Questão de Ética

Parecer da ABA analisa relacionamentos entre advogados de partes adversárias

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11 de outubro de 2020, 7h54

A American Bar Association (ABA) aprovou um novo “Parecer Formal”, que estabelece regras, baseadas em ética, para relacionamentos próximos entre advogados de partes adversárias. Até agora, o Código de Ética da ABA só tinha regras para relacionamento conjugal ou de parentesco entre advogados de partes adversárias. O novo parecer define mais três categorias de relacionamento: relacionamento íntimo, de amizade e entre conhecidos.

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Como não havia um fundamento no Código de Ética dos Advogados, a Comissão de Ética da ABA recorreu às regras que definem o relacionamento entre os juízes e advogados, para estabelecer as diretrizes que irão orientar o relacionamento entre advogados que representam partes adversárias.

Basicamente, o parecer discute situações em que o relacionamento entre advogados de partes adversárias, incluindo promotores, cria conflito de interesses. Se esse for o caso, a representação pode prejudicar os interesses de um ou outro cliente — e isso não pode acontecer.

Quando tal conflito de interesses surge, a regra, exceções à parte, é a de que o advogado deve explicar ao cliente a natureza de seu relacionamento com o(a) advogado(a) da parte adversária.

Se o cliente confiar que, apesar disso, o advogado poderá representá-lo de forma “competente e diligente”, deverá dar seu “consentimento informado” para prosseguir com a representação, confirmando-a por escrito. Caso contrário, o advogado deve se declarar impedido. E o cliente deverá procurar outro advogado.

“Na ausência de consentimento informado, confirmado por escrito, um advogado pode não representar um cliente se houver um risco significativo de que tal representação de um ou mais clientes será substancialmente limitado pelas responsabilidades para com outro cliente, ex-cliente um terceiro ou por interesse pessoal do advogado”, diz o Código de Ética.

Das três categorias abordadas agora, apenas duas estão sujeitas a essa regra mais rígida — a terceira é mais flexível. Um exemplo de inflexibilidade: um advogado pode deixar de apresentar uma queixa contra o advogado da parte adversária, quando deveria fazê-lo, porque eles mantêm algum tipo de relacionamento. Um exemplo de flexibilidade: os advogados são apenas conhecidos e isso não interfere na atuação de cada um.

O “Parecer Formal” define assim as três categorias:

1. Relacionamento íntimo
Advogados que coabitam em um relacionamento íntimo devem ser tratados como casados, para se avaliar questões de conflito de interesses. Isso também se aplica a namorados, noivos e a relacionamentos íntimos exclusivos. Nesses casos, os advogados devem revelar a seus clientes a situação. E o cliente deve decidir se dá o consentimento para representá-lo, confirmando por escrito.

Advogados envolvidos em relacionamento íntimo, mas que não há exclusividade, compromisso ou coabitação, devem considerar seriamente se tal relacionamento não cria um risco significativo de que a representação de cada um dos clientes será limitada substancialmente. Se for o caso, cada um deve comunicar a situação a seu cliente.

Exceção: quando há um “affair” entre advogados de partes adversárias, que ambos querem manter secreto, obviamente eles não irão revelar a situação ao cliente, para obter seu consentimento informado. Nesse caso, pelo menos um dos advogados deverá se declarar impedido de representar um dos clientes, dando-lhe a explicação que achar conveniente.

2. Amizades
O caso de amizade entre advogados que podem representar partes adversárias é mais complexo. Basicamente, cabe aos advogados analisar o grau de amizade entre eles. Se forem amigos próximos, que se socializam com frequência, frequentam suas casas, tiram férias juntos e, em suma, fazem coisas que os amigos fazem, a regra prevalece: é preciso informar os clientes da situação e ver se ele dá o consentimento para firmar a representação.

Em contraste, pode haver uma amizade entre os advogados de partes adversárias que não vai impedir que cada um represente seu cliente de forma competente e diligente. Cada advogado deve avaliar a situação de possível conflito de interesse e submetê-la ao teste da queixa: iria apresentar uma representação contra o “amigo” em corte, se fosse necessário? Se há dúvida, o cliente deve ser informado e o consentimento deve ser obtido.

3. Entre conhecidos
Advogados têm uma infinidade de oportunidades de se conhecer, porque se encontram nos tribunais, nas associações de classe, participam de comissões da Ordem dos Advogados, de seminários e congressos, frequentam o mesmo clube, a mesma igreja, os mesmos bares e restaurantes, a mesma academia de ginástica, levam os filhos às mesmas escolas e foram colegas de faculdade.

Porém, ações entre conhecidos são diferentes de ações entre amigos. Segundo o Parecer Formal da ABA, advogados conhecidos que representam partes adversárias não precisam informar o cliente sobre a situação e obter o consentimento para prosseguir com a representação – embora possa dizer a ele que conhece o advogado da outra parte.

Aliás, é bom informar o cliente de que conhece o advogado da outra parte, porque isso pode ajudar a aumentar a confiança do cliente, diz o parecer da ABA. Cabe ao advogado avaliar se a situação é de conflito de interesses ou não. E se a representação do cliente não será prejudicada de qualquer maneira.

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