Caso raro

Acusada de tráfico é absolvida após perícia da defesa se opor a laudo da PF

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10 de abril de 2021, 17h46

"A materialização de um meio de prova não desqualifica os demais quando também se apresentarem aptos ao alcance da mesma finalidade, como ocorrido na espécie". Foi com esse fundamento que o juiz federal Roberto Lemos dos Santos Filho, da 5ª Vara Federal de Santos, absolveu uma aposentada acusada de tráfico internacional de drogas, após a perícia grafotécnica particular contratada pela defesa se opor a laudo da Polícia Federal

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dolgachovPacote com cocaína foi despachado pelos Correios em nome de idosa após o roubo de seus documentos

Segundo o Ministério Público Federal (MPF), a acusada tentou enviar 106 gramas de cocaína para o Reino Unido por meio de uma agência dos Correios em Santos. O MPF pediu a condenação da ré em suas alegações finais por "estarem provadas a autoria e a materialidade" do suposto tráfico internacional, cuja pena varia de cinco anos e dez meses de reclusão a 25 anos. A equipe do escritório Posocco & Advogados Associados, liderada por Fabricio Sicchierolli Posocco, pleiteou a absolvição.

A denúncia do MPF narra que a aposentada se dirigiu à agencia dos Correios situada na Avenida Júlio de Mesquita, 192, na Vila Mathias, às 15h22 do dia 22 de setembro de 2015. A mulher teria postado uma encomenda para "Nicole Derby", indicando como endereço de destino "26 Boners Field Long Crendon, Bucks, Reino Unido".

Ainda em solo brasileiro, durante inspeção em um recinto fiscal em São Paulo, a Receita Federal descobriu 106 gramas de cocaína na encomenda. Por meio dos dados sobre a remetente escritos no pacote destinado ao Reino Unido, a PF chegou à acusada e realizou perícia. O resultado do exame concluiu ser da ré a grafia da embalagem postal.

Elogio a perito
A perícia da PF foi feita na fase de inquérito, sem o advogado poder acompanhá-la. Na ação penal, quando prevalecem as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, Posocco contratou o perito judicial Francisco Martori Sobrinho para realizar novo exame, cujo laudo descartou a ré como autora da grafia no pacote.

O MPF não impugnou no momento legal oportuno o documento juntado pela defesa e nem requereu nova perícia, com a indicação de assistentes técnicos pelas partes, para contrapor a prova produzida pela ré. No final, o exame grafotécnico particular foi fundamental para a decisão do juiz e até mereceu elogio na sentença.

"O trabalho desenvolvido pelo sr. Francisco Martori Sobrinho foi bem fundamentado, sendo capaz de gerar dúvida razoável acerca da autoria das grafias apostas tanto na caixa de papelão como no formulário dos Correios, supostamente preenchidos pela ré." Com esta avaliação, o juiz absolveu a aposentada por insuficiência de prova.

Roberto Lemos observou que os laudos produzidos na fase extrajudicial não se submetem à participação das partes. Contudo, nada impede que, atendendo aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, tais perícias sejam questionadas em juízo ou contrapostas por outros documentos.

A aposentada negou que tenha despachado a encomenda com cocaína pelos Correios. Ela disse que roubaram os seus documentos e, em razão disso, ainda teve empréstimo bancário contraído indevidamente em seu nome. A defesa da ré juntou ao processo cópia de sentença que reconheceu a fraude nesta operação.

De acordo com Posocco, a defesa utilizou as faculdades da lei para explorar a prova pericial. "O perito contratado pelo escritório demonstrou que a perícia realizada pela Polícia Federal não se mostrou correta e continha alguns vícios. O trabalho em conjunto foi excelente para gerar a absolvição da acusada e restabelecer a justiça no caso."

*Notícia originalmente publicada no Vade News

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