Mudança de entendimento

Regra de transição para prescrição no CRSFN gera liminar no Judiciário

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19 de outubro de 2020, 14h29

A mudança de jurisprudência feita pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN) em agosto definiu que o prazo de três anos para prescrição intercorrente vale também para a fase pré-processual/sancionatória. Mas estabeleceu uma regra de transição que não abarca os casos já julgados. Essa regra motivou o ajuizamento de liminar no Poder Judiciário.

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CVM aplicou multa por insider trading após processo administrativo ficar 3 anos parado
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O CRSFN é órgão colegiado ligado ao Ministério da Economia que julga, em última instância administrativa, os recursos contra punições aplicadas pelo Banco Central e Comissão de Valores Monetários (CVM) em processos de lavagem de dinheiro; também aprecia punições aplicadas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), Superintendência de Seguros Privados (Susep) e demais autoridades.

Até agosto e pelos dez anos anteriores, o CRSFN tinha interpretação restritiva da contagem da prescrição intercorrente disposta no parágrafo 1º do artigo 1º da Lei 9.873/1999. A norma diz que incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho.

Ela só valia para os casos em que a fase processual ou sancionatória já estivesse em curso. Antes disso, a prescrição era ordinária de cinco anos, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.

A mudança alinha o CRSFN à postura adotada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e pelo próprio Poder Judiciário. No entanto, para evitar alteração na situação de já condenados — o que abarcaria figuras envolvidas em escândalos nacionais —, o CRSFN aplicou uma regra de transição.

Assim, a prescrição intercorrente à fase pré-processual só valerá para processos que completarem três anos paralisados depois de um ano da publicação do acórdão, o que ainda não ocorreu.

Portanto, outros órgãos administrativos, como a Susepe e a própria CVM, têm um ano após a publicação do acórdão pra se organizar e dar continuidade aos processos administrativos.

Agência Brasil
CRSFN é órgão recursal administrativo ligado ao Ministério da Economia
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Com base na regra de transição, o CRSFN negou recurso de uma mulher que foi multada pela CVM pela prática de insider trading. Ela foi alvo de processo administrativo que esteve paralisado por mais de três anos até a aplicação da sanção. A prescrição não foi reconhecida pelo órgão administrativo.

O advogado Pedro Raposo Jaguaribe levou o caso à Justiça Federal e obteve liminar favorável para suspender a exigibilidade da multa, com base na probabilidade do direito e no perigo do dano — uma vez que a mulher está sujeita às medidas diretas e indiretas de cobrança da multa administrativa.

A tutela foi concedida pelo juiz Anderson Santos da Silva, da 2ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal, que destacou que "a CVM não pode exercer a sua pretensão sancionatória se esta estiver fulminada pela prescrição".

Ao analisar o caso, ele aplicou jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça segundo a qual o controle exercido pelo Poder Judiciário nos processos administrativos sancionatórios restringe-se ao exame da regularidade do procedimento e a legalidade do ato.

Assim, não cabe ao juiz examinar o que careça de incursão no mérito da decisão, "ainda mais em sede de cognição sumária". Considerou, no entanto, que a alegação de ocorrência de prescrição intercorrente reveste-se de plausibilidade.

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1057279-43.2020.4.01.3400

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