Opinião

Como se aplica o direito de arrependimento na compra de produtos e serviços

Autores

  • Marlon Fernando Yokada Fernandes

    é advogado especialista em Direito Processual Penal e Didática do Ensino Superior coordenador executivo do Procon de Pedra Preta (MT) e presidente do Conselho Municipal de Defesa do Consumidor (Condecon).

  • Agnes Laís de Oliveira dos Anjos

    é advogada especialista em Direito e Processo do Trabalho com capacitação para ensino no magistério superior representante da OAB-MT e representante no Conselho de Defesa do Consumidor (Condecon) na Comarca de Pedra Preta (MT).

26 de outubro de 2020, 20h38

Na modernidade e na praticidade dos dias atuais, inúmeras compras são efetuadas através da internet ou via contato telefônico, em que muitas vezes os produtos são vendidos a preços mais convidativos, bem como o meio de compras por esses canais são imbuídos de praticidade e rapidez para boa parte dos consumidores, que, muitas vezes em um só contato, conseguem comprar os mais variados produtos. Mas e se o consumidor adquirir algum produto ou serviço por telefone ou internet e, quando for usar, perceber que não gostou ou que não tenha sido adequado às suas necessidades, ele tem a possibilidade de troca ou devolução, recebendo de volta a quantia paga?

A resposta é sim, conhecida como direito de arrependimento, previsto no Código de Defesa do Consumidor, que possibilita a devolução do produto caso o comprador não entenda ser do seu agrado e, o mais importante, sem ter de apresentar qualquer justificativa. Ou seja, o referido direito de arrependimento ou prazo de reflexão é a possibilidade do consumidor desistir da compra, devolver o bem e pegar seu dinheiro de volta sem explicar o motivo.

Essa disposição encontra amparo no artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor que assim estabelece:

"O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de sete dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou em domicílio.
Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados".

À luz do referido artigo, vê se que a parte consumidora tem o direito de arrependimento sempre que a compra do produto ou serviço ocorrer fora do estabelecimento comercial, no prazo de sete dias contados do recebimento para devolver o produto e reaver os valores pagos. Mister salientar que o referido prazo de contagem dos sete dias se inicia no dia posterior ao do recebimento do produto ou da contratação do serviço, sendo dias corridos, ou seja, a contagem não exclui os sábados, domingos ou feriados. Somente existirá a possibilidade de prorrogação desse prazo caso o estabelecimento não tenha expediente no sétimo e último dia, ocasião em que se prorrogará para o próximo dia de funcionamento.

A Lei do Consumidor não estabelece que, para operar a desistência nos casos de compra de um produto, o mesmo esteja com a embalagem lacrada, porém muitos estabelecimentos não adotam essa medida, ocasionando uma infração à letra da lei. Assim, em amparo com o CDC, o direito do arrependimento se dá sobre o produto em sua forma propriamente dita, e não sobre a embalagem deste.

Destarte, alguns questionamentos e dúvidas aparecem em certas ocasiões, como quando se adquire uma colônia, cosméticos e alguns produtos de uso pessoal que necessitem de prova antes do uso, por exemplo. E nesses casos, existiria a possibilidade do consumidor de devolver os produtos a fragrância ou textura não lhe agrade? A princípio, podemos dizer que sim, eis que não existe exceção no Código de Defesa do Consumidor, sendo que lhe assistiria esse direito.

Porém, nesses casos, os fornecedores devem se adequar no envio desses produtos, a fim de postergar maiores problemáticas a ambas as partes, eis que a área de comercialização de certos produtos é bem delicado (como por exemplo o envio de pequenas amostras ou provadores), antes que a parte consumidora viole a embalagem e/ou lacre do produto.

E sobre a possibilidade do direito de arrependimento nas compras em lojas físicas presenciais?
No que se refere às compras realizadas em estabelecimentos físicos, tem-se que é a própria parte consumidora quem se dirige à loja e celebra a compra. Desse modo, presume-se que houve a reflexão antes de comprar e teve contato direto com o produto.

Desta feita, não existe previsão legal para o direito de arrependimento em compras realizadas em lojas físicas presenciais.

Importante ressaltar que o consumidor, além de ser detentor de direitos, também possui obrigações frente a outra parte contratual, ou seja, o consumidor não pode por mera liberalidade desistir da compra efetuada frente à loja física, porque simplesmente assim o quis, tendo de assumir a obrigação frente à empresa contratada.

Diferentemente, se acaso ocorrer algum descumprimento pela parte contratada, seja no prazo para entrega, divergência de produto e etc., o consumidor será amparado e terá direito ao cancelamento da compra e o recebimento do valor pago.

Importante destacar que todo produto possui um prazo de garantia legal obrigatório independente da garantia dada pelo fabricante, sendo 30 dias para reclamar de vício ou defeito de produto não durável e 90 dias para reclamar de vício ou defeito de produto durável.

A devolução do produto, com a consequente troca ou reembolso de valores pagos, somente será possível por motivos de vícios de qualidade e defeito, sem a possibilidade de reparo, conforme previsão no artigo 18, do CDC, vejamos: 

"Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
§ 1°. Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
I. a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;
II. a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III. o abatimento proporcional do preço".

Porém, a devolução de produtos em lojas físicas depende da política do estabelecimento sobre o assunto, pois não existe previsão no ordenamento jurídico que determine que a devolução seja realizada. Alguns estabelecimentos, porém, visando ao bom relacionamento com o cliente, abrem a possibilidade para a negociação da desistência de compra, mas, como mencionado, não há respaldo legal que obrigue que isso ocorra, portanto, não há direito ao arrependimento.

E se o consumidor adquire um produto pela internet com a possibilidade de retirar na loja física?
Importante salientar que, conforme mencionado acima, o direito de arrependimento é válido nas compras feitas fora do estabelecimento comercial.

Nesse diapasão, mesmo que o cliente opte por retirar o produto na loja física (o que pode ser equiparado a retirar em uma agência dos Correios ou transportadora, por exemplo), terá, sim, o direito de se arrepender, pois o que define que tenha esse direito é a modalidade de como a compra foi realizada, e não como a sua entrega se deu.

Autores

  • é advogado, especialista em Direito Processual Penal e Didática do Ensino Superior, coordenador executivo do Procon de Pedra Preta (MT) e presidente do Conselho Municipal de Defesa do Consumidor (Condecon).

  • é advogada, especialista em Direito e Processo do Trabalho, com capacitação para ensino no magistério superior, representante da OAB-MT e representante no Conselho de Defesa do Consumidor (Condecon) na Comarca de Pedra Preta (MT).

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