Opinião

A repercussão do ICMS-ST na base de cálculo do PIS e da Cofins

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5 de abril de 2021, 6h03

A inconstitucionalidade da inclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na base de cálculo do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins), decidida pelo Supremo Tribunal Federal em março de 2017, é, sem dúvidas, um dos temas tributários de maior impacto para os contribuintes, dele surgindo várias questões adjacentes, como a de se perquirir se o ICMS incidente sob o regime de substituição tributária (ICMS-ST) também estaria abarcado nos efeitos desse julgamento.

Recentemente a 2ª Turma do Supremo Tribunal de Justiça proferiu posição sobre esse tema no REsp 1885048, ao decidir que o contribuinte substituído não tem o direito de excluir o ICMS-ST da base dessas contribuições, sob o argumento de que o tributo é recolhido pelo substituto tributário assumindo a feição de tributação direta, sem repercussão na cadeia. Há outros acórdãos e decisões monocráticas nesse sentido dessa mesma turma do STJ.

Esse entendimento não está alinhado à interpretação jurídica adotada pelo STF quando tratou do tema da substituição tributária e sua fenomenologia na apuração do ICMS e também aos julgados que vêm sendo proferidos pelos Tribunais Regionais Federais (TRFs) e pela 1ª Turma do STJ sobre o tema em relação às referidas contribuições.

Pelo regime de substituição tributária, o primeiro agente da cadeia de produção, circulação e consumo de um produto recolhe, antecipadamente, o tributo que seria devido pelo contribuinte adquirente na etapa posterior de revenda. Por antecipar a obrigação tributária sobre uma operação futura ainda não realizada, mas que se presume vai ocorrer, o ICMS-ST é calculado sobre uma base estimada.

Esse mecanismo foi analisado pelo Pleno do STF em 2002, quando decidiu que o fato gerador presumido do ICMS-ST era definitivo, dando ensejo à restituição do ICMS ao contribuinte apenas na hipótese de sua não realização, sem possibilidade de ressarcimento caso o valor real da operação fosse menor do que o presumido.

Essa questão foi novamente apreciada pelo STF em 2016, com efeito de repercussão geral, ocasião em que decidiu que é também devida a restituição do ICMS-ST recolhido a maior quando a operação final se concretizar por um valor inferior ao presumido. A nova visão do STF definiu que a restituição do excesso é devida toda vez que o fato gerador presumido não se concretizar empiricamente da forma como antecipadamente tributado. 

O aspecto principal que motivou a alteração jurisprudencial foi o de que o ICMS-ST pago antecipadamente pelo contribuinte substituto é provisório, e não definitivo como antes entendia aquela corte, ou seja, só com a realização da real operação de venda é que o fato gerador do ICMS se concretiza definitivamente, procedendo-se, nesse momento, à aferição entre a base ficta utilizada para o regime de substituição e a base real.

Diante da atual posição do STF acerca da natureza antecipatória do regime de substituição, não se pode admitir que a cadeia de repercussão econômica do tributo se encerre na figura do substituto, como assinala o julgamento da 2ª Turma do STJ. Ao contrário, a tributação indireta, própria do ICMS, como tributo plurifásico que é, se mantém no regime do ST e só se exaure no último impulso da mercadoria, qual seja, a venda para o consumidor final.

O ônus do ICMS-ST recai sobre o substituído. Tanto isso é verdade que a Lei Complementar nº 87/96 (que instituiu o ICMS) previu, em seu artigo 10, que é assegurado ao substituído o direito à restituição do imposto pago por força da substituição se o fato gerador presumido não se realizar. Essa realidade legislativa foi realçada com a decisão do STF ao entender que se a operação real ocorrer por valor inferior à estimada no regime do ST também caberá a restituição.

O contribuinte substituído não recolhe valores ao Estado porque o substituto o fez em seu lugar, mas suporta o ônus tributário decorrente. A primeira operação gera o recolhimento provisório ao Estado. A cadeia de circulação e repercussão jurídica do ICMS, como tributo plurifásico que é, continua aberta até a próxima venda ao consumidor final, quando, então se conhece o valor real da operação e a carga incidente.

O fato de o imposto não ser destacado no documento fiscal de saída da mercadoria não significa dizer que não incidiu na operação. O que ocorreu foi a antecipação do recolhimento pelo substituto tributário tomando-se como termo uma base presumida e precária. E daí surge o direito de o contribuinte substituído ressarcir-se do ICMS-ST quando a base usada para recolhimento for maior do que o valor real da efetiva saída. Por outro lado, as unidades federadas também já estão regulando a cobrança do complemento do tributo quando o valor de saída for maior do que a base presumida.

Em razão de tudo isso, estando o substituído sujeito ao PIS e à Cofins, o ônus do ICMS é suportado por ele e é incluído implicitamente no cômputo de sua receita bruta, sujeita a essas contribuições. Em suma, no momento da saída da mercadoria é que fica configurado o fato gerador do ICMS e, por conseguinte, a sua incidência, independentemente de ter havido ou não destaque do imposto na nota fiscal de saída. Portanto, o ICMS-ST, com exceção da parcela que for objeto de ressarcimento, deve ser excluído da base de cálculo destas exações em face da inconstitucionalidade de sua inclusão decidida pelo STF em março de 2017, com efeito de repercussão geral.

Espera-se que esses aspectos venham a ser considerados pelo STJ em futuros recursos especialmente no julgamento do EREsp 1428247, que pretende uniformizar o entendimento daquela corte sobre o tema , conduzindo à consolidação da jurisprudência em favor desse direito do contribuinte substituído com base nas lições do STF, que já negou a existência de repercussão geral sobre o tema.

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