Máfia do apito

STJ afasta dano moral coletivo por fraude na arbitragem do Brasileiro de 2005

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27 de outubro de 2020, 18h53

A manipulação dos resultados de jogos do Campeonato Brasileiro de 2005, no episódio que ficou conhecido como "máfia do apito", não é ato que preenche os requisitos para gerar lesão na esfera extrapatrimonial coletiva de modo a gerar o dever de pagar indenização por danos morais.

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Anulação de jogos por fraude de arbitragem não gera lesão extrapatrimonial aos torcedores
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Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu parcial provimento aos recursos especiais da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e Federação Paulista de Futebol (FPF) para afastar o dever de pagar indenização pela anulação 11 partidas da competição devido a fraudes no resultado.

Prevaleceu o voto do relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, segundo o qual não basta a mera infringência à lei ou ao contrato para a caracterização do dano moral coletivo. É essencial que o ato atinja alto grau de reprovabilidade e transborde os lindes do individualismo, afetando, por sua gravidade e repercussão, o círculo patrimonial de valores sociais.

Para a maioria, formada com os ministro Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro, não foi o que ocorreu no episódio de 2005, inclusive porque as fraudes foram denunciadas pela imprensa e reconhecidas pelas organizadora da competição, que determinou a repetição de 11 jogos manipulados.

"Em regra, as adversidades sofridas por expectadores de determinada modalidade esportiva não costumam interferir intensamente em seu bem estar. Podem causar dissabores e contratempos, sentimentos de caráter efêmero que tendem a desaparecer em curto espaço de tempo", destacou o relator.

José Alberto/STJ
Adversidades sofridas  não costumam interferir intensamente em seu bem estar, disse o relator, ministro Villas Bôas Cueva
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Perda de valores coletivos
Abriu a divergência e ficou vencida a ministra Nancy Andrighi, acompanhada pelo ministro Paulo de Tarso Sanseverino. Para ela, o caso não deve ser analisado diante do sentimento negativo experimentado pelos torcedores ao saberem que os jogos foram manipulados, mas pela relevância frente ao sentimento de aviltamento e perda de valores essenciais coletivos.

Isso porque, conforme doutrina, o futebol é considerado fenômeno cultural de elevado interesse social, revelando-se uma das facetas da identidade nacional brasileira. Paralelamente, tanto o Código de Defesa do Consumidor quanto o Estatuto do Torcedor têm suas bases fincadas na boa-fé objetiva: a confiança de que seus atores atuarão com honestidade e retidão.

"Não há como deixar de reconhecer que a fraude praticada violou o standard ético que regula atividades desportivas, as relações de consumo e as relações privadas em geral. O que é a fraude senão a negação da boa-fé e da confiança?", apontou a ministra.

"O arbitramento das partidas com parcialidade com vista ao recebimento de vantagens indevidas quebra a legítima expectativa dos torcedores e dos cidadãos em geral de que resultado da competição reflita o mérito dos times em campo, com inerente aspecto aleatório. Vejo plenamente caraterizado dano moral coletivo", complementou.

REsp 1664186

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