STJ afasta presunção de crime noturno e libera ex-governador de cautelar
8 de outubro de 2020, 20h48
As medidas cautelares em substituição à prisão preventiva devem guardar necessidade, utilidade e pertinência com o objetivo a que se propõem. A presunção de que o investigado cometeu crime na calada da noite não é suficiente para proibi-lo de sair de casa no período noturno.
Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu parcialmente a ordem em Habeas Corpus ao ex-governador da Paraíba, Ricardo Coutinho, para afastar a cautelar de recolhimento noturno. A defesa no caso é feita pelo advogado Rafael Carneiro.
Ricardo Coutinho é alvo da "operação calvário", que investiga crimes de fraude a licitação, corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro e chegou a ser preso em dezembro de 2019. Sua soltura foi feita em decisão em plantão pelo minisitro Napoelão Nunes Maia e depois confirmada pela 6ª Turma.
Na prática, a decisão permite que ele participe de atos de campanha eleitoral à noite, já que é candidato à prefeitura de João Pessoa (PB) pelo PSB — ainda que seja alvo de ação de impugnação pelo Ministério Público Eleitoral.
Contra ele também tramitam no Tribunal Superior Eleitoral duas Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aijes), que podem levar à declaração de inelegibilidade por oito anos, por irregularidades nas eleições de 2014. Os julgamentos estão parados por pedido de vista.
Cautelares e cautelares
Ao manter o afastamento da prisão, a 6ª Turma a substituiu pelas seguintes cautelares: obrigação de comparecimento periódico em juízo, proibição de manter contato com os demais investigados na operação (com exceção de seu irmão, Coriolano Coutinho) e a proibição de ausentar-se da comarca sem autorização do juízo.
O acórdão ainda delegou ao Tribunal de Justiça da Paraíba a possibilidade de acrescentar quaisquer outras medidas que considerar necessárias. O relator do caso na corte então mandou Ricardo Coutinho usar tornozeleira eletrônica e não deixar sua residência à noite.
O agravamento dado pelo TJ-PB levou a defesa a ajuizar novo Habeas Corpus ao STJ. O colegiado entendeu que não houve oficiosidade na atitude do tribunal, inclusive porque o pedido original era de prisão preventiva, sendo as cautelares, portanto, menos gravosas. Mas por 3 votos a 2, afastou o recolhimento noturno.
"Não percebo qual a utilidade, até porque tudo que poderia ser feito à noite poderia ser feito durante o dia", disse o ministro Sebastião Reis Júnior, que abriu divergência. "As cautelares precisam aguardar necessidade e utilidade. Tem que ter pertinência com objetivo a que se propõe. Qual seria utilidade de ele não sair à noite? Ainda mais em crime do colarinho branco", ponderou o ministro Antonio Saldanha Palheiro.
A maioria foi formada também com voto do ministro Nefi Cordeiro, que ressaltou a insuficiente justificativa de que Ricardo Coutinho poderia, à noite, realizar articulações e empreender esforços no sentido de apagar registros de suas ações, os quais são investigados. "Isso é uma presunção sem justificativa concreta. Se há risco, ele haveria durante o dia também", disse.
Ficaram vencidos a relatora, ministra Laurita Vaz, e o ministro Rogerio Schietti, que não identificaram desproporcionalidade na medida.
Texto alterado às 22h45 para correção e acréscimo de informações
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