Opinião

Incidência de 15% do IR sobre indenização do representante comercial é ilegal

Autor

  • Victor Felipe Fernandes de Lucena

    é advogado membro do escritório de advocacia Siqueira Advogados procurador jurídico do Core-CE pós-graduado em Direito Processual pelo Centro Universitário 7 de Setembro (UNI7) e mestrando em Direito Processual pelo Centro Universitário Unichristus.

24 de outubro de 2020, 13h42

O artigo 27, alínea "j", da Lei Federal nº 4.886/65 prevê a obrigatoriedade de constar do contrato de representação comercial, seja escrito ou verbal, a "indenização devida ao representante pela rescisão do contrato fora dos casos previstos no artigo 35, cujo montante não poderá ser inferior a 1/12 do total da retribuição auferida durante o tempo em que exerceu a representação".

Assim, o cálculo da indenização é realizado com base na soma dos valores de todas as notas fiscais emitidas pelo representante durante o contrato, atualizando-se por índice oficial (se sugere o INPC), dividindo o montante por 12.

Como se entende pelo próprio nome, trata-se de uma indenização por todo o trabalho empreendido pelo representante comercial na abertura de clientes enquanto prestador de serviços, logo, o seu fato gerador é estritamente indenizatório, com vias de recompor o representante da perda de sua representada.

Ocorre que, quando da rescisão do contrato de representação comercial, é comum que a empresa representada realize a retenção de 15% sobre o pagamento da indenização devida ao representante, o que, embora seja uma exigência administrativa da Receita Federal do Brasil, é considerada uma prática ilegal por inúmeras decisões judiciais, já que o §5º do artigo 70 da Lei nº 9.430/96 excepciona da incidência do Imposto de Renda a verba destinada a reparar danos patrimoniais, como é o caso da indenização a ser recebida pelo representante comercial, conforme se transcreve, pela importância, o referido dispositivo a seguir:

"Artigo 70 — A multa ou qualquer outra vantagem paga ou creditada por pessoa jurídica, ainda que a título de indenização, a beneficiária pessoa física ou jurídica, inclusive isenta, em virtude de rescisão de contrato, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de quinze por cento.
(…) 
§5º. O disposto neste artigo não se aplica às indenizações pagas ou creditadas em conformidade com a legislação trabalhista e àquelas destinadas a reparar danos patrimoniais" (grifo do autor).

Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, reconhecendo que a indenização recebida pelos representantes comerciais, quando da rescisão contratual imotivada, não está sujeita à incidência do imposto de renda, a exemplo da ementa do Recurso Especial nº 1.133.101/SP, relator ministro Humberto Martins, 2ª Turma, DJe. 13/09/2011, a seguir transcrita:

"Processual civil de tributário, violação do artigo 535 do CPC, Deficiência de fundamentação, Súmula STF. Ausência de prequestionamento. Súmula 211/STJ.
1. Cuida-se na origem de mandado de segurança impetrado com objetivo de obstar o desconto de imposto de renda retido na fonte sobre indenização recebida a título de resilição do contrato de representação comercial previsto na Lei nº 4.886/1965.
2. Não próspera a alegada violação do artigo 535 do Código do Processo Civil, uma vez que deficiente sua fundamentação. Aplica-se ao caso, mutatis mutandis, o disposto na Súmula 284/STF.
3. Da análise detida dos autos, observa-se que a corte de origem não analisou a matéria, sequer implicitamente, à luz dos artigos 681, § 5º, do Decreto nº 3.000/99 (Regulamento do Imposto de Renda — RIR ) e 43, I e II, do Código Tributário Nacional. Incidência da Súmula 211/STJ.
4. À luz do quadro fático abstraído do acórdão recorrido — insuscetível de revisão nesta sede —, não incide o imposto sobre a renda, com fundamento no artigo 70, § 5º, da Lei nº 9.430/96, na medida em que este enunciado estipula a exclusão da base de cálculo do imposto das quantias devidas a título de reparação patrimonial, como na espécie prevista no artigo 27,' j', da Lei nº 4.886/65. Precedente: REsp 1.118.782/DF, realtora ministra Eliana Calmon, 2ª Turma, julgado em 17.9.2009, DJe 25.9.2009. Recurso especial provido"
(grifos do autor).

Conclui-se, diante de todos esses fundamentos legais e decisões dos tribunais superiores, que o tema é de grande relevância, especialmente para os representantes comerciais, em vista da possibilidade da redução significativa de custos tributários no momento da rescisão de seus contratos, com a não incidência do IR sobre as verbas recebidas em decorrência da rescisão do contrato de representação comercial.

Cabe ressaltar, por fim, que o advogado e procurador do Core-CE que ora elabora o presente artigo já defendeu com sucesso diversas causas na Justiça Federal em todo o Brasil em favor dos representantes comerciais, tendo obtido êxito na preservação do direito indenizatório do representante, de modo que a Justiça deferiu os pedidos e determinou que a Receita Federal se abstivesse em cobrar o imposto de renda sobre o valor a ser recebido pelo representante, garantindo, com isso, a aplicação do artigo 70, §5º, da Lei nº 9.430/96 e, nos casos que efetivamente ocorreu a retenção do IR, a União Federal fora condenada na restituição integral e atualizada dos valores que foram recolhidos.

Autores

  • é advogado, membro do escritório de advocacia Siqueira Advogados, procurador jurídico do Core-CE, pós-graduado em Direito Processual pelo Centro Universitário 7 de Setembro (UNI7) e mestrando em Direito Processual pelo Centro Universitário Unichristus.

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