Divórcio com culpa

Tribunal dos EUA muda precedente para reconhecer existência de adultério gay

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8 de abril de 2021, 7h21

O Tribunal Superior de New Hampshire reformou sua própria decisão de 2003 para incluir na definição de adultério relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo. Antes da nova decisão, só poderia ser considerado adultério, para fins de divórcio, a relação extraconjugal entre um homem e uma mulher e a que envolvesse penetração do pênis na vagina, especificamente.

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Segundo jurisprudência anterior, adultério só seria possível se relação extraconjugal fosse entre homem e mulher 
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A decisão foi considerada importante para New Hampshire por algumas razões. Entre elas, a que motivou a decisão judicial sobre um divórcio, que chegou ao tribunal superior. No estado, há diferença entre divórcio com culpa (at fault) ou sem culpa (at no fault), com implicações significativas no processo. No caso de divórcio com culpa, a parte culpada pode perder direitos como, por exemplo, o que se refere à separação dos bens.

A decisão também reconheceu a existência do casamento entre pessoas do mesmo sexo, o que foi bem recebido pela comunidade LGBT. Ou seja, em caso de divórcio, a parte "traída" no casamento gay pode pedir o divórcio na justiça com base na alegação de adultério com culpa. Isso não era possível antes.

Mas, antes de tudo, a decisão reconheceu que adultério não se refere apenas à relação extraconjugal que envolve a penetração vaginal. A nova definição passou a ser: "Adultério é a relação sexual voluntária entre uma pessoa casada e uma outra pessoa que não é seu cônjuge, independentemente de sexo ou de gênero".

"Para o propósito dessa definição, relação sexual deve incluir relação heterossexual envolvendo penetração da vagina pelo pênis e relação sexual envolvendo contato genital outro do que a penetração da vagina pelo pênis". Ao limitar a definição de adultério a "contato genital", aparentemente o tribunal terá de tomar uma terceira decisão, no futuro, para abrir todo o leque de atos sexuais e, também, de relações extraconjugais.

Da mesma forma, a decisão de 2003 também foi largamente baseada, na falta de definições legislativas, em definições de dicionários, como: "Adultério é cometido sempre que houver uma relação sexual que levanta uma questão espúria. Uma questão espúria só ocorre em uma relação sexual entre um homem e uma mulher. Adultério criminal só é cometido apenas com uma pessoa do sexo oposto".

Mesmo sexo
Sobre relações homossexuais, o tribunal superior de New Hampshire concluiu: "Limitar a definição de adultério à relação sexual entre duas pessoas do sexo oposto seria inconsistente com a legislação aprovada pelo legislativo [do estado] que legalizou o casamento entre pessoas do mesmo sexo há mais de uma década".

"A interpretação de que a infidelidade só pode ser fundamento para divórcio apenas se cometida entre pessoas do sexo oposto não iria cumprir o propósito geral de proteger a promessa matrimonial de fidelidade em todos os casamentos legalmente reconhecidos e levaria a um resultado absurdo e injusto".

Retroatividade
No processo que tramitou por todas as instâncias estaduais, a disputa foi entre uma mulher casada que teve relações sexuais com outra mulher e o marido. As decisões das instâncias inferiores deram razão à mulher, com base no precedente de 2003. O tribunal superior reformou o precedente e remeteu o processo à primeira instância para julgar o divórcio, com base na nova decisão.

Prevendo que isso poderia acontecer, a mulher pediu ao tribunal superior que não considerasse a decisão retroativa, caso ela beneficiasse a outra parte. A resposta foi:

"Na common law, as decisões em nível de recurso são presumivelmente retroativas, porque, ao declarar o que é a lei, a corte meramente declara o que a lei sempre foi".

"Mas temos reconhecido que a aplicação retroativa de decisões judiciais às vezes pode causar resultados adversos, quando, consistente com a doutrina da força vinculante dos precedentes (stare decisis), a partes se valeram de normas jurídicas anteriores. Portanto, podemos aplicar a decisão prospectivamente, quando a justiça for mais bem servida por se fazer isso".

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