In dubio pro societate

TJ-SP reforma decisão de juíza afastada e PMs vão a júri popular

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1 de outubro de 2020, 12h03

Para a pronúncia, que encerra simples juízo de admissibilidade da acusação, o ordenamento jurídico exige somente o exame da ocorrência do crime e de indícios de sua autoria, não se demandando aqueles requisitos de certeza necessários à prolação da condenação. As dúvidas, nessa fase processual, resolvem-se contra o réu, e a favor da sociedade.

Com esse entendimento, a 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo acolheu recurso do Ministério Público e do assistente de acusação para submeter ao Tribunal do Júri dois policiais militares acusados de matar um ex-detento em frente ao prédio da Rota, no centro da capital paulista, em 2010.

Os PMs haviam sido absolvidos sumariamente pela juíza Débora Faitarone, da 1ª Vara do Júri de São Paulo. Desde maio deste ano, ela responde a um processo administrativo disciplinar e está afastada do cargo por decisão do Órgão Especial do TJ-SP. Em entrevista ao portal G1, em setembro, a magistrada disse ter sido injustiçada por inocentar nove policiais militares acusados de homicídio.

Um dos casos de absolvição citados pela magistrada na entrevista é justamente o dos dois PMs acusados de matar Frank Ligieri Sons. O Ministério Público diz que o crime foi uma execução. Já a defesa dos policias alega legítima defesa e diz que a vítima disparou primeiro e ainda estaria portando um "coquetel molotov".

Essa tese foi acolhida pela juíza Débora Faitarone ao decidir pela absolvição sumária. O MP e o assistente de acusação recorreram ao TJ-SP que, em votação unânime, determinou que os policiais sejam julgados pelo Tribunal do Júri. O relator, desembargador Osni Pereira, destacou que, na fase de pronúncia, prevalece o in dubio pro societate em detrimento ao in dubio pro reo.

"No caso dos autos, razão assiste ao inconformismo ministerial, tendo em vista que o exame das provas produzidas leva à conclusão de que a pronúncia dos acusados é decisão que se impõe. A materialidade delitiva veio comprovada pelo pelo exame necroscópico. Por outro lado, a prova oral demonstrou a existência de indícios suficientes de autoria, recaindo sobre os acusados", disse.

Segundo o relator, conforme investigação da Polícia Civil, a versão dos PMs é conflitante com os relatos das testemunhas e a prova pericial. "Embora a tese da excludente de ilicitude (legítima defesa) apresentada pelos policiais seja defensável, é certo que a competência para acolhê-la ou não é do Conselho de Sentença, competindo ao magistrado somente reconhecê-la quando for estreme de dúvidas, o que não é o caso dos autos", completou.

Pereira afirmou que, diante da dúvida em torno da tese de legítima defesa, não caberia a absolvição sumária. Dessa forma, havendo prova da materialidade e indícios suficientes de autoria, o desembargador disse que é mesmo caso de pronúncia para sujeitar os acusados à decisão do Tribunal do Júri, "juiz constitucional dos crimes dolosos contra a vida, ao qual incumbirá detida análise das provas quanto à autoria delitiva".

Processo 0004275-84.2010.8.26.0052

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