Proteção de dados

Para Martins, ação do Judiciário ajudará na efetivação dos direitos previstos na LGPD

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22 de setembro de 2020, 21h56

O presidente do Conselho da Justiça Federal e do Superior Tribunal de Justiça, ministro Humberto Martins, afirmou que a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), na última sexta-feira (18/9), colocou o Brasil no grupo dos países que reconhecem os cidadãos como titulares de direitos sobre seus dados pessoais. Segundo ele, a nova lei provocará transformações importantes na rotina de pessoas, empresas e organizações públicas.

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ReproduçãoPara Martins, ação do Judiciário ajudará na efetivação dos direitos previstos na LGPD

A declaração foi feita na abertura do webinário promovido nesta segunda-feira (21/9) pelo tribunal e pelo CJF, em parceria com o Centro de Formação e Gestão Judiciária do STJ (Cefor) e a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), para debater a aplicação da LGPD no Poder Judiciário.

De acordo com o presidente, o Judiciário, seguindo a Recomendação 73/2020 do Conselho Nacional de Justiça, está trabalhando para adequar todos os seus órgãos jurisdicionais, administrativos e gerenciais à nova legislação. O ministro destacou que, para que sejam implementados e garantidos os direitos subjetivos previstos na LGPD, é preciso haver vigilância contínua, tanto externa quanto interna, com a utilização dos meios de controle do Poder Judiciário.

"A própria ação dos órgãos do Poder Judiciário, portanto, já é um caminho para efetivar tal garantia de direitos", afirmou Humberto Martins. A nova lei exige que empresas e órgãos públicos deixem claro para os usuários de que forma serão feitos a coleta, o armazenamento e o uso de seus dados pessoais.

Responsabilidade 
O diretor-geral da Enfam, ministro Og Fernandes, lembrou que os dados são hoje a grande ferramenta de controle do presente e do futuro. "O mundo cibernético, sem fronteiras e com inúmeras possibilidades, incentiva o compartilhamento desenfreado de informações pessoais. Essas informações também são exigidas a cada passo e a cada instante. No momento em que abandonamos o papel – inclusive dentro do Judiciário –, inserimos os dados em grandes bancos imateriais, que deixam o meio físico e passam a ficar contidos em nuvens de memória eterna e sem censuras", afirmou.

Og Fernandes destacou a importância e a responsabilidade representada pela posse e pela gestão de dados pessoais no STJ e no Judiciário como um todo, e exortou que os magistrados debatam o tema e se preparem para os novos desafios.

"O Poder Judiciário, como hospedeiro de dados pessoais de milhões de pessoas – muitas delas vulneráveis –, deve debater essa responsabilidade e esse encargo. Para nós, juízes e gestores do sistema de Justiça, dados pessoais nunca poderão ser uma simples moeda de troca ou o petróleo do futuro. Temos um papel de proteção e de gestão dos dados daqueles que buscam a Justiça em busca de respostas, bem como daqueles que compõem o corpo que movimenta a máquina jurisdicional", concluiu o ministro.

Segundo o diretor do Cefor, professor Alexandre Veronese, o webinário é o primeiro evento público de uma série de ações com as quais o STJ, o CJF e a Enfam pretendem colaborar na efetivação da LGPD dentro dos órgãos judiciários. "Teremos muitos meses de trabalho na adaptação de rotinas, processos e serviços aos termos da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais. Essa adaptação possui uma perspectiva interna com as peculiaridades das atividades judiciárias, as quais exigirão, por certo, soluções específicas", afirmou Veronese.

Segurança
O ministro Villas Bôas Cueva iniciou o debate traçando um histórico da construção da legislação de proteção de dados no Brasil. Segundo ele, a Lei 13.709/2018 tramitou durante oito anos, com um amplo debate entre o Congresso Nacional e a sociedade, e se baseia no Regulamento Geral de Proteção de Dados, uma geração mais avançada dessa legislação de proteção de dados na Europa.

"Essa lei é muito importante para inserir o Brasil nesta nova economia digital e permitir que os titulares de dados tenham mais segurança nas transações, que se tornam cada vez mais constantes e ainda aumentarão com o 5G e com o uso de instrumentos de inteligência artificial, em todos os setores, inclusive no Judiciário", destacou.

Para o ministro, a nova lei é muito importante para colocar o Brasil em sintonia com os marcos legais regulatórios existentes no mundo. Segundo ele, desde a década de 1990, a jurisprudência do STJ tem reconhecido que existe um novo tipo de privacidade envolvendo dados.

O ministro lembrou que, quando o STF tratou das ações que questionavam o envio de dados das empresas de telefonia fixa e móvel para o IBGE, como previsto na Medida Provisória 954, firmou importante jurisprudência. "Essa foi a primeira vez que o Supremo reconheceu a existência de um direito fundamental de proteção de dados", afirmou.

Villas Bôas Cueva acrescentou que, no Poder judiciário, a questão da aplicação da LGPD é complexa. Ele disse que existem pelo menos duas dimensões de aplicação da nova lei que devem ser adaptadas: a atividade não jurisdicional, administrativa; e a atividade jurisdicional, típica do Poder Judiciário.

Ele lembrou que a recomendação do CNJ traz orientações para que os tribunais criem seus planos de ação para mapear todas as suas atividades envolvendo dados pessoais, como os dados serão mantidos e quais critérios de segurança serão aplicados para garantir que a política de proteção de dados seja atendida.

Adaptação
Para a advogada Andrea Willemin, a LGPD é uma lei de grande espectro que impactará a maioria das atividades da população brasileira e dos órgãos públicos, principalmente o Poder Judiciário. "Quando falamos da LGPD, criamos uma nova categoria de dados, dados pessoais versus demais dados", explicou.

Segundo Andrea Willemin, essa cisão traz toda uma alteração na forma e na estrutura de se lidar com os dados pessoais, além de exigir uma adaptação para que as estruturas organizacional, processual e sistemática trabalhem pela implementação do novo direito fundamental reconhecido pela lei.

A professora declarou ainda que, em razão do aumento do uso da tecnologia, as pessoas podem sofrer danos e violações; por isso, o titular do dado precisa estar ciente do que está sendo feito com seus dados pessoais. "Em nenhum momento a LGPD vai proibir o uso dos dados, e sim mostrará como esses dados pessoais poderão ser utilizados", destacou.

Para a advogada, as instituições precisam conhecer a LGPD e os dados que transitam dentro dos seus órgãos, para se organizarem. "A dificuldade é grande, pois a ordem jurídica brasileira é diferenciada. Tínhamos grande exposição das informações, e a LGPD traz um novo ponto para remanejar o tratamento desses dados", acrescentou.

Ela observou ainda que a adaptação das instituições implica modificação dos processos dentro das organizações, com fiscalização dos dados que entram e saem dos sistemas, para efetivar o novo direito.

"Não existe fórmula pronta para implementar a LGPD. Isso depende das particularidades de cada país e de cada instituição. Nesse momento, é preciso criar modelos para cada órgão, de forma que se possa prestar contas desses dados, pois vão gerar impacto em todas as áreas. É preciso um modelo próprio para a nossa realidade face à grande diversidade legal, cultural, econômica e tecnológica do Brasil", concluiu.

Também participaram do webinário os ministros do STJ Maria Thereza de Assis Moura, Paulo de Tarso Sanseverino, Benedito Gonçalves e Isabel Gallotti. O evento foi transmitido pelo canal do STJ no YouTube. Com informações da assessoria de imprensa do Conselho da Justiça Federal.

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