Direitos Humanos

Acusado de crimes na ditadura será julgado na Itália nesta sexta-feira

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10 de setembro de 2020, 20h29

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Os ex-presidentes generais João Figueiredo (Brasil) e Jorge Rafael Videla (Argentina)
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O brasileiro Átila Rohrsetzer será julgado pela Justiça italiana nesta sexta-feira (11/9) por participação no sequestro, tortura, assassinato e ocultação do cadáver do ítalo-argentino Lorenzo Viñas durante a ditadura militar brasileira (1964-1985).

Na época dos crimes, Átila era diretor da Divisão Central de Informações do Rio Grande do Sul. Ao ser citado pelo governo italiano por meio de carta rogatória enviada ao Superior Tribunal de Justiça em 2011, Rohrsetzer afirmou que não se submete a jurisdição italiana por entender que as acusações são absurdas.

Para Glenda Mezarobba, cientista política e conselheira do Instituto Vladimir Herzog, o julgamento é emblemático por se tratar de uma rara oportunidade de um acusado de violações de Direitos Humanos durante a ditadura ser julgado. "Ele está sendo julgado na Itália porque o crime foi contra um cidadão ítalo-argentino. É um pouco o que aconteceu — guardadas as devidas proporções — com o [Augusto] Pinochet [ditador]. que não foi julgado no Chile e acabou preso por responder uma ação penal na Espanha quando visitou a Inglaterra", diz.

Glenda afirma que o Brasil lida de modo muito problemático com os crimes da ditadura. "É muito assustador se pensar que o Estado brasileiro tem sido responsabilizado por esses crimes, mas dos agentes públicos não. É uma visão enviesada, parcial e que reconhece apenas uma parte da responsabilidade", defende.

Operação Condor
O julgamento acontece à revelia e é um desdobramento de um processo sobre a Operação Condor — iniciativa colaborativa entre ditaduras latino-americanas para repressão e tortura sistemática — e que foi aceito pela Justiça italiana em 2007.

Nesse processo foram denunciadas 146 pessoas, incluindo quatro brasileiros. Trinta e três tornaram-se réus, dos quais foram condenados oito ex-presidentes e militares sul-americanos à prisão perpétua por assassinato e 19 foram absolvidos. Alguns denunciados faleceram durante os desdobramentos do processo.

A denúncia contra agentes militares brasileiros levou à abertura de um processo paralelo, em que quatro deles foram acusados pelo assassinato de Lorenzo Vinãs Gigli. Apenas Átila Rohrsetzer segue vivo. 

Lei da Anistia
Os crimes cometidos contra Vinãs foram cometidos após 1979. "Aqui no Brasil há um argumento que a Lei da Anistia impediria a responsabilização criminal dos envolvidos em violações dos Direitos Humanos do qual sou contrária. Nesse caso, nem esse argumento pode ser usado", explica.

Entendimento diferente do advogado Alberto Toron. O criminalista atuou no julgamento da ADPF 153, quando se julgou constitucional a lei da anistia na Corte Interamericana de Direitos Humanos. Em entrevista à ConJur, ele recordou o caso e afirmou que "levando em conta que os pactos firmados pelo Brasil em que crimes como tortura são imprescritíveis, a subscrição dos pactos internacionais foram posteriores aos crimes". "E, sendo posterior, não podem retroagir para abarcar coisa do passado sob pena de violência a um princípio cardeal de nosso ordenamento penal e constitucional, que é a irretroatividade da lei penal mais gravosa."

Mesmo se condenado, o Brasil não deve cumprir os mandados de prisão expedidos pela Justiça italiana contra Átila Rohrsetzer e também não deve atender nenhum pedido de extradição já que o artigo 5º, inciso LI da Constituição Federal proíbe a extradição de brasileiros natos.

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