Estratégias políticas

Com "nova" Suprema Corte, EUA vai dar mais uma guinada para a direita

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27 de setembro de 2020, 10h12

Com a provável nomeação pelo presidente Donald Trump da juíza conservadora Amy Coney Barrett, 48, para a Suprema Corte dos Estados Unidos, o que os liberais-democratas do país consideram suas grandes conquistas nos últimos anos poderão ser revertidas pelos conservadores-republicanos.

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Trump discursa ao lado de Coney Barrett
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A partir do momento em que ela tomar posse e a "bancada" conservadora da corte estabelecer uma maioria de 6 votos a 3, entrarão na linha de fogo os direitos ao aborto, ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e ao seguro-saúde gratuito (Obamacare), bem como as leis que restringem a posse e o porte de armas.

Amy Barret se define como católica fervorosa, associada ao grupo religioso People of Praise, que alguns críticos classificam como seita — embora isso seja discutível. Foi filiada à "Faculdade pela Vida" de Notre Dame e, em 2015, assinou uma carta à Igreja Católica que declara os ensinamentos da igreja como "verdade".

Quanto as suas convicções jurídicas, ela já escreveu que "os precedentes da Suprema Corte não são sacrossantos". Para os liberais, essa é uma afirmação de que, na primeira oportunidade, ela e os demais conservadores da corte poderão reverter a decisão conhecida como "Roe v. Wade" que, em 1973, legalizou o aborto em todo o país.

Se não reverter a decisão, a Suprema Corte poderá, pelo menos, decidir que cada estado poderá escolher o seu caminho, no que se refere ao aborto. Isso irá, pelo menos, agradar os estados tradicionalmente conservadores.

Entre as "verdades" derivadas do ensinamento da Igreja, estão também os "valores da família baseada no casamento fundamentado no compromisso indissolúvel entre um homem e uma mulher".

Isso indica para os liberais que, na primeira oportunidade, ela vai ajudar a reverter a decisão de legalizou o casamento gay no país.

Contra essa expectativa, há a declaração dela, durante a sabatina a que se submeteu no Senado, quando foi indicada para juíza do Tribunal Federal de Recursos da 7ª Região, de que sua crença religiosa nunca vai interferir em suas decisões judiciais.

O futuro do seguro-saúde gratuito para quem não pode pagar seguro particular, definido pela lei Affordable Care Act e conhecido como Obamacare, vai ser decidido pela Suprema Corte em breve.

Da última vez, o Obamacare sobreviveu a um processo que pedia sua extinção graças ao voto decisivo de John Roberts, que votou com os ministros liberais.

Ela criticou a argumentação de Roberts, o que indica que o Obamacare está com dias contados. Deverá ser substituído pelo Trumpcare, um sonho do presidente Trump, mais adequado aos princípios republicanos: quanto menos "socialismo", melhor.

Os defensores da Segunda Emenda [da Constituição dos EUA], a que garante o direito à posse e ao porte de armas, mas que sofre restrições por parte de leis estaduais, também estão festejando a indicação de Amy Barrett.

Em uma decisão do tribunal de recursos, por exemplo, ela escreveu: "As Assembleias Legislativas têm o poder de proibir pessoas perigosas de possuir armas. Note-se que a proibição se refere apenas a pessoas perigosas". Não envolve, por exemplo, criminosos do colarinho branco.

Geralmente, as leis proíbem a posse de arma por criminosos. No caso perante os juízes da corte, um réu foi preso por portar armas, apesar de ter sido condenado anteriormente. Ela argumentou que o réu não poderia ser condenado por posse ilegal de arma porque ele cometeu um crime do colarinho branco e, portanto, ele não era inerentemente perigoso.

Estratégia eleitoral
Trump espera que o Senado confirme sua indicação antes de 3 de novembro, o dia das eleições, de forma que ele possa nomear a juíza Amy Barrett ministra da Suprema Corte imediatamente.

Para analistas políticos dos EUA, tal proeza pode ser um tiro pela culatra, no que se refere à tentativa de reeleição do presidente. Uma das razões é a de que os eleitores republicanos perderão uma de suas principais motivações para ir às urnas: a de garantir a maioria conservadora na Suprema Corte. Já vai estar garantida por algumas décadas.

Os eleitores democratas, por outro lado, ficarão muito mais motivados a ir às urnas do que já estão. Vai aumentar a vontade de colocar Joe Biden, o candidato democrata, na Presidência e garantir maioria democrata no Senado e na Câmara dos Deputados.

Com isso, os democratas poderão pensar em um remédio para o trauma criado por Trump para os liberais do país. Há alternativas em debate, como a de aumentar o número de ministros de nove para 11, para que Biden possa nomear mais dois ministros e restabelecer um certo equilíbrio na corte.

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