PECs no Congresso

Após DPU, PECs podem dar autonomia funcional a órgãos de segurança e Receita

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9 de novembro de 2020, 7h46

Depois de ver confirmada a concessão de autonomia funcional e administrativa à Defensoria Pública da União, o Congresso Nacional está pronto para discutir a extensão desse privilégio republicano a outras instituições. São diversas Propostas de Emenda à Constituição em tramitação, em benefício principalmente de órgãos de segurança pública e da Receita Federal.

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PECs em tramitação no Congresso propõem autonomia funcional a variadas instituições da República
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Esse é um dos potenciais efeitos da decisão tomada pelo Plenário virtual do Supremo Tribunal Federal, que na terça-feira (3/11) julgou improcedente a ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Presidência da República contra a Emenda Constitucional 74/2013.

A emenda deu autonomia à DPU no mesmo formato conferido às Defensorias Públicas estaduais pela Emenda Constitucional 45/2004. Assim, o órgão ganhou a iniciativa de suas propostas orçamentárias e concessão de benefícios, entre outros.

Por maioria, o Plenário do Supremo julgou a ADI improcedente nos termos do voto da relatora, ministra Rosa Weber. O voto do ministro Gilmar Mendes trouxe a ressalva: o reconhecimento de autonomia administrativa e financeira de entidades pelo constituinte derivado leva à possibilidade de ampliação, a todo momento e por emenda constitucional, do rol de instituições reconhecidamente autônomas.

Segundo ele, essa condição transforma a relação dessas entidades com as demais instituições da República e tem potencial de ampliar conflitos, pois estabelece um modelo que dificulta a governança. Isso cria uma "poliarquia" dividida em "ilhas de poder" na estrutura do Estado, alertou.

"Ao reconhecermos a autonomia administrativo-financeira da Defensoria Pública, vamos terminar por enfrentar propostas idênticas com fundamentos também razoáveis com vistas à extensão de autonomia a outros órgãos de igual relevância", apontou o ministro.

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Ministro Gilmar Mendes chamou atenção para risco de admitir a criação de "ilhas de poder" na estrutura do Estado brasileiro
Gervásio Baptista/STF

O Congresso tem ao menos cinco PECs que conferem graus de autonomia nesse mesmo modelo citado prontas para pauta e apreciação. Outras três estão paradas na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC): duas aguardando parecer do relator e uma à espera de pauta.

Segurança pública
Muitas propostas tratam de órgãos de segurança pública. Dentre as principais está a PEC 412/2009, que visa a alteração do artigo 144 da Constituição para conferir à Polícia Federal a autonomia institucional necessária à construção de "uma Polícia Republicana, que atua a serviço do Estado e não de governos".

De autoria do deputado Alexandre Silveira (PPS-MG), está parada na CCJC e se baseia justamente no exemplo da DPU. "Se a ação da Defensoria Pública da União merece todo o apoio estatal, posto que seu objetivo é a defesa dos menos assistidos, não poderá ser diferente com a Polícia Federal, pois segurança pública e o combate ao crime organizado e à corrupção são igualmente objetivos desejados pela sociedade brasileira", diz o projeto.

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Autonomia transformaria instituições como a PF em "polícia de Estado, não de governo"

Tanto o tema é delicado que em fevereiro foi deferido requerimento para desapensar dessa PEC outra, a PEC 168/2019, que propõe a reorganização da PF e está em estágio mais avançado de tramitação: já sujeita à apreciação do Plenário.

É de autoria do deputado Aluisio Mendes (PSC-MA) e prevê que o órgão possa propor e executar seu próprio orçamento "blindando-a como instituição Republicana de Estado e não de governo". A proposição precisaria ser feita seguindo diretrizes fixadas em Lei Complementar.

"Tais diretrizes em muito se diferenciam da autonomia funcional e administrativa, exclusiva dos Três Poderes e do Ministério Público", diz o texto. Por isso, acrescenta, "jamais terão o condão de permitir arroubos corporativos de fixação ou majoração interna de salários, ou criação/extinção de cargos".

Também parada na CCJC está a PEC 423/2014, do deputado Jorginho Mello (PR-SC). Ela permite permitir à União e aos Estados a criação de polícia única, de ciclo completo, num novo sistema de segurança pública cujos órgãos e instituições terão autonomia administrativa, funcional e financeira, e dotação orçamentária própria. O mesmo vale para a perícia técnica, inclusive.

Os peritos têm uma proposta para chamar de sua. A PEC 325/2009, já pronta para pauta no Plenário, cria a perícia oficial de natureza criminal como órgão essencial à função jurisdicional, assegurada a necessária autonomia científica, funcional, administrativa.

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Dar autonomia às administrações tributárias irá promover uma visão integrada do Fisco brasileiro, diz texto da PEC 186

"No plano funcional, a autonomia traduzirá em maior isenção na produção da prova técnica, sem ingerências de outros órgãos ou agentes estranhos ao processo de produção da prova. No plano administrativo cuidar-se-á de garantir as prioridades dos investimentos e da capacitação científica e tecnológica necessários à correta e eficaz atuação do organismo gestor da atividade de perícia oficial de natureza criminal", diz o texto.

Receita Federal
Há também grande expectativa para votação da PEC 186/2007, já pronta para pauta no Plenário. O texto acrescenta ao parágrafo 37 da Constituição Federal o parágrafo 14, que confere as administrações tributárias da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios "autonomia administrativa, financeira e funcional, e as iniciativas de suas propostas orçamentárias".

O objetivo, segundo o texto de autoria do deputado Décio Lima (PT-SC), é garantir capacidade de definir suas próprias políticas, organizar seus próprios serviços, dispor dos próprios recursos e estabelecer suas propostas orçamentárias. "A aprovação desta proposta irá promover uma visão integrada do Fisco brasileiro", diz.

Advocacia pública e MP de Contas
Depois das Defensorias, também pleiteia-se autonomia funcional e administrativa à advocacia pública. Essa é a ideia da PEC 82/2007, que afetaria a advocacia da União, procuradoria da Fazenda Nacional, Procuradoria-Geral Federal, procuradoria das autarquias e as procuradorias dos estados, do Distrito Federal e dos municípios.

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Advocacia da União e procuradorias também devem ser autônomas, segundo PEC em tramitação no Congresso
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A proposta é de autoria do do então deputado e hoje governador Flávo Dino (PCdoB-MA) e outros, e inclui o artigo 132-A na Constituição como forma de atender ao princípio da simetria. "A autonomia funcional e as demais garantias previstas no texto da presente proposta de emenda à Constituição representam fator indispensável para que a função constitucional dos referidos órgãos seja alcançada pelos respectivos titulares", diz a justificativa.

A simetria também é o meio pelo qual a PEC 329/2013 busca ampliar a autonomia do Ministério Público de Contas. A Constituição já diz, no artigo 130, que aos membros deste se aplicam as disposições pertinentes aos demais MPs quanto a direitos, vedações e forma de investidura.

O projeto acrescenta um parágrafo para dizer que o Ministério Público de Contas elaborará sua proposta orçamentária nos limites fixados na lei de diretrizes orçamentárias. Por outro lado, o texto confirma a submissão dos membros do MP junto aos tribunais de contas às decisões do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

Por fim, ainda tramita a PEC 487/2005, que a essa altura redundantemente propõe autonomia funcional, administrativa e financeira às Defensorias Públicas. A PEC é de 2005, um ano depois da EC 45, que deu essa autonomia às Defensorias Estaduais, e sete anos antes da PEC 207/2012, que a estendeu à DPU e foi confirmada na EC 74/2013.

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