In dubio pro contribuinte

Emenda aprovada na Câmara acaba com voto especial no Carf

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19 de março de 2020, 16h30

Foi aprovada nesta quarta-feira (18/3), na Câmara dos Deputados, uma emenda aglutinativa na Medida Provisória 899/2019 que extingue o voto de qualidade no Conselho Administrativo de recursos Fiscais.

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Emenda aglutinativa aprovada na Câmara acaba com voto especial no Carf
Reprodução / CARF

Conforme o texto aprovado, em caso de empate na votação de um processo o caso será automaticamente favorável ao contribuinte. Nas regras atuais, em caso de empate, o presidente do colegiado — representante do Fisco — tem o poder de desempatar.

A emenda aglutinativa agora integra a Medida Provisória 899/2019 — conhecida popularmente como MP do Contribuinte Legal —, que regula a negociação de débitos fiscais com a União.

Os críticos ao voto especial alegam que este causa desequilíbrio entre o Fisco e as empresas. Seus defensores, por sua vez, acreditam que é natural que o um representante da administração pública detenha o poder de decidir. A ConJur ouviu especialistas em Direito Tributário sobre a proposta e suas eventuais consequências.

O tributarista Augusto Fauvel acredita que a medida é positiva. "Isso vai trazer uma paridade de armas no Carf e restabelecer o contraditório e a ampla defesa. O fim do voto de qualidade não vai favorecer o contribuinte, mas vai deixar as coisas como sempre deveriam estar", argumenta.

O advogado Rodrigo Dalla Pria, sócio do Dalla Pria Advogado, lembra que o fim do voto especial já vem sendo defendido por estudiosos do direito tributário há algum tempo. "Isso se acentuou em tempos recentes quando se observou um aumento de decisões favoráveis ao Fisco ancoradas no voto de qualidade, que no Carf é sempre da lavra de um conselheiro oriundo do Fisco", explica.

Dalla Pria também lembra que, conforme os dados disponíveis, a maior parte das decisões proferidas por voto de qualidade ocorre na Câmara Superior do Carf. "Nas câmaras ordinárias, a imensa maioria das decisões é proferida por maioria de votos", diz.

Favorável ao fim do voto e qualidade, o especialista lembra que a medida está "alinhada à regra disposta no artigo 112 do Código Tributário Nacional, que dispõe sobre a interpretação da lei tributária de forma mais favorável ao contribuinte", explica.

Bruno Romano, sócio da área tributária do Bonaccorso, Cavalcante, Oliveira e Ristow Advogados, por sua vez, acredita que o fim do voto especial não será totalmente benéfico. "É possível que sua extinção cause mais danos do que benefícios aos contribuintes, pois, em sua substituição, poderão criar mecanismos muito piores", comenta.

Um exemplo disso, lembra Romano, é o PL n. 6.064/16, que visa a extinguir o voto de qualidade e, em caso de empate de votos, cancela-se o auto de infração. "Isso parece bom aos contribuintes, contudo, o projeto permite que a Procuradoria-Geral da Fazendo Nacional proponha uma ação para questionar a decisão do CARF, o que, por si, causará efeitos danosos", explica.

Romano acredita que a decisão mais acertada seria manter o voto de qualidade e aplicar parcialmente o artigo 112 do CTN, que determina que em casos de dúvida se "mantenha apenas a cobrança do tributo dos juros, afastando-se a cobrança das penalidades", conclui.

Para Renato Vilela Faria, tributarista e sócio do Peixoto & Cury Advogados, acredita que adotar essa medida diz respeito ao princípio do "in dubio pro contribuinte". "O empresário, seja ele grande ou pequeno, se comparado ao Estado, é a ponta mais fraca da relação", argumenta.

O tributarista ainda lembra que a medida veio em um momento de dificuldade econômica. "Atualmente, quando o contribuinte "perde" em razão do voto de minerva (desempate), ele se vê obrigado a levar a discussão para o Judiciário e, nessa instância, quase sempre terá o ônus de garantir o débito, ou seja, ou terá que depositar o valor da quantia em discussão (e em alguns casos agravado com multas que chegam a 150%) ou terá custos adicionais com a contratação de seguro garantia ou fiança bancária", diz.  

O colunista da ConJur Fernando Facury Sacaff também criticou a existência do voto de qualidade, em texto pulicado em 10/2/20.

MP 899/2019
PL Nº 6.064/16

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