Democracia Em Vertigem

Trump poderá nomear ministra para a Suprema Corte antes das eleições de novembro

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15 de outubro de 2020, 20h52

O Senado dos EUA deverá votar a confirmação da juíza Amy Coney Barrett para ocupar a vaga deixada pela ex-ministra Ruth Bader Ginsburg na Suprema Corte em 26 de outubro. O presidente Donald Trump poderá nomeá-la para o cargo no dia seguinte — ou seja, uma semana antes das eleições de 3 de novembro.

Avi Ohayon/GPO
Trump já disse que não vai aceitar derrota eleitoral; se perder, eventual judicialização do caso chegará à Suprema Corte  
Avi Ohayon/GPO

Assim, Trump terá ainda algum tempo para buscar mais votos, com a possibilidade de alardear o principal legado de seu mandato: o de "empacotar" os tribunais federais com juízes conservadores e estabelecer uma maioria conservadora na Suprema Corte (de 6 votos a 3), que poderá durar várias décadas.

De 2017 para cá, Trump nomeou 218 juízes para tribunais federais: dois para a Suprema Corte (agora serão três), 53 para tribunais de recursos, 161 para tribunais federais de primeiro grau e dois para o Tribunal de Comércio Internacional. Todos os cargos de juízes federais são vitalícios.

Somados aos juízes que foram indicados por outros presidentes republicanos, pode-se esperar que as decisões judiciais nos EUA irão refletir os ideais republicanos do país por muito tempo — principalmente na Suprema Corte. Os ideais liberais-democratas terão poucas chances de prevalecer.

Entrarão na linha de fogo, por exemplo, os direitos ao aborto, os direitos da comunidade LGBT (incluindo o casamento entre pessoas do mesmo sexo), o direito ao seguro-saúde de quem não pode pagar seguro particular (garantido pela lei Affordable Care Act, mais conhecida como "Obamacare"), direitos ao voto e restrições à compra e porte de armas.

Trump poderá se beneficiar pessoalmente, de forma mais direta, nos processos em que juízes de tribunais inferiores decidiram que ele deve divulgar suas declarações de imposto de renda.

Mas sua maior vitória poderá vir do resultado da eleição presidencial. Trump já anunciou que não vai aceitar um resultado desfavorável da eleição, se perdê-la por uma pequena margem. Vai recorrer à justiça e o caso chegará à Suprema Corte. 

Audiências no Senado
Nesta quinta-feira (15/10), encerraram-se as audiências no Comitê Judiciário do Senado, que precedem a votação de confirmação da candidata Amy Barret no plenário. Na segunda-feira, os integrantes do comitê se pronunciaram sobre a indicação de Trump; na terça e na quarta-feira, Amy Barret foi sabatinada pelos senadores; na quarta, os senadores ouviram depoimentos sobre a indicada e deram suas palavras finais.

Na sabatina, os senadores democratas questionaram a capacidade da juíza de julgar com imparcialidade, porque ela já havia se manifestado em artigos e declarações contra o aborto, o "Obamacare" e outros direitos conquistados pelos liberais.

A juíza se defendeu dizendo que, na Suprema Corte, irá ouvir as alegações dos litigantes, ler petições, consultar seus juízes auxiliares, discutir com seus colegas e se entregar ao processo de produzir decisões por escrito.

Ela também recusou a ideia de que deveria se declarar impedida, se a eleição presidencial deste ano for decidida pela Suprema Corte. "Trump está contando com você para ganhar essa eleição", disse a ela o senador democrata Patrick Leahy. Amy Barret rebateu que a decisão de se declarar suspeita não é só dela. Deve ser tomada em consulta com os demais ministros da corte

Mas tudo isso foi um procedimento "para inglês ver". Líder da maioria no Senado, Mitch McConnell deu à imprensa a declaração do que realmente importa: "Nós temos os votos para confirmar a indicação de Amy Barrett", disse.

No Comitê Judiciário, a situação é a mesma. A votação foi marcada para 22 de outubro e, desde logo, já se conhece o resultado: serão 12 votos republicanos contra 10 votos democratas.

No dia 23, o processo chega ao plenário do Senado, com três dias para debates e um para votação. Tudo é muito previsível: os democratas vão criticar o processo de confirmação e as tendências conservadoras da juíza; os republicanos vão defender o processo e a juíza.

Um resultado desfavorável para os republicanos na votação é muito improvável. Os republicanos têm 53 senadores (contra 45 democratas e 2 independentes) e precisam de 51 votos para confirmar a indicação. Apenas duas senadoras republicanas anunciaram que irão votar contra a indicação "para manter a coerência".

Em 2016, os republicanos, que já tinham maioria no Senado, se recusaram a considerar uma indicação do então presidente Barack Obama, a mais de 10 meses da eleição presidencial. Alegaram que a indicação de um novo ministro deveria ficar para o candidato que vencesse a eleição — isto é, se deveria ouvir a vontade do povo.

Reeleição de Trump
O candidato democrata Joe Biden lidera as pesquisas de intenção de voto, com mais de 10% de vantagem sobre o presidente Donald Trump. Mas os democratas aprenderam nas eleições de 2016 que pesquisa eleitoral não são favas contadas: a candidata democrata Hilary Clinton também liderava nas pesquisas e, realmente, teve mais de 3 milhões de votos na contagem geral em todo o país, mas Trump conseguiu eleger mais delegados para o Colégio Eleitoral.

Para ganhar, Biden precisará vencer em alguns estados "voláteis" em que Hilary perdeu em 2016 — são estados que não são solidamente democratas ou republicanos. Por enquanto, Biden lidera em alguns desses estados. Mas somente a contagem de votos final irá revelar quem governará o país pelos próximos quatro anos.

A nomeação de mais uma ministra para a Suprema Corte é uma bandeira que terá de sensibilizar eleitores independentes, com tendências conservadoras. Os eleitores republicanos e democratas já estão com a cabeça feita e não vão mudar seus votos. De uma maneira geral, amam ou odeiam Donald Trump — uma situação de radicalização política que não é desconhecida em outros países.

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