributo já devidamente individualizado pela via do lançamento/autolançamento.

No fluxo de positivação da obrigação tributária [2] fica logo evidente que o Fisco detém prerrogativas decorrentes do exercício de atividade administrativa e que não estão ao alcance do particular, resumíveis, tais prerrogativas, às ideias de imperatividade e de coatividade.

Pela imperatividade, o Fisco tem o poder de impor àqueles indicados pela lei, independentemente de sua vontade, o dever de recolher tributo [3].

A coatividade, de outro lado, caracteriza-se pelo poder do Fisco de atuar em ordem a induzir o devedor tributário a cumprir o dever que lhe foi imposto imperativamente, lançando mão de instrumentos comumente chamados de "meios indiretos de cobrança", conceito que abarca, entre outros institutos jurídicos, a exigência de certidão de regularidade fiscal, o protesto e a inscrição do nome do devedor em cadastros públicos de inadimplência.

Caso a atuação fiscal coativa seja ineficaz, resta ao Fisco buscar a satisfação do seu direito subjetivo por meio da tutela jurisdicional executiva.

Por faltar à atuação administrativa no âmbito tributário o requisito da autoexecutoriedade, o Fisco, sabe-se, não pode invadir o patrimônio do devedor para promover a expropriação forçada, precisando valer-se do Estado-juiz para concretizar esse escopo.

É por meio da prestação da tutela jurisdicional executiva que o Poder Judiciário vai solucionar esse específico conflito, o da inadimplência do crédito tributário, dando ensejo, porque devidamente provocado em decorrência do exercício do direito de ação executiva, à relação processual correspondente, regulada pela Lei de Execuções Fiscais, a Lei Federal nº 6.830/80 [4].

Por se voltar à efetivação de um direito subjetivo e não ao seu acertamento, a tutela jurisdicional executiva é prestada mediante a prática de atos que visam a implementar, no plano material, o pagamento do crédito tributário com a expropriação forçada do patrimônio do devedor inadimplente.

Convém, entretanto, deixar claro que a prestação da tutela jurisdicional executiva impõe que o crédito esteja inscrito em dívida ativa, pressupondo a realização de um controle de sua legalidade em ordem a atestar sua certeza, liquidez e exigibilidade [5], o que é certificado com a emissão da certidão da dívida ativa, título executivo extrajudicial que deve instruir a petição inicial, compondo-a, de todo e qualquer processo executivo fiscal.

Porque ainda não há no ordenamento jurídico nacional a previsão da execução fiscal administrativa, constitui a expropriação forçada voltada ao adimplemento dos créditos tributários reserva do Judiciário. Consequentemente, o único conflito que impõe ao Estado-fisco lançar mão do exercício do direito de ação é aquele decorrente do inadimplemento do crédito tributário, caracterizando a noção de processualidade tributária exacional.

 

[1] Texto de Paulo Cesar Conrado: https://www.conjur.com.br/2021-mar-02/paulo-conrado-processo-tributario-instrumentalidade.

[2] Refere-se a fluxo de positivação da obrigação tributária como expressão do caminho percorrido pela dinâmica normativa tributária desde a instituição do tributo até a sua extinção.

[3] Diferentemente do que se dá nas relações entre sujeitos privados, em que a obrigação, ou decorre de ato ilícito, ou da manifestação de vontade, no campo tributário, o cidadão, mesmo sem cometer qualquer ilicitude e sem aquiescer com o dever, se vê na posição de devedor, sujeito a uma obrigação de pagar quantia certa que grava o seu patrimônio.

[4] Regem essa relação jurídica de cunho processual, supletivamente, as previsões constantes do Código de Processo Civil, tendo em vista a expressa previsão do art. 1º da Lei 6.830/80.

[5] Sobre a amplitude do controle de legalidade inerente ao procedimento de inscrição em dívida ativa, recomendo a leitura do texto de Esdras Bocatto, publicado na coluna Opinião da CONJUR, intitulado: Inscrição em dívida ativa e processo tributário. https://www.conjur.com.br/2021-abr-06/bocatto-inscricao-divida-ativa-processo-tributario

Autores

  • Brave

    é doutor e mestre em Direito pela PUC/SP, especialista em Direito Tributário pela PUC/SP e em Direito do Estado pela ESPGE-SP, professor de Direito Tributário e Processo Tributário no Ibet-SP e na ESPGE-SP, procurador do Estado de São Paulo e pesquisador do Grupo de Estudos em Processo Tributário Analítico do IBET-SP.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!