Opinião

O inferno da (in)segurança no Brasil

Autor

  • Raul Jungmann

    é ex-deputado federal; Foi ministro do Desenvolvimento Agrário e ministro Extraordinário de Política Fundiária do governo FHC ministro da Defesa e ministro Extraordinário da Segurança Pública do governo Michel Temer.

30 de outubro de 2020, 15h39

A morte volta a triunfar sobre a vida e o seu sucesso se mede pelo número de óbitos, segundo o Anuário da Segurança Pública de 2020. Isto é, as mortes violentas, que vinham caindo desde 2018, voltaram a crescer no primeiro semestre do ano, 7,1%. 

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No mesmo dia em que o anuário registrava a estatística mórbida, a pesquisa "Mapa dos Grupos Armados do Rio" constatava que 57% do território da cidade do Rio de Janeiro e quase um terço da sua população (dois milhões de habitantes) vivem sob o domínio da milícia. Ainda nesse dia aziago, a Polícia Federal informava que os registros de armas cresceram 120% em 2020.

Das trevas do nosso sistema prisional emergia a informação de que 75% dos 862 mil apenados, dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), são negros e pobres. Eis, num único dia, a síntese do inferno da (in)segurança no Brasil e da ausência de uma política nacional pública de segurança sob o atual governo.  

A pandemia veio agravar o desemprego crescente, na casa dos 14%, sem contar outros dez milhões que deixaram de procurar trabalho — talvez pendurados no auxílio emergencial de difícil continuidade, elevando as tensões sociais. 

Diante disso, o que faz o governo? Afrouxa os controles sobre a venda de armas, já responsáveis por 77% das mortes violentas. O Susp (Sistema Único de Segurança Pública) e a Política Nacional de Segurança, heranças do extinto Ministério da Segurança, foram enterrados sem cerimônia; a letalidade policial aumentou 6% e a morte de policiais, 16,6% no semestre, enquanto o feminicídio subiu 7,1% no mesmo período.

Em paralelo, o orçamento do governo federal para a segurança, equivalente a 11% do gasto total, caiu 3,8%! A política de combate às drogas, reconhecidamente falida, segue levando milhares de jovens negros, pobres, de baixa renda e precária educação para as garras das 70 facções de base e origem prisional. Estas dominam quase 80% das 1,5 mil unidades prisionais do país e de lá de dentro controlam o tráfico e a violência nas ruas.

Esses jovens, os 11 milhões de "sem-sem" — sem escola e sem trabalho —, não são alcançados por nenhum programa nacional que reduza as suas vulnerabilidades ao chamado do crime, o que os faz 55% da terceira maior população prisional do mundo. Pior: cresce 8% ao ano, num sistema prisional superlotado, com o dobro de presos para as vagas disponíveis.

Conclusão: sem uma política nacional de segurança, que contemple a reforma do sistema prisional, um programa nacional para a juventude vulnerável, nova política de drogas e a reforma das nossas polícias, dias piores virão.

Artigo originalmente publicado no site Capital Político

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    é ex-deputado federal; Foi ministro do Desenvolvimento Agrário e ministro Extraordinário de Política Fundiária do governo FHC, ministro da Defesa e ministro Extraordinário da Segurança Pública do governo Michel Temer.

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