ADPF 738

Leia o voto de Marco Aurélio em julgamento sobre incentivo a candidatos negros

Autor

3 de outubro de 2020, 17h20

É necessário fomentar a representatividade racial, implementando providências voltadas aos grupos desfavorecidos, que estão historicamente à margem da sociedade, dando-lhes, assim, condições para ombrear com os detentores do poder. Fomentar políticas de ação afirmativa, no entanto, compete ao Legislativo, não ao Judiciário. 

Carlos Moura/SCO/STF
Para ministro, compete ao Legislativo fomentar políticas de ação afirmativa   Carlos Moura/SCO/STF

O entendimento é do ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, ao votar (confira integra do voto no final do texto) contra a reserva proporcional de recursos e propaganda eleitoral entre candidatos negros e brancos. 

O Plenário Virtual julgou a ADPF movida pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol). Marco Aurélio foi voto vencido. O restante da corte seguiu o voto do ministro Ricardo Lewandowski, relator do caso. Com isso, a reserva terá implementação imediata, valendo já para as eleições municipais deste ano. 

"Aprendi, desde cedo, que a única forma de corrigir desigualdades é com a força da lei. Isso ocorreu no âmbito do Direito do Trabalho, quando abandonadas ideias civilistas napoleônicas, para ter-se a Consolidação das Leis do Trabalho, pautada em normas imperativas, a afastarem, como é sabido, a autonomia da vontade das partes no negócio jurídico", afirmou Marco Aurélio. 

Para o ministro, as deliberações sobre questões nacionais e diretrizes do estado na condução de políticas públicas devem ocorrer no Parlamento, não nas cortes. 

"A ação afirmativa não compete, em si, ao Judiciário, mas ao Legislativo. Revela opção político-legislativa. Surge impertinente potencializar razões pragmáticas, articulando com a interpretação de normas abertas a encerrarem os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, igualdade e cidadania, a ponto de ter-se mitigada a ordem jurídica, a ser preservada por todos, principalmente por este Tribunal, guarda maior da Constituição Federal", prossegue o voto. 

Ainda segundo o ministro, "a sociedade almeja e exige a correção de rumos, mas esta há de ocorrer ausente açodamento". "Avança-se culturalmente quando observada a supremacia da Carta da República. Eis o preço a ser pago por viver em um Estado Democrático de Direito. É módico e está ao alcance de todos", conclui. 

O ministro disse à ConJur que, em seu voto, por equívoco, digitou-se que ele teria afirmado que, em Direito, os fins justificam os meios — quando, ele sempre defendeu o inverso.

O que disse o TSE
A cautelar de Lewandowski altera o que foi fixado pela maioria do TSE. Em agosto, o TSE definiu que candidatos negros terão direito a distribuição de verbas públicas para financiamento de campanha e tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão em patamares mínimos e proporcionais. No entanto, os ministros definiram que a regra só seria obrigatória para as eleições gerais de 2022.

Os ministros do TSE tiveram longa discussão sobre a aplicação de questão racial, como mostrou reportagem da ConJur. O adiamento foi proposto pelo ministro Og Fernandes e aceito pela maioria em termos práticos: as convenções partidárias começavam em menos de uma semana do julgamento, em 31 de agosto; e ao menos 11 partidos já estão aptos a receber recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). 

Com a decisão, o tribunal eleitoral abriu espaço para a atuação do Congresso. Atualmente, tramitam ao menos dois projetos de lei sobre o tema. O mais recente tem, entre seus muitos autores, a deputada Benedita da Silva (PT-RJ), justamente a autora da consulta decidida pelo TSE.

Clique aqui para ler o voto do ministro Marco Aurélio
ADPF 738

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!