Opinião

A inconstitucionalidade da taxa de fiscalização de recursos hídricos

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12 de abril de 2021, 6h05

Uma importante decisão para o setor hídrico e energético proferida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso, relator na ADI 5374, foi publicada no mês de fevereiro e trará impactos para o setor. A ação direta de inconstitucionalidade versa sobre a constitucionalidade da Lei 8.901/2014 do Pará, que discute a cobrança da taxa de fiscalização de recursos hídricos. Apesar de o STF ter confirmado, por meio do plenário virtual, por unanimidade, a sua inconstitucionalidade, a discussão sobre a instituição desta taxa está longe de terminar.

Esse encargo está relacionado à fiscalização de recurso hídrico, que é um dos instrumentos da Política Nacional dos Recursos Hídricos, prevista na Lei Federal 9.433/1997, e tem por finalidade fazer a gestão hídrica e garantir a disponibilidade do recurso para os seus diversos fins, tais como consumo humano, abastecimento do setor industrial e agrícola, transporte e para o energético.

A pauta de gestão hídrica é urgente e a possibilidade de cobrança de taxa de fiscalização e pelo uso da água para qualquer uma das suas finalidades já tem amparo legal no país, que traz, inclusive, robusto ordenamento jurídico para disciplinar o uso do recurso hídrico para fins de geração de energia, "energia hidráulica".

Nesse sentido, a Lei Federal nº 7.990/1989 disciplina a compensação mensal financeira pelo resultado da exploração de diversas fontes para a geração de energia elétrica, incluindo a de recursos hídricos cuja previsão de compensação corresponde a quantia de 6% sobre o valor da energia produzida a ser paga pelos concessionários a serviço de energia elétrica aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios, em cujos territórios se localizarem instalações destinados à produção de energia elétrica, ou que tenham áreas invadidas por águas dos respectivos reservatórios.

O valor mensal de compensação é distribuído para os diversos entes, sendo que, pela legislação atual que disciplina o rateio, qual seja, a Lei federal 13.844/2019, é previsto que o valor recolhido deve ser distribuído 25% para os estados e 65% para os municípios onde estão instaladas as usinas hidroelétricas. Além disso, 3% são destinados ao Ministério de Minas e Energia, 4% ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e 3% ao Ministério de Desenvolvimento Regional para a Política Nacional de Recursos Hídricos e do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e à gestão da rede hidrometereológica nacional.

Apesar de a taxa de fiscalização de recurso hídrico também incidir sobre quem utiliza água para fins econômicos, difere da compensação por abordar a perspectiva ambiental, para prevenção de impactos ao meio ambiente e garantia de diversos usos para a sociedade.

O não reconhecimento da constitucionalidade dessa taxa deu-se em função de os valores de grandeza fixados pela lei como base de cálculo não estarem em conformidade com os princípios da proporcionalidade e da capacidade contributiva, na dimensão do custo/benefício que deve ser aplicado às taxas.

Nesse sentido, como as usinas de energia hidrelétrica que utilizam quantidades substanciais de recursos hídricos, o quantum debeatur, necessariamente irão apresentar valores altíssimos, muito maiores do que o custo da atividade estatal, desencadeariam uma onerosidade excessiva do setor e a desproporcionalidade do valor cobrado pela contrapartida do poder pública através da fiscalização.

A taxa criada poderá gerar uma receita para o estado do Pará muito superior à totalidade orçamentária de todas as despesas autorizadas das seis secretarias de Estado envolvidas com o poder de polícia em questão. Apenas para o setor energético e com o aproveitamento de 55% da capacidade instalada, seria de quase R$ 1 bilhão. Enquanto isso, todas as despesas da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, responsável primária pelo exercício do poder de polícia, resultariam em por volta de R$ 65 milhões.

Com isso, por mais que a cobrança da taxa de fiscalização do recurso hídrico tenha sido julgada inconstitucional, não podemos considerar o tema por encerrado. O assunto tem sido tratado pelos estados que mais dependem da matriz de energia hidráulica, com a finalidade de afastar o risco de crises hídricas, mas deve se ater à proporcionalidade com o serviço prestado e à capacidade contributiva para encontrar um meio termo: não onerar em demasia determinado setor e garantir a proteção ambiental para as presentes e futuras gerações.

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