Autoria e Materialidade

Depoimento isolado de vítima de estupro não sustenta condenação criminal, diz TJ-CE

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30 de setembro de 2020, 18h54

Ainda que a palavra de vítima de estupro tenha elevada importância, condenações criminais só devem ocorrer quando fornecidas provas adicionais e contundentes sobre a materialidade e a autoria delitiva. 

Divulgação/TJ-CE
TJ-CE absolveu homem acusado de estupro de vulnerável
Divulgação/TJ-CE

O entendimento é da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Ceará. O colegiado absolveu um homem acusado de estupro de vulnerável. A decisão é desta segunda-feira (29/9).

O crime teria ocorrido em 2011. Segundo os autos, a criança, à época com três anos de idade, reclamou de dificuldade para ir ao banheiro e, ao ser perguntada sobre o motivo, disse ter sido abusada por um motorista de transporte escolar. 

Na decisão, a desembargadora Lígia Andrade de Alencar Magalhães, relatora do caso, afirma que a criança não chegou a depor em juízo. Assim, os testemunhos colhidos têm como base apenas o relato feito pela infante.

"No presente caso, o que se verifica é que toda a prova resume-se à palavra da pequena vítima, criança de tenra idade, que contava com apenas três anos de idade à época dos fatos, a qual sequer foi ouvida em juízo. Os demais depoimentos e declarações amealhados na instrução criminal, a bem da verdade, não passam de recontagem dos relatos da vítima, ou seja, reprodução daquilo que foi confidencializado pela mesma à sua tia e genitora", afirma a decisão. 

A magistrada também destacou que, quanto à materialidade, o laudo pericial não constatou qualquer vestígio sobre a ocorrência de conjunção carnal. Ela ressaltou, no entanto, que a figura típica do estupro de vulnerável engloba atos libidinosos diversos da conjunção carnal que podem, por vezes, não deixar vestígios. 

Também disse que um laudo apontou que a criança não precisava de acompanhamento psicológico. A família, por outro lado, afirma que a criança passou a ter medo de vans escolares, se recusando a usar o transporte, e que ela passou a se retrair ao usar o banheiro. 

"A jurisprudência dos tribunais superiores é pacífica no sentido de que, em crimes desse jaez, comumente praticados na clandestinidade, deve a palavra da vítima ser avaliada com elevado grau de importância. Nada obstante, isso não significa dizer que a palavra da vítima, por si só, possa ser utilizada para a condenação criminal, ainda que isolada no arcabouço probatório. Pelo contrário, as cortes superiores são enfáticas em destacar que a palavra da vítima, mesmo sopesada com maior relevo nos crimes contra a liberdade sexual, deve ser coerente e encontrar amparo nas demais provas dos autos", prossegue a decisão. 

Em primeira instância, o homem apontado como autor do crime foi condenado a 12 anos de prisão, a ser cumprida em regime inicial fechado. A sentença, proferida pela 12ª Vara Criminal de Fortaleza, é de setembro de 2015.

A defesa do paciente foi patrocinada pelo escritório Advocacia Paulo Quezado. O caso corre em segredo de justiça. 

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