Representação da vítima

Lei "anticrime" não deve retroagir em ações por estelionato, diz TJ-SP

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4 de novembro de 2020, 7h21

Os efeitos da Lei 13.964/2019 não podem atingir o ato jurídico perfeito e acabado (oferecimento da denúncia), de modo que a retroatividade da representação no crime de estelionato deve se restringir à fase policial, não alcançando o processo. 

Esse entendimento é da 2ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo ao determinar o prosseguimento de uma ação penal contra quatro acusados por estelionato. A ação havia sido suspensa em primeira instância em razão da mudança imposta pela Lei 13.964/2019 (lei "anticrime"), que condicionou o processo por estelionato à representação da vítima.

No entanto, no caso em questão, a denúncia foi aceita em novembro de 2019. A nova lei foi promulgada em dezembro. Em março de 2020, outro magistrado assumiu o caso e, com base na nova legislação, determinou a intimação das vítimas e também suspendeu o curso da ação penal. O Ministério Público apresentou correição parcial ao TJ-SP e pediu o prosseguimento da ação, uma vez que a denúncia foi recebida antes da vigência da Lei 13.964/2019. Por unanimidade, o tribunal acolheu a correição parcial. 

O relator, desembargador Costabile e Solimene, concordou com o argumento do MP de que seria desnecessária a intimação das vítimas. Segundo ele, as três vítimas foram ouvidas na delegacia e pediram providências em relação aos fatos, o que já seria suficiente para o prosseguimento do caso. "Absolutamente desnecessário baixar-se os autos para que se chamassem as vítimas e ratificassem os expressos pronunciamentos acima delineados, para dizerem literalmente que querem acionar os suspeitos", disse.

Para o desembargador, a Lei 13.964/2019 não deve retroagir no caso dos autos. Ele entende que a mudança na legislação se aplica apenas às novas ações, e não àquelas que já estão em andamento: "A Lei 13.964/2019 não trouxe qualquer previsão a respeito do tema, o que, em síntese, autoriza concluir a intenção do legislador em aplicar o novo entendimento às ações penais em trâmite, com oferecimento da denúncia depois da alteração legislativa".

Jurisprudência dividida
No Superior Tribunal de Justiça, a questão não foi pacificada. A mudança legislativa no crime de estelionato promovida pelo pacote "anticrime" abriu divergência entre as turmas que julgam Direito Penal, justamente no debate sobre até que ponto a nova lei, que exige representação da vítima para tramitação da ação penal, pode reatroagir.

Para a 5ª Turma, a exigência de representação da vítima só retroage até o momento da denúncia, independentemente do momento da prática da infração penal. A exigência da representação seria condição de procedibilidade da representação e não de prosseguibilidade da ação penal.

Para a 6ª Turma, a norma retroage até o trânsito em julgado da ação por estelionato, mas não leva à imediata extinção da punibilidade. O colegiado entendeu que, na hipótese, a vítima deveria ser intimada para manifestar o interesse na continuação da persecução penal, no prazo de 30 dias, sob pena de decadência.

A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, no primeiro julgamento colegiado sobre o tema, decidiu em outubro no mesmo sentido da 5ª Turma do STJ e do TJ de São Paulo.

Para o relator, ministro Alexandre de Moraes, a retroatividade da exigência de representação da vítima no crime de estelionato não deve ser aplicada nos casos em que o Ministério Público ofereceu a denúncia antes da entrada em vigor da lei.

Processo 2092096-05.2020.8.26.0000

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