Opinião

O seguro garantia e a fiança bancária em substituição ao depósito judicial

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1 de março de 2020, 7h01

Desde a entrada em vigor da Lei 13.467/2017, intitulada Reforma Trabalhista, uma das discussões mais acaloradas enfrentadas pela Justiça do Trabalho baseia-se na possibilidade de utilização de seguro garantia judicial ou da fiança bancária em substituição aos depósitos judiciais, seja na fase de execução ou na própria cognição, como substituição aos depósitos recursais.

Parte da doutrina e dos tribunais então adotaram entendimento pela impossibilidade de substituição do dinheiro em espécie pelo seguro garantia ou pela fiança bancária, sob o argumento de que o primeiro apresenta liquidez imediata, sendo, desta forma, mais vantajoso ao exequente.[1]

Corroborando com tal entendimento, foi expedido conjuntamente pelo Tribunal Superior do Trabalho, Conselho Superior da Justiça do Trabalho e Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho, o Ato Conjunto 01/2019, que pretendia regulamentar a utilização das referidas garantias na Justiça do Trabalho.

Nos artigos 7º e 8º do referido ato, ficou estabelecido que o seguro garantia e a fiança bancária só poderiam ser utilizados antes do depósito em dinheiro ou de sua penhora, não podendo ser realizado para substituição de valores existentes no processo.

Em contraposição à primeira corrente, parte dos operadores que atuam na Justiça do Trabalho defendem a tese de que tais dispositivos estão em descompasso com o texto da Reforma Trabalhista, que, como mencionado, permitia amplamente a utilização do seguro garantia e da fiança bancária, argumentando-se que o Poder Judiciário não possui legitimidade para legislar sobre matéria de ordem processual, competência privativa da União (artigo 22, I, da Constituição).

Recentemente, o Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular (SindiTelebrasil), ajuizou procedimento de controle administrativo perante o Conselho Nacional de Justiça, questionando-se a validade dos artigos 7º e 8º do Ato Conjunto 01/2019.

O relator do caso, conselheiro Mário Guerreiro, deu provimento ao pedido liminar realizado pelo sindicato para suspender a eficácia dos artigos em comento, até a decisão de mérito que vier a ser prolatada pelo Plenário.

Não obstante a pendência do pronunciamento do Plenário, para o relator, a tese fundamentada pelo sindicato encontra respaldo na lei, seja através dos artigos 882 e 899, parágrafo 11, da CLT, como nos artigos 847 e 835, parágrafo 2º, do CPC. In verbis:

Fica claro, portanto, que a redação do parágrafo 2º do artigo 835 do CPC equipara a fiança bancária e o seguro garantia judicial ao dinheiro na ordem de preferência à penhora, autorizando expressamente a substituição do montante eventualmente penhorado no processo de execução por essas outras garantias. Tal disposição, frise-se, é plenamente aplicável ao processo do trabalho, não só pela remição feita pelo artigo 882 da CLT ao artigo 835 do CPC, mas também pela inexistência de norma sobre substituição de garantias no diploma legal trabalhista, a trair a incidência do artigo 769 da CLT e do arrio 847, caput, do CPC.

Quanto à possibilidade de utilização do seguro garantia ou da fiança bancária como substituição dos depósitos recursais, filiamo-nos à tese apresentada pelo relator, haja vista que a CLT, através de seu artigo 899, parágrafo 11, prevê expressamente tal possibilidade.

Reitere-se que para a lei (835, parágrafo 2º, do CPC), tanto o seguro garantia como a fiança bancária estão hierarquicamente equiparados ao dinheiro em espécie, inexistindo, desta forma, qualquer prejuízo ao credor.

Ademais, na perspectiva econômica em que se encontra o país, permitir ao empregador a alocação de recursos que, não seriam utilizados imediatamente pelos credores, em observação ao devido processo legal, encontra verdadeiro respaldo legal nos institutos supracitados e, inclusive, na própria Constituição Federal, haja vista a determinação de que, inclusive as empresas, devem atender à sua função social (artigo 5º, XXIII).

Outro ponto controvertido, que não nos parece razoável, é o fundamento apresentado pelos adeptos da primeira corrente, de que seria necessária a conferência de autenticidade das apólices, minimizando os riscos de eventual fraude, haja vista que tal entendimento não pode ser presumido, colocando em risco uma série de direitos e prerrogativas da parte e de seu próprio advogado.

Por fim, acrescente-se que a interpretação de qualquer norma deve ser realizada através de um rigoroso filtro constitucional, de modo que a proibição da substituição do bem penhorado pelo seguro garantia judicial e pela fiança bancária, além de ofender os institutos já mencionados, pressupõe também em grave violação ao próprio acesso à Justiça e ao devido processo legal, garantias consagradas pela Constituição Federal, através de seu artigo 5º, XXXV, LIV e LV.

Nota
[1] TRT 4 – AP: 0020015-16.2018.5.04.0812, Seção Especializada em Execução, Relator: Desembargador Janney Camargo Bina – DEJT 05/07/2019)

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