A Defensoria e a ação civil pública
8 de outubro de 2020, 13h05
No distante 2007, tivemos a honra de representar a Associação Nacional dos Defensores Públicos na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.493, que questionava a modificação do artigo 5º da Lei da Ação Civil Pública para incluir a Defensoria Pública como um dos legitimados para esse importante instrumento de defesa de direitos coletivos.
A saudosa professora construiu um argumento bastante poderoso no sentido de que a consolidação da legitimidade da defensoria no texto da lei coroaria o reconhecimento da atuação desse imprescindível ator judicial na defesa dos necessitados, não apenas os carentes no plano econômico, mas também os socialmente vulneráveis. O acesso à Justiça de forma mais ampla — típica das tutelas coletivas — passara a ser atribuído também à Defensoria Pública (muito embora até então decisões judiciais vinham reconhecendo tal legitimação, a fixação no texto legislativo eliminou algumas dúvidas, que, ao fim e ao cabo, foram afastadas por completo pelo Supremo Tribunal Federal, à unanimidade, seguindo o voto da ministra Carmen Lúcia).
A História, essa farsante, infelizmente nos prega peças. Tomamos conhecimento pelos holofotes da mídia (ah, os holofotes) que o resultado dessa luta renhida pela legitimação coletiva foi (mal) utilizado para atacar uma tentativa honorável de uma empresa. Essa empresa, o Magazine Luíza, como todos sabemos, estabeleceu um programa de admissão para o seu quadro de lideranças voltado a candidatos negros.
Sob construtos pseudojurídicos, como o "marketing da lacração", essa ação civil pública contraria frontalmente a inspiração daqueles que procuraram defender a legitimação da defensoria pública em ações coletivas. A ideia do socialmente vulnerável, que confere aos defensores o acesso a essa técnica moderna de tutela, não apenas foi desprezada como simplesmente ignorada na ação. É certo que há uma imensa massa de miseráveis e socialmente vulneráveis entre nós, brasileiros, que demandaria atenção da Defensoria e de outras estruturas do Estado; não menos certo, entretanto, é que tal massa, infelizmente, é bastante mais escura do que outros estratos da população.
O Magalu ousou mexer nesse quadro mediante o programa para preenchimento de certos cargos buscando a diminuição da desigualdade econômica pela cor da pele. Despertou, com isso, críticas incompreensíveis de um "racismo inverso" e outras bobagens que culminaram na indigesta ação civil pública.
Tempos estranhos que teimam em nos assombrar. Que o Judiciário novamente se inspire em lições de gigantes, como a professora Ada, e rejeite essa malparada iniciativa do defensor.
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